A imagiologia obstétrica corresponde à obtenção de exame de imagem do trato reprodutor feminino e do feto em desenvolvimento durante a gravidez. A ecografia é a modalidade imagiológica de 1ª linha durante uma gravidez, visto que não emite radiação; assim sendo, é a opção mais segura para o feto que se está a desenvolver. Os obstetras estão muito dependentes dos resultados ecográficos para a deteção, monitorização e avaliação de várias patologias maternas e fetais, sem exposição à radiação. Por exemplo, alterações fetais congénitas, anormalidades da placentação, restrição do crescimento fetal e volumes anormais de líquido amniótico podem ser avaliados minuciosamente com a ecografia. As modalidades de imagem emissoras de radiação (raio-X, TC) são normalmente reservadas para situações de emergência não obstétricas.
A imagiologia obstétrica corresponde à obtenção de exames de imagem do trato reprodutor feminino e do feto em desenvolvimento durante a gravidez.
Excetuando raros casos, os exames de imagem obstétricos são realizados com ecografia.
A ecografia tem as seguintes vantagens:
Ausência de exposição a radiação
Capacidade de visualizar imagens em tempo real do feto a mover-se
Custo relativamente baixo e facilmente disponível
Em circunstâncias raras, os exames de imagem obstétricos podem ser obtidos através de outras modalidades (por exemplo, ressonância magnética).
A imagiologia não obstétrica durante uma gravidez deve ser solicitada criteriosamente, de forma a evitar a exposição desnecessária do feto em desenvolvimento à radiação.
Tipos de exames de imagiologia obstétrica
Existem 2 tipos principais de exames de imagem obstétricos:
Ecografia abdominal obstétrica: boa para avaliação do feto, placenta, líquido amniótico e útero a partir do final do 1º trimestre até ao parto
Ecografia transvaginal:
Bom para avaliação do colo do útero durante a gravidez
Melhor para avaliação do feto e do útero no início da gravidez
Estudos específicos
Podem ser realizados vários tipos de estudos específicos. Todos eles são exames ecográficos e podem ser abdominais ou transvaginais.
Datação da gravidez: para a medição do saco gestacional ou do próprio feto, o que ajuda a estabelecer a idade gestacional e calcular a data provável do parto (DPP)
Avaliação da anatomia: para avaliar a anatomia do feto e da mãe
Avaliação do crescimento: São utilizadas medições específicas para calcular a estimativa do peso fetal.
Avaliação da posição: para determinar de que forma o feto está posicionado dentro do útero para a preparação do parto
Avaliações do líquido amniótico: medições para ajudar a estimar a quantidade de líquido amniótico
Perfil biofísico:
Avaliação do bem-estar fetal
Determinação dos diferentes tipos de movimentos fetais em combinação com uma avaliação do líquido amniótico
Estudos Doppler:
Avaliação do formato da onda de pulso em artérias fetais específicas para avaliar o bem-estar fetal
Pode evidenciar sinais de anemia fetal ou insuficiência uteroplacentar
Indicações para a Realização de Exames de Imagem Obstétricos
Cuidados de rotina pré-natais
Os exames de imagem obstétricos fazem parte da rotina de cuidados pré-natais, que incluem:
1º trimestre:
Confirmação da gravidez
Datação da gravidez/estabelecimento da data provável do parto
Determinação do número de fetos
Determinação da corionicidade em gestações múltiplas (por exemplo, gémeos monocoriónicos diamnióticos)
Um dos componentes do rastreio de aneuploidias fetais
Pesquisa de anomalias do útero e/ou ovários
2º trimestre:
Avaliação anatómica fetal (rastreio de anomalias congénitas)
Avaliação da placentação:
Localização da placenta (confirmar que está longe do orifício cervical interno)
Pesquisar por sinais de invasão placentária no miométrio (por exemplo, espetro da placenta acreta (PAS., pela sigla em inglês))
Avaliação do comprimento do colo do útero
3º trimestre:
Estimar os volumes de líquido amniótico
Determinar a posição fetal antes do parto
Acompanhamento das gestações de alto risco
Avaliação do crescimento fetal (imagiologia de avaliação do crescimento)
Acompanhamento do desenvolvimento de anomalias congénitas
Avaliação do estado fetal em gestações de alto risco (por exemplo, perfil biofísico ou estudos com doppler numa mulher com pré-eclâmpsia conhecida)
Acompanhamento de fetos com alto risco de desenvolver hidrópsia fetal
Cuidados de emergência
Vários sintomas nas grávidas podem justificar uma avaliação ecográfica:
Hemorragia e/ou dor no início da gravidez:
Descartar uma gravidez ectópica e molar.
Avaliar a viabilidade fetal/avaliar uma potencial perda fetal (ou seja, aborto espontâneo).
Hemorragia no final da gravidez: Procurar sinais sugestivos de descolamento prematuro da placenta normalmente inserida (separação prematura da placenta).
Contrações prematuras ou dor pélvica:
Medição do comprimento cervical, de forma a avaliar a presença de insuficiência cervical ou sinais de alterações no colo do útero
Avaliação do crescimento: importante para ajudar a equipa pediátrica na preparação do parto e para fornecer um aconselhamento adequado aos pais (especialmente em casos em que seja previsto um parto muito prematuro)
Perda de líquido amniótico: Avaliar os níveis de líquido amniótico.
Diminuição dos movimentos fetais: avalição da movimentação fetal através do perfil biofísico
Durante procedimentos
A ecografia é, frequentemente, utilizada de forma a auxiliar o médico durante procedimentos, como:
Amniocentese
Biópsia das vilosidades coriónicas
Cordocentese
Versão cefálica externa
Realização de uma Ecografia Obstétrica
Técnica ecográfica
Posicionamento da grávida:
Ecografia abdominal:
Decúbito dorsal, permitindo o acesso à região inferior do abdómen
2º/3º trimestres: Deve ser colocado um “rolo” (lençol enrolado) debaixo de 1 das ancas da grávida, impedindo que estas fiquem completamente apoiadas na maca.
Ecografia transvaginal: litotomia baixa (menor flexão das pernas)
Dicas para obter boas imagens:
Maximizar o contacto entre a pele da grávida e a sonda ecográfica.
Usar bastante gel.
Profundidade e ganho:
Determina o campo de visão e as características ecogénicas do tecido
No início da gravidez, deve-se visualizar todo o saco gestacional de uma só vez.
Componentes do exame
Componentes que devem ser avaliados durante todas as ecografias obstétricas do 2º e 3º trimestres:
Frequência cardíaca fetal
Posição fetal: Que parte do feto está no segmento uterino inferior (e que, portanto, dará à luz 1º)?
Volume de líquido amniótico
Localização da placenta em relação ao colo do útero
Qualquer outro objetivo do estudo (por exemplo, avaliação anatómica, avaliação do crescimento, etc.)
Preparação geral para a interpretação imagiológica
Antes da interpretação de qualquer exame de imagem, o médico deve realizar alguns passos preparatórios. Deve ser seguida sempre a mesma abordagem sistemática.
Confirmar o nome, data e hora de todas as imagens.
Rever o histórico médico da grávida e os achados ao exame objetivo.
Confirmar que foram solicitados/realizados os exames e técnicas que melhor podem avaliar a patologia suspeita.
Determinar a orientação da imagem.
Ter à mão quaisquer outras imagens relevantes anteriores para comparação.
Achados Normais na Ecografia Obstétrica
Confirmação da gravidez
Saco gestacional:
Primeiro sinal de uma gravidez intrauterina, visualiza-se por volta das 4,5‒5 semanas de gestação (wga, pela sigla em inglês)
Deve ser visível no útero quando a β-hCG sérica quantitativa é > 2.000
Estrutura redonda anecoica e bem definida
Rodeado por um limite ecogénico, que representa a reação decidual
Saco vitelino:
Estrutura anelar hiperecoica dentro do saco gestacional
Visualizado pela primeira vez, aproximadamente, às 5‒6 wga e desaparece às 10 wga
Polo fetal:
O próprio feto
Visível por volta das 5,5‒6 wga
Geralmente, quando é visível o polo fetal também se visualiza o batimento cardíaco.
Quisto de corpo lúteo:
Corresponde ao folículo a partir do qual o oócito ovulou, formando uma massa anexial, que persiste durante todo o 1º trimestre de gravidez
Produz a progesterona vital para a sobrevivência do feto
Aparência ecográfica:
O quisto pode ser simples ou complexo.
Normalmente, está rodeado por um ↑ da vasculatura, observado através de estudos com Doppler como uma borda circunferencial colorida, conhecida como “anel de fogo”
Determinar a viabilidade
O estabelecimento de uma gravidez viável requer:
Localização intrauterina:
Deve estar dentro do endométrio do corpo uterino
Devem ser visualizados, pelo menos, um saco gestacional e um saco vitelino para estabelecer o local da gravidez (um saco gestacional sozinho não é suficiente).
Deteção da frequência cardíaca fetal, geralmente entre 120 a 160 batimentos por minuto (pode ser ligeiramente mais elevada em certos períodos do início da gravidez)
Cálculo da frequência cardíaca fetal através da ecografia
Imagem de Hetal Verma.
Datação ecográfica da gravidez
A ecografia obstétrica do 1º trimestre é a melhor e mais precisa ferramenta para estimar a idade gestacional e calcular a DPP.
Maior precisão no 1º trimestre
Com o progredir da gestação a ecografia fica cada vez menos precisa, devido a variações genéticas normais (por exemplo, a altura dos pais) e a efeitos sobre o ambiente intrauterino (por exemplo, as fumadoras têm pior perfusão placentária).
Datação no 1º trimestre:
Medir o comprimento crânio-caudal.
Deve haver consistência entre o comprimento crânio-caudal e a idade gestacional esperada com base na data da última menstruação (DUM).
Datação no 2º e 3º trimestres:
Realizada através de uma avaliação imagiológica do crescimento fetal, que pode ser usada no cálculo da estimativa do peso fetal (EPF) e na determinação da DPP a partir de medições específicas
Medidas incluídas:
Diâmetro biparietal e perímetro cefálico
Diâmetro e circunferência abdominal
Comprimento do fémur
Imagem ecográfica de um feto com 12 semanas: A linha amarela ponteada representa o comprimento crânio-caudal.
Imagem: “Ultrasound image of a 12-week fetus” por Child Health, Royal Aberdeen Children’s Hospital, University of Aberdeen, Foresterhill, Aberdeen AB25 2ZG, UK. Licença: CC BY 3.0
Medição do diâmetro biparietal (um componente da avaliação do crescimento fetal usado na estimativa do peso fetal)
Imagem : “Representative sample of biparietal diameter from Ghana Randomized Air Pollution and Health Study (GRAPHS) participant” por Boamah EA. Licença: CC BY 2.0
Comprimento do fémur (um componente da avaliação do crescimento fetal usado na estimativa do peso fetal)
Imagem : “Representative sample image of femur length from Ghana Randomized Air Pollution and Health Study (GRAPHS) participant” por Boamah EA. Licença: CC BY 2.0
Determinação do número de embriões
Para que seja obtida uma contagem fetal precisa, o útero deve ser completamente avaliado em todos os planos.
Gestação múltipla: quando está presente > 1 feto
Gémeos
Múltiplos de ordem superior (por exemplo, trigémeos, quadrigémeos, etc.)
Determinação da corionicidade em gestações múltiplas
A corionicidade serve para descrever se os fetos partilham o córion ou âmnio. Esta pode ser estabelecida através de diferentes achados ecográficos em diferentes tipos de gémeos:
Gémeos dicoriónicos/diamnióticos (cada gémeo tem o seu próprio corioâmnio e a sua própria placenta):
Membrana intergemelar espessa
Sinal do lambda: protrusão de tecido espessa e triangular que vai até à membrana intergemelar
2 placentas separadas (no entanto, se estiverem próximas uma da outra, podem aparecer como uma única placenta)
Monocoriónicos/diamnióticos (cada gémeo tem o seu próprio saco amniótico, mas partilham o córion e a placenta):
Membrana intergemelar fina
Sinal do T: A membrana intergemelar insere-se diretamente na parede do saco, sem a proeminência de tecido triangular espessa visualizada em gémeos diamnióticos dicoriónicos.
Placenta única
Monocoriónicos/monoamnióticos (os gémeos partilham o corioâmnio e a placenta)
Ausência de membrana intergemelar
Placenta única
Diagrama que descreve a corionicidade gemelar
Imagem : “Illustrates various types of chorionicity and amniosity (how the baby’s sac looks) in monozygotic (one egg/identical) twins as a result of when the blastocyst or embryo splits.” por Kevin Dufendach. Licença: CC BY 3.0
Imagem ecográfica de trigémeos tricoriónicos às 12 semanas de gestação:
Cada feto tem o seu próprio córion, âmnio e placenta. Os números (1‒3) indicam onde está cada um dos 3 fetos. As pontas de seta mostram o sinal do lambda, a porção triangular do tecido que se insere na membrana intergemelar.
Imagem: “Ultrasound picture of trichorionic triplets at 12 weeks gestational age” por Kristine Marceau. Licença: CC BY 4.0, cortado por Lecturio.
Imagem ecográfica de trigémeos dicoriónicos e triamnióticos com 13 semanas de gestação:
A ponta da seta localiza o sinal do lambda entre os 2 córions. A seta mostra o sinal do T entre os 2 fetos monocoriónicos-diamnióticos. Os números de 1‒3 indicam onde está cada um dos 3 fetos. O feto 1 tem a sua própria placenta, enquanto os fetos 2 e 3 partilham uma placenta comum.
Imagem: “Ultrasound picture of a dichorionic, triamniotic triplets at 13 weeks gestational age” por Kristine Marceau. Licença: CC BY 4.0, cortado por Lecturio.
Avaliação anatómica
Uma avaliação anatómica completa avalia tanto o trato reprodutor materno quanto a presença de anomalias fetais. Algumas das características mais importantes são:
Anatomia materna:
Comprimento cervical: deve ser > 25 mm até, pelo menos, as 24 wga
Presença de um mioma no útero que distorce a cavidade, ou no segmento uterino inferior, que pode dificultar uma potencial incisão para cesariana
Massas anexiais
Avaliação da placenta e do cordão umbilical:
Placenta:
Não deve cobrir o orifício cervical interno
Não deve invadir o miométrio subjacente
Cordão umbilical:
Devem ser visíveis 3 vasos
Deve inserir-se próximo do meio da placenta e no umbigo fetal
Os vasos devem estar envolvidos por uma geleia protetora até à inserção na placenta.
Anatomia fetal: Múltiplas estruturas, incluindo todos os principais órgãos, são medidas e avaliadas.
Cérebro
Face
Coração/pulmões, incluindo a visualização das 4 câmaras e do trato de saída cardíacos
Abdómen
Membros
Genitais
Avaliação do líquido amniótico
O líquido amniótico pode ser avaliado de 2 maneiras:
Bolsa única mais profunda (SDP, pela sigla em inglês):
Mede a bolsa de fluido vertical mais profunda
A bolsa medida não deve conter cordão umbilical nem partes fetais.
Intervalo de referência (2º e 3º trimestres): 2‒8 cm
Índice de líquido amniótico (AFI, pela sigla em inglês):
Divisão do útero em 4 quadrantes e obtenção da SDP para cada quadrante; o AFI é a soma destas 4 medições.
Intervalo de referência (2º e 3º trimestres): 5‒24 cm
Resumo dos achados normais na ecografia obstétrica
Gravidez intrauterina única
Frequência cardíaca fetal entre 120 a 160 batimentos por minuto
Ausência de identificação de anomalias congénitas importantes
Fixação placentária normal, longe do orifício cervical
Cordão umbilical com 3 vasos
Volume de líquido amniótico normal
Comprimento cervical > 25 mm, pelo menos, até às 24 wga
Peso fetal adequado para a idade gestacional
Posição fetal de vértice no fim do 3º trimestre (não importante antes)
Achados Anormais na Ecografia Obstétrica
Podem ser identificadas várias anomalias na ecografia obstétrica.
Gravidez anormal/inviável
Ameaças de abortamento e abortos retidos:
Ameaça de abortamento:
Gravidez com a presença de sinais clínicos que indicam a possibilidade de ocorrência de um abortamento espontâneo (por exemplo, hemorragia e cólicas)
A frequência cardíaca fetal (FCF) ainda está presente.
Podem ser visíveis áreas hiper ou hipoecoicas perto da placenta ou atrás das membranas, sugestivas de hemorragia.
Aborto retido:
Presença de um feto no útero, mas sem viabilidade.
Ausência de FCF.
Gravidez ectópica:
Uma gravidez ectópica caracteriza-se pela implantação fora da cavidade uterina. Os achados ecográficos incluem:
Massa anexial heterogénea
Sinal do anel tubário: presença de um anel ecogénico a separar a gravidez ectópica do ovário
Saco pseudogestacional :
Saco quístico dentro do útero, sem embrião
Presença de reação decidual: endométrio espessado e com aumento da ecogenicidade em redor do saco intrauterino (porque as hormonas da gravidez estão a ser produzidas na mesma pela gravidez ectópica)
Enganador, uma vez que pode parecer idêntico a um saco gestacional inicial, antes do aparecimento do saco vitelino
Ausência de identificação de uma gravidez com uma HCG > 2.000
A presença de líquido livre peritoneal, possivelmente com ecogenicidade interna de baixo nível, é sugestiva da ocorrência de hemorragia por rutura de uma gravidez ectópica.
Nota sobre gestações heterotópicas (gestações gemelares com 1 gravidez uterina e 1 ectópica):
Possível, mas extremamente raro
Apesar de identificada uma gestação intrauterina, os anexos devem ser avaliados para a presença de massas; se não houver uma gravidez intrauterina, a gravidez heterotópica pode ser excluída.
Ecografia transvaginal onde se observa um útero vazio (esquerda) com espessamento endometrial e uma massa ecogénica (direita), que representa uma gravidez ectópica adjacente ao tecido ovárico normal
Imagem de Hetal Verma.
Gravidez molar:
A gravidez molar é um tipo de doença trofoblástica gestacional causada por fertilização anormal.
Como ocorre:
Mola completa: Um óvulo anucleado (ou seja, um ovo sem ADN) é fertilizado por 1 espermatozoide (que se duplica) ou por 2 espermatozoides (raro).
Mola parcial: 2 espermatozoides fertilizam um óvulo haplóide.
Achados ecográficos:
Aumento de tamanho do útero
Heterogeneidade do tecido intrauterino, com uma aparência clássica em “tempestade de neve”
Espaços quísticos: anecoicos
Tecido placentar: hiperecogénico
Pode ou não estar presente o feto/partes fetais.
Podem estar presentes quistos ováricos grandes bilateralmente.
Ecografia transvaginal de uma gravidez molar: O padrão é descrito como sendo em “cacho de uvas”.
Imagem : “Molar pregnancy” por Mikael Häggström. Licença: CC0 1.0
Retenção de produtos de conceção:
Pode haver retenção de tecido no útero após um aborto (espontâneo ou induzido) ou no pós-parto após a expulsão da placenta. Este fenómeno é conhecido como retenção de produtos de conceção e pode cursar com hemorragia e infeção. Na ecografia pode encontrar-se:
Material intrauterino heterogéneo (tipicamente hiperecoico)
Aumento de tamanho do útero
Aumento do fluxo sanguíneo para a massa, objetivado no modo Doppler
Ecografia transvaginal onde se observa uma massa ecogénica heterogénea na cavidade endometrial (seta preta), que representa a retenção de produtos de conceção.
Imagem : “Gray-scale US demonstrates an echogenic mass in the endometrial cavity (black arrow)” por Maureen P. Kohi et al. Licença: CC BY 3.0
Anomalias fetais
Translucência da nuca para o rastreio de aneuploidias:
A avaliação da translucência da nuca (ou espessura da prega da nuca na parte de trás do pescoço) faz parte dos testes comummente utilizados no rastreio de aneuploidias.
Medição da região hipoecoica entre a pele e os tecidos moles atrás da coluna cervical
A presença de uma prega da nuca espessada aumenta o risco de:
Trissomia 21 (mais comum)
Trissomias 13 e 18
Síndrome de Turner
Cardiopatias congénitas major
Hidrocefalia
> 100 síndromes genéticas e do desenvolvimento diferentes já foram também associadas ao aumento da prega da nuca
Medição da translucência da nuca (NT, pela sigla em inglês):
A figura (A) mostra um feto normal (“a olhar” para cima). Na figura (B) observa-se um feto com trissomia do 21 (“a olhar” para baixo) e aumento da espessura da NT.
Imagem : “Nuchal translucency measurements” por Barati M et al. Licença: CC BY 2.5
Anomalias congénitas:
Praticamente qualquer região do corpo pode ter um desenvolvimento incorreto, provocando anomalias congénitas. Muitas delas são visíveis na ecografia. De seguida estão enumeradas algumas das anomalias clinicamente relevantes e os seus achados ecográficos:
Defeitos cardíacos (os mais comuns, ocorrem em aproximadamente 1% dos nascimentos):
Uma ecografia fetal completa pode ser realizada “in utero” → pode ser identificado todo o espetro de lesões
Defeitos clinicamente relevantes incluem:
Tetralogia de Fallot
Transposição de grandes vasos
Truncus arteriosus
Orifícios: defeito do septo ventral, defeito do canal auriculoventricular
Anencefalia (defeito do tubo neural mais comum): ausência do cérebro
Cefalocelo: defeitos cranianos através dos quais o cérebro ou as meninges herniam para fora do crânio
Espinha bífida/meningocelo/mielomeningocelo: protrusão do conteúdo espinhal através de defeitos ósseos na coluna
Defeitos da parede abdominal:
Onfalocelo: Herniação de múltiplas ansas intestinais (+/- fígado) através de um defeito abdominal na linha média coberto por membrana.
Gastrosquise: As ansas intestinais projetam-se para fora da cavidade abdominal na ausência de uma membrana envolvente, através de um defeito na parede abdominal lateral.
Imagem ecográgica da tetralogia de Fallot: Nesta figura observa-se um grande defeito do septo ventricular, sobreposição aórtica e hipertrofia ventricular direita, achados característicos da tetralogia de Fallot.
Imagem : “Tetralogy of Fallot” por North Carolina Children’s Heart Center, Department of Pediatrics, University of North Carolina at Chapel Hill, Chapel Hill, NC, USA. Licença: CC BY 2.0
Ecografia bidimensional de um meningocelo, um tipo de defeito do tubo neural
Imagem : “Two-dimensional ultrasound showing a meningocele” por Cavalheiro S et al. Licença: CC BY 4.0
Ecografia de um onfalocelo fetal
Imagem : “Ultrasound of a fetal omphalocele” por Agarwal R et al. Licença: CC BY 3.0
Restrição do crescimento intrauterino (RCIU):
Ecografia de avaliação do crescimento com uma EPF anormalmente baixa
Tipicamente definido como uma EPF < percentil 10 para a idade gestacional estimada
Hidrópsia fetal:
A hidrópsia fetal corresponde a coleções anormais de fluido em ≥ 2 dos seguintes compartimentos fetais:
Edema cutâneo significativo (presente em quase todos os lactentes com hidrópsia) com > 5 mm
Ascite
Derrames pleurais
Derrames pericárdicos
Outros achados ecográficos possíveis:
Polihidrâmnios
Aumento da translucência da nuca
Aumento da espessura placentária
Ecografia de uma criança com hidrópsia fetal: Nas imagens em corte axial (A) e sagital oblíquo (B) observa-se a presença de ascite fetal (seta branca curta) e ansas intestinais flutuantes (b); imagem axial da cabeça fetal (C) com edema significativo do couro cabeludo (seta branca comprida)
Imagem : “Ultrasound images of an infant with hydrops fetalis” por Afzal et al. Licença: CC BY 3.0
Anomalias placentárias
Placentação anormal:
Uma placentação anormal corresponde a uma implantação anormal da placenta. Os achados ecográficos podem revelar uma anormal localização da placenta ou uma anormal invasão da parede uterina.
Placenta prévia: A placenta cobre o orifício cervical interno.
Placenta de implantação baixa: A placenta está a 2 cm do orifício cervical interno.
Espetro da placenta acreta (PAS, pela sigla em inglês): Adesão anormal da placenta à parede uterina.
Placenta acreta (aproximadamente 65%): A placenta adere diretamente ao miométrio devido à ausência parcial ou total da decídua basal.
Placenta increta (15%): As vilosidades da placenta invadem o miométrio.
Placenta percreta (aproximadamente 20%): As vilosidades placentárias penetram todo o miométrio e podem invadir outras estruturas vizinhas.
Descolamento prematuro da placenta normalmente inserida (DPPNI):
O DPPNI refere-se à separação prematura da placenta, que leva a hemorragia materno-fetal. Geralmente, só existem achados ecográficos em grandes descolamentos, estes podem incluir:
Hematoma retroplacentário hiper ou isoecoico
Heterogeneidade placentar
Separação dos limites placentários do útero
Espessamento da placenta
Descolamento agudo da placenta: É possível observar-se uma placenta volumosa e heterogénea (setas) numa gestante hipertensa com 29 semanas.
Imagem : “Acute placental abruption” por Kinare A. Licença: CC BY 2.0
Anomalias do líquido amniótico
A avaliação do líquido amniótico, pelo menos com a SDP (bolsa única mais profunda), deve fazer parte de todas as ecografias obstétricas. As anomalias deste incluem:
Polihidrâmnio: demasiado líquido (SDP ≥ 8 cm ou AFI ≥ 24 cm)
Oligohidrâmnio: muito pouco líquido (SDP < 2 cm ou AFI ≤ 5 cm)
Anidrâmnio: ausência de líquido (não é possível medir nenhuma bolsa de líquido)
Medição ecográfia da bolsa vertical de líquido mais profunda, para determinar o volume de líquido amniótico. Neste caso está presente um polihidrâmnio (SDP > 8cm).
Imagem : “Demonstration of the technique to measure a single vertical pocket of liquor” por Kinare A. Licença: CC BY 2.0
A realização de exames de imagem obstétricos com modalidades além da ecografia é de utilidade limitada e confinada a indicações muito específicas.
A ressonância magnética pode ser usada para:
Avaliação de anomalias congénitas fetais específicas observadas na ecografia
Caracterização da anatomia pélvica materna na presença de anomalias incomuns ou complexas
A TC quase nunca está indicada para a avaliação do feto ou da anatomia pélvica materna por indicações obstétricas.
Achados da ressonância magnética de um feto com 23 wga, sugestivos da malformação fetal de Chiari II: a: Imagem sagital ponderada em T2 com um defeito do tubo neural lombossagrado (círculo) e herniação das amígdalas do cerebelo (seta) b: Imagem sagital ponderada em T2, onde se observa um mielomeningocelo (círculo) desde L2 até ao final do sacro c: Imagem axial ponderada em T2 de um mielomeningocelo (círculo) d: Imagem axial ponderada em T2 com hidrocefalia
Imagem : “Neural tube defect with tonsillar herniation” por Loomba R. Licença: CC BY 3.0
Imagiologia não obstétrica durante a gravidez
A ecografia e a ressonância magnética são as modalidades de escolha devido à ausência de exposição a radiação.
Exemplo: A ecografia abdominal é o exame inicial preferido na apendicite, em vez da TC.
Raio-X de tórax:
O abdómen deve ser protegido.
Feito apenas quando absolutamente necessário (por exemplo, deterioração clínica na suspeita de pneumonia).
Indicado em casos de coriocarcinoma para avaliação da presença de metástases pulmonares
Quando a TC é a modalidade requerida para o estabelecimento de um diagnóstico importante (por exemplo, doente com sintomas de AVC):
A realização de uma única TC na gravidez é considerada relativamente segura.
Os riscos/benefícios devem ser cuidadosamente ponderados e discutidos com a doente.
Opacidade redonda do espaço aéreo do pulmão esquerdo numa doente com doença trofoblástica gestacional
Imagem : “The appearance of lung metastasis in patient that was reported” por Ghaemmaghami F. Licença: CC BY 2.5
Relevância Clínica
Os exames de imagem obstétricos são uma parte crítica de quase todos os cuidados gestacionais.
Diagnóstico de gestações anormais
Gravidez ectópica: gravidez que se implantou fora da cavidade uterina, mais frequentemente nas trompas de Falópio. Estas são inviáveis e podem romper com a progressão do crescimento, culminando numa hemorragia materna ameaçadora da vida. As doentes apresentam-se geralmente com dor abdominal inferior e/ou hemorragia anormal; o teste de gravidez na urina é positivo. O tratamento é com metotrexato ou excisão cirúrgica, dependendo dos casos.
Gravidez molar: ocorre devido a uma fertilização anormal, culminando numa genética embrionária alterada. A apresentação clínica clássica é com hiperémese (náuseas e vómitos intensos), hemorragia vaginal do 1º trimestre e útero de tamanho superior ao esperado para a idade gestacional estimada. O diagnóstico é feito com ecografia e níveis anormalmente elevados de hCG. Os pilares do tratamento são a aspiração e curetagem e é essencial a monitorização pós-procedimento de forma a garantir que não se desenvolve uma doença invasiva.
Tabela: Características de gestações molares completas versus parciais
Mola completa
Mola parcial
Cariótipo
46,XX ou 46,XY
Triplóide (69,XXX, 69,XXY ou 69,XYY)
Formação a partir de
Ovo anucleado e um único espermatozoide
2 espermatozoides e 1 óvulo
Partes fetais
Ausentes
Presentes
Nível de gonadotrofina coriónica humana
↑↑↑
↑
Achados da ecografia
Útero em favo de mel
“Cachos de uvas”
Útero em “Tempestade de Neve”
Revela partes fetais
Risco de malignidade
Maior risco de coriocarcinoma
Rara
Problemas fetais
Anomalias fetais: anomalias no feto causadas por alterações genéticas, cromossómicas ou do desenvolvimento. Estas podem ocorrer em qualquer sistema orgânico do corpo; a apresentação clínica e o tratamento dependem da anomalia específica em questão. As mais comuns são os defeitos cardíacos e do tubo neural.
Restrição do crescimento fetal (RCF): uma condição, também conhecida como RCIU, referente ao crescimento fetal reduzido in utero causado por fatores ambientais. A restrição do crescimento fetal é normalmente definida como uma EPF < percentil 10 para a idade gestacional estimada. A patogénese primária deve-se à má perfusão através da placenta, limitando a disponibilidade de oxigénio e nutrientes para o feto. Existem inúmeras etiologias fetais, maternas e placentárias.
Hidrópsia fetal: acumulação anormal de líquidos no feto. O diagnóstico requer pelo menos 2 das seguintes apresentações (todas visíveis na ecografia obstétrica): pele edemaciada, ascite, derrames pleurais ou derrames pericárdicos. A hidrópsia fetal é frequentemente causada por anticorpos maternos contra hemácias fetais, levando a anemia fetal grave, embora existam também várias etiologias não imunes (por exemplo, infeção por parvovírus B19). Muitas vezes, o tratamento inicial é com uma monitorização rigorosa, e indução do parto prematuro quando o estado fetal começa a deteriorar.
Placentação anormal
Placenta prévia: presença de tecido placentário a cobrir o orifício cervical interno. Com o início da dilatação do colo do útero, a placenta “descola-se” sobre o orifício cervical interno, resultando numa hemorragia materno-fetal ameaçadora de vida. O diagnóstico é feito com a ecografia obstétrica (geralmente transvaginal). O tratamento é com a evicção do toque vaginal e realização de parto por cesariana previamente ao início do trabalho de parto.
Espetro da placenta acreta (PAS, pela sigla em inglês): corresponde a um espetro de patologias em que a placenta está anormal e firmemente aderida à parede uterina. Nestas, a placenta é incapaz de descolar no pós-parto e continua a sangrar, muitas vezes de forma intensa, com hemorragia ameaçadora de vida. Os 3 graus do PAS são a placenta acreta, increta e percreta. O diagnóstico é feito com ecografia e o tratamento é geralmente cirúrgico, muitas vezes incluindo o planeamento de uma histerectomia no momento da cesariana.
Volumes anormais de líquido amniótico
Polihidrâmnio: excesso patológico de líquido amniótico. As causas mais comuns incluem anomalias fetais, diabetes gestacional, gestações múltiplas e infeções congénitas. O diagnóstico é feito com base na ecografia com um AFI ≥ 24 cm ou uma SDP ≥ 8 cm. O tratamento dos casos moderados a graves inclui amnioredução, tratamento médico e gestão cuidadosa do trabalho de parto. As principais complicações são o prolapso do cordão e o descolamento da placenta no momento da rutura da membrana.
Oligohidrâmnio: uma condição caracterizada por volumes de líquido amniótico patologicamente reduzidos. Este é diagnosticado por ecografia e definido como um AFI ≤ 5 cm ou uma SDP < 2 cm no 2º e 3º trimestres. As etiologias incluem a insuficiência uteroplacentar, fármacos, malformações fetais (especialmente as relacionadas com os sistemas renal/urinário) e infeções maternas por TORCH. O tratamento envolve uma monitorização pré-natal rigorosa, uma vez que é possível a ocorrência de complicações importantes, como a RCF, parto prematuro e deformidades do desenvolvimento.
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