Um derrame pleural resulta da acumulação de líquido entre as camadas da pleura parietal e visceral. As causas mais frequentes desta condição incluem infeção, neoplasias malignas, doenças autoimunes e a sobrecarga de volume. As manifestações clínicas incluem dor torácica, tosse e dispneia. A imagiologia permite confirmar a presença do derrame e a análise do líquido pleural pode ajudar no estudo etiológico. O tratamento depende da doença subjacente e do facto de o derrame estar ou não a causar dificuldade respiratória. A drenagem do derrame pode proporcionar alívio sintomático.
Os derrames pleurais representam um desequilíbrio entre a produção de líquido pleural e a reabsorção linfática.
Fisiologia normal
O líquido pleural é um produto das forças de Starling dentro do leito capilar da pleura parietal sendo absorvido pelos vasos linfáticos nas superfícies diafragmática e mediastínica da pleura parietal.
A taxa média normal de produção e de absorção do líquido pleural é de 0,2 mL/kg/hora.
Todo o volume de líquido pleural é geralmente substituído em 1 hora.
Os vasos linfáticos conseguem absorver um fluxo até cerca de 20 vezes superior à taxa de produção normal → a reabsorção linfática tem uma grande capacidade de reserva.
Transudados
Um derrame pleural transudativo resulta do aumento da entrada de líquido no espaço pleural devido a:
↑ Pressão hidrostática nos vasos (por exemplo, ICC)
↓ Forças oncóticas no plasma (por exemplo, hipoalbuminemia)
Movimento de líquido ascítico através do diafragma (por exemplo, hidrotórax hepático)
Exsudados
Um derrame pleural exsudativo pode resultar de:
↑ Permeabilidade capilar → ↑ Níveis pleurais de:
Proteínas
Células
Outros conteúdos plasmáticos (dependendo da etiologia)
Disfunção da drenagem linfática por:
Infiltração ou bloqueio maligno dos vasos linfáticos
Processos inflamatórios
Compressão mecânica dos vasos linfáticos
↑ agudo na pressão venosa sistémica
Apresentação Clínica
Sintomas
Alguns derrames pleurais são assintomáticos. Os sintomas podem variar e dependem da gravidade e da etiologia do derrame.
Dispneia (mais comum)
Dor torácica pleurítica:
A dor agrava com a inspiração profunda.
Indica inflamação pleural
Febre
Tosse
Exame objetivo pulmonar
Inspeção:
Expansão torácica assimétrica (expansão reduzida no lado do derrame)
Espaços intercostais “cheios”
Palpação:
↓ ou ausência dos frémitos táteis
Desvio traqueal:
A traqueia é empurrada para o lado oposto ao do derrame.
Presente nos derrames grandes e graves
Auscultação:
Sons respiratórios ↓ ou inaudíveis na área sobre o derrame
Sons respiratórios brônquicos, broncofonia e egofonia:
Ouvidos sobre a região do pulmão diretamente acima do derrame
Devem-se à consolidação do pulmão nessa área
Atrito pleural
Percussão:
No caso de um derrame > 300 mL, o exame do tórax também irá revelar macicez à percussão.
A borda superior da macicez segue uma curva ascendente lateralmente com ápice na linha axilar média (linha de Ellis-Damoiseau).
Linha de Ellis–Damoiseau: Este desenho mostra a forma que a macicez à percussão irá apresentar ao avaliar um derrame pleural.
Imagem de Lecturio.
Pistas diagnósticas da etiologia subjacente
Os derrames parapneumónicos (adjacentes a uma pneumonia) podem apresentar sinais de sépsis ou de choque séptico.
Febre
Taquicardia
Hipotensão
Os derrames transudativos podem estar associadas a:
Aumento do peso
Edemas periféricos
Distensão venosa jugular
Os derrames pleurais malignos podem associar-se a:
Os derrames pleurais geralmente são detetados facilmente na imagem.
Radiografia de tórax:
O melhor exame inicial
Achados:
Apagamento anormal dos ângulos costofrénicos
Fluido nas fissuras horizontais ou oblíquas
Alguns derrames podem apresentar um menisco
Derrames maciços
Opacificação completa de um hemitórax
Desvio traqueal para o lado contrário ao afetado
Desvio do mediastino
Incidência em decúbito lateral
Mais sensível
Pode demonstrar uma camada de fluido (derrame pleural com movimento livre)
TC de tórax:
Permite detetar pequenas quantidades de líquido pleural
Capaz de avaliar todo o parênquima pulmonar e mediastino para identificar potenciais etiologias.
Ecografia:
Alta sensibilidade para o diagnóstico de derrames pleurais
Permite detetar pequenas quantidades de líquido pleural que podem não ser identificadas no raio-X
Frequentemente utilizada para visualizar o derrame para realizar toracocentese ou para colocação de um dreno torácico.
Radiografia de um derrame pleural maciço à direita com opacificação completa do hemitórax direito e desvio traqueal para a esquerda
Imagem: “X-ray of patient’s chest revealing a right-sided pleural effusion” do Department of Gastroenterology, Queen’s Hospital, Burton-on-Trent, West Midlands, UK. Licença: CC BY 2.0
Radiografia que mostra um derrame pleural bilateral: Notar o apagamento do ângulo costofrénico (principalmente à direita) e o aparecimento de um menisco à esquerda.
Imagem: “Pleural effusion while being on carbimazole” do Department of Diabetes and Endocrinology, Glan Clwyd Hospital, Rhuddlan Road, Bodelwyddan, Rhyl LL18 5UJ, UK. Licença: CC BY 3.0
Radiografias onde se observam derrames pleurais bilaterais: a: Apagamento de ambos os ângulos costofrénicos. b: Imagem em decúbito lateral mostra a acumulação de líquido devido a um derrame pleural esquerdo (setas).
Imagem: “Radiologic findings” by Departamento de Clínica Médica, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo (USP), Ribeirão Preto, São Paulo, 14049-900, Brazil. Licença: CC BY 4.0, cortada por Lecturio.
Imagem de TC que monstra um derrame pleural bilateral num doente com silicose pulmonar: As regiões em forma de crescente, opacificadas e bilaterais, abaixo dos pulmões são os derrames.
Imagem: “Chest CT” do Internal Medicine Department, St. Luke’s Hospital, Chesterfield, MO 63017, USA. Licença: CC BY 3.0
Ecografia que mostra um derrame pleural (seta a apontar para a região hipoecogénica)
Imagem : “Derrame Pleural” pelo Departamento de Radiologia/Radiologia Intervencionista, Instituto de Fígado e Ciências Biliares, Vasant Kunj, Nova Delhi, Índia. Licença: CC BY 4.0
Considerações imagiológicas
Alguns achados imagiológicos ajudam a estreitar a lista de possíveis causas do derrame pleural.
Derrames pleurais bilaterais:
Ocorrem mais frequentemente nos estados de sobrecarga de volume (por exemplo, ICC)
O diagnóstico diferencial deve incluir também neoplasia maligna, lúpus e pericardite constritiva.
Derrames maciços:
Neoplasias malignas
Derrame parapneumónico complicado ou empiema
Tuberculose
Derrames loculados:
Causados por aderências entre superfícies pleurais contíguas
Geralmente associados a estados inflamatórios mais exuberantes (por exemplo, empiema, hemotórax, tuberculose)
Análise do líquido pleural
Assim que um derrame pleural é identificado, o próximo passo é colher uma amostra do líquido pleural através de uma toracocentese.
Os estudos efetuados por rotina incluem:
O líquido pleural deve ser enviado para:
Culturas e microscopia
Bactérias
Bacilos álcool-ácido resistentes
Fungos
Citologia
Contagem diferencial de células
pH
LDH
Proteínas
Albumina
Glicose
Análises séricas a pedir para os critérios de Light:
LDH
Proteínas
Albumina
Investigação adicional (com base na suspeita clínica):
Amilase → pancreatite, rotura esofágica
Triglicerídeos → quilotórax
Fator reumatoide e anticorpos antinucleares → doenças autoimunes
Esfregaço de bacilos álcool-ácido resistentes e adenosina desaminase → TB
Investigações comuns do líquido pleural e diagnósticos associados
Análise do fluido
Achados
Diagnósticos associados
Aspeto do fluido
Cor de palha
Transudado
Pus
Empiema
Hemático
Hemotórax
Neoplasias malignas
Embolia pulmonar
Leitoso
Quilotórax
pH
> 7,55
Líquido pleural normal
< 7,2
Derrame parapneumónico
complexo
Empiema
Glicose
< 60 mg/d
Derrame parapneumónico complicado
Empiema
Doenças autoimunes
Derrame pleural maligno
Contagem celular
10.000 leucócitos/µL
Derrame parapneumónico
Empiema
Doenças autoimunes
Embolia pulmonar
Predominância de
neutrófilos
Infeção bacteriana
Predominância
de linfócitos
Tuberculose
Neoplasias malignas
Quilotórax
> 5.000 eritrócitos/µL
Hemotórax
Neoplasias malignas
Adenosina desaminase
> 50 µg/L
Tuberculose
Amilase
> 200 µg/dL
Pancreatite
Rotura esofágica
Triglicerídeos
> 110 mg/dL
Quilotórax
Culturas
Bacteriana
Fúngica
Bacilos álcool-ácido resistentes
Derrame parapneumónico
Citologia
Análise celular
Neoplasias malignas
Procedimentos avançados
Pode-se ponderar a realização dos seguintes exames se a história clínica, o exame objetivo, a imagiologia e a análise do líquido pleural não estabelecerem um diagnóstico e o doente apresentar sintomas preocupantes (por exemplo, perda de peso, febre persistente).
Broncoscopia: pode auxiliar no diagnóstico de neoplasia maligna ou de causas infeciosas
Biópsia pleural:
Pode ser realizada se houver suspeita clínica de malignidade ou TB
Uma grande quantidade de líquido turvo e leitoso removido durante uma toracocentese de um quilotórax
Imagem: “600 cubic centimeters of chyle removed from a chylothorax” de Matani S, Pierce JR. Licença: CC BY 3.0
Derrame parapneumónico
Líquido pleural exsudativo e neutrofílico, associado a pneumonia
Classificação:
Não complicado
Sem invasão bacteriana da pleura
Irá resolver com o tratamento da pneumonia
Complicado
Invasão bacteriana da pleura
As bactérias são rapidamente eliminadas do espaço pleural → as culturas geralmente são negativas
Empiema
Infeção bacteriana da pleura
O líquido pleural será espesso, viscoso e opaco (pus).
Pode levar à deposição de fibrina e restrição dos movimentos pulmonares
Hemotórax
Acumulação de sangue na cavidade pleural
Etiologia:
Traumático
Não traumático:
Neoplasias malignas
Coagulopatia
Doença do tecido conjuntivo ou vascular
A análise do líquido pleural irá revelar:
Sangue
↑ Contagem de eritrócitos
Tratamento
Tratamento inicial
Doentes assintomáticos geralmente não necessitam de tratamento e muitas vezes ocorre reabsorção espontânea do derrame. No entanto, nos doentes sintomáticos deve ser feito o seguinte:
Avaliação das vias aéreas, respiração e circulação.
Oxigenoterapia suplementar.
Drenagem urgente se:
Dificuldade respiratória grave ou insuficiência respiratória
Evidência de choque obstrutivo
Intervenções
Toracocentese:
Aspiração por agulha de líquido pleural
Diagnóstica e terapêutica
Pode ser repetida se houver reacumulação de fluido
Colocação de dreno torácico (toracostomia):
Colocação de um dreno cirúrgico no espaço pleural
Essencial no empiema e no hemotórax
Cateter pleural:
Cateter que penetra no espaço pleural
Permite a drenagem intermitente do líquido pleural
Usado nos derrames pleurais refratários (que necessitam de toracocenteses frequentes, como nas neoplasias malignas)
Pleurodese:
Obliteração do espaço pleural por indução de inflamação e fibrose
Pode ser realizada com produtos químicos (por exemplo, talco) ou com abrasão manual
Usada nos derrames pleurais refratários
Pleurectomia e descorticação:
Opção cirúrgica se todas as medidas acima falharem
Usada como último recurso nos casos avançados
Imagem que descreve a técnica básica de toracocentese, que permite a aspiração de um derrame pleural
Imagem de Lecturio.
Tratamento da etiologia subjacente
O tratamento dos derrames pleurais depende da identificação e tratamento da etiologia subjacente.
Derrame parapneumónico e empiema:
Antibióticos
Toracocentese ou drenagem torácica
Derrame pleural maligno:
Tratamento adequado da neoplasia primária
Quimioterapia
Radioterapia
Pode necessitar drenagem frequente ou intervenção avançada (por exemplo, pleurodese, cateter pleural)
Hemotórax:
Colocação de dreno torácico
Identificar e parar a fonte hemorrágica:
Exploração cirúrgica
Radiologia de intervenção
Transfusão de sangue, conforme necessária
Derrames transudativos:
ICC: diurese
Hidrotórax hepático:
Diurese
Shunt portossistémico transjugular
Insuficiência renal com sobrecarga hídrica: hemodiálise
Complicações
Complicações do derrame pleural
Insuficiência respiratória:
Agravamento da hipóxia
Dificuldade respiratória
Derrames pleurais loculados:
Compartimentalização de um derrame pleural em espaços menores por camadas fibrosas
Ocorrem classicamente no empiema, hemotórax e tuberculose
Tratam-se com agentes fibrinolíticos intrapleurais
Pulmão encarcerado:
Pulmão incapaz de expandir devido à formação de um tecido fibroso na pleura visceral
Secundário à inflamação, infeção ou malignidade pleural ativa
Choque:
Choque obstrutivo: efeito compressivo do mediastino que causa comprometimento do débito cardíaco
Choque séptico: resulta de uma infeção que causa instabilidade hemodinâmica e disfunção de órgão-alvo
Choque hemorrágico: pode ocorrer no hemotórax traumático
Complicações da toracocentese
Pneumotórax
Lesão vascular → hemotórax
Edema pulmonar de reexpansão
Referências
Na M. (2014). Diagnostic tools of pleural effusion. Tuberculosis and Respiratory Diseases 76(5):199–210.
Jany B, Welte T. (2019). Pleural effusion in adults—etiology, diagnosis, and treatment. Deutsches Aerzteblatt Online 116(21):377–386.
Karkhanis V, Joshi J. (2012). Pleural effusion: diagnosis, treatment, and management. Open Access Emergency Medicine 4:31–52.
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