Tratamento da Dor Obstétrica

O trabalho de parto pode ser extremamente doloroso, sendo uma parte importante dos cuidados obstétricos, o tratamento adequado da dor durante o mesmo e durante a expulsão fetal. Deve-se administrar o tratamento apropriado com base nas preferências e necessidades médicas da grávida. Encontram-se disponíveis opções farmacológicas e não farmacológicas para o controlo da dor. O pedido materno é, por si só, indicação suficiente para o tratamento farmacológico. As opções incluem analgésicos sistémicos, como o óxido nitroso inalado e opioides, bem como técnicas locais e regionais, que incluem o bloqueio do nervo pudendo, analgesia epidural e raquianestesia. A anestesia geral pode ser utilizada em situações verdadeiramente emergentes, com necessidade urgente de parto por cesariana.

Última atualização: May 25, 2022

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

Descrição Geral

Definição

O tratamento da dor obstétrica consiste no uso de medidas, farmacológicas e não farmacológicas, disponíveis para ajudar a controlar o desconforto durante o trabalho de parto e o parto. Estas medidas podem ser utilizadas em partos vaginais espontâneos e cesarianas.

Perceção materna da dor do trabalho de parto

  • A dor do trabalho de parto é influenciada pelas circunstâncias emocionais, motivacionais, cognitivas, sociais e culturais da mulher.
  • A perceção pode variar significativamente entre as mulheres.
  • A dor pode ser afetada pelos seguintes fatores:
    • Posição fetal
    • Forma e tamanho da pelve materna
    • Paridade materna (ou seja, mulheres nulíparas vs. multíparas)
    • Integridade das membranas fetais (ou seja, rota vs. intacta)
    • Comorbilidades médicas (por exemplo, fibromialgia)
    • Complicações obstétricas (por exemplo, infeção intra-amniótica)

Técnicas não farmacológicas para o tratamento da dor

  • Deambulação
  • Mudanças de posição
  • Massagem
  • Água quente (por exemplo, banho de chuveiro ou banheira)
  • Meditação/auto-hipnose

Indicações para o tratamento farmacológico da dor

Segundo o American College of Obstetrics and Gynecology (ACOG), “Em nenhuma circunstância, é considerado aceitável que um indivíduo sinta uma dor intensa e que a mesma não seja tratada, quanto é passível uma intervenção segura enquanto este está sob os cuidados de um médico”.

  • O pedido materno, para as grávidas em trabalho de parto, é, por si só, indicação suficiente para controlar a dor.
  • Devem ser oferecidas, a todas as grávidas, medidas adequadas para o tratamento da dor.
  • O tratamento deve ser administrado com base na preferência da grávida:
    • O juízo relativo à decisão pessoal é mais importante do que os níveis absolutos de dor.
    • A Depressão Pós-Parto (DPP) e a Perturbação de Stress Pós-Traumático (PSPT) associam-se com o não controlo da dor.
  • Na ausência de contraindicações médicas, as grávidas podem escolher:
    • Quando iniciar a analgesia do parto
    • O tipo de analgesia que preferem
    • Se querem, ou não, analgesia durante o parto

Opções para o tratamento farmacológico da dor

  • Analgésicos sistémicos
  • Analgésicos locais e regionais
  • Anestesia geral

Fisiologia

Dor no 1.º estádio do trabalho de parto

O 1.º estádio do trabalho de parto começa com o início das contrações uterinas regulares, que induzem alterações cervicais, e termina com a dilatação completa do colo do útero (10 cm).

A dor no 1.º estádio do trabalho de parto é:

  • Dor visceral em cólica
  • Com origem na:
    • Isquemia do útero durante as contrações
    • Distensão do colo do útero
    • Dor referida à parede abdominal, região lombo-sagrada e coxas
  • Percetível ao nível de T10-L1

Dor no 2.º estádio do trabalho de parto

O 2.º estádio do trabalho de parto inicia-se com a dilatação completa do colo do útero (10 cm) e termina com a expulsão fetal.

  • Normalmente, a dor é descrita como mais severa
  • Frequentemente percebida como uma pressão retal intensa
  • Causada pela combinação de:
    • Dor visceral do útero e colo do útero
    • Dor somática resultante da distensão da vagina e do períneo
  • A dor somática é transmitida através do nervo pudendo (S2-S4).

Analgésicos Sistémicos

Os analgésicos sistémicos podem ser utilizados durante o trabalho de parto, mas não são adequados para a cesariana. Normalmente, elegidos pelas grávidas para o tratamento nas fases iniciais do trabalho de parto, antes da administração da epidural.

Analgesia inalatória: óxido nitroso (“gás hilariante”)

  • Inalada, de forma intermitente, apenas durante as contrações
  • Autoadministrada pela grávida
  • Alívio da dor: mínimo e de curta duração
  • Efeitos adversos: lipotímia, tonturas e náuseas
  • Promove algum alívio da dor no início do trabalho de parto
  • Para as grávidas que preferem evitar as outras opções

Analgesia Intravenosa (IV): opioides

  • Pode ser administrada da seguinte forma:
    • Bólus IV intermitente de opioides em dose standard
    • Analgesia controlada pela grávida:
      • Pode, ou não, incluir a infusão contínua em dose baixa (taxa basal)
      • As grávidas podem autoadministrar bólus de pequenas quantidades.
  • Opções de bólus IV intermitente (frequentemente administrado a cada 2–4 horas):
    • Nalbufina
    • Meperidina
  • Opções de analgesia controlada pela grávida:
    • Remifentanil
    • Fentanil
  • Alívio da dor:
    • Ligeiro a moderado
    • De curta duração
    • Promove um alívio superior em comparação com o oxido nitroso, mas significativamente inferior à epidural
  • Efeitos adversos: náuseas, vómitos e sonolência
  • Pode apresentar consequências para o feto, dado que os opioides atravessam a placenta, levando a:
    • Diminuição da variabilidade da frequência cardíaca fetal (FCF)
    • Depressão respiratória fetal, caso os fármacos permaneçam no sistema fetal após o parto → evitar dar opioides nas 4 horas após o parto

Técnicas da Analgesia Local e Regional

Bloqueio do nervo pudendo

  • Injeção de opioides no nervo pudendo (S2-S4)
  • Alívio da dor:
    • Excelente ao longo da distribuição nervosa
    • O efeito cobre apenas a parte inferior da vagina, lábios e períneo.
  • Utilizado para:
    • Parto vaginal instrumentado e correção de lacerações, nas grávidas sem epidural
    • Controlo adicional da dor quando a anestesia epidural não é suficiente para anestesiar adequadamente os nervos sacrais
  • Não promove a analgesia da dor uterina e não é útil para:
    • Dor das contrações durante o trabalho de parto
    • Cesarianas
  • Complicações: hemorragia devido à laceração inadvertida da artéria pudenda
Local de injeção para o bloqueio do nervo pudendo

Local de injeção para o bloqueio do nervo pudendo

Imagem por Lecturio. Licença: CC BY-NC-SA 4.0

Anestesia epidural

  • Administração continua e lenta de opioides no espaço epidural, via cateter
  • Alívio da dor:
    • Alívio contínuo da dor enquanto o cateter está colocado
    • Excelente alívio da dor ao nível de T8 e abaixo
    • Pode apresentar alguns “pontos quentes” (áreas com pouco alívio da dor)
  • Utilizado para:
    • Controlo da dor no parto vaginal
    • Cesariana:
      • Normalmente, é utilizada apenas após tentativas de trabalho de parto falhadas e quando a epidural está disponível no local (por exemplo, no trabalho de parto estacionário)
      • A raquianestesia é melhor do que a epidural para a cesariana, devido à ausência de “pontos quentes”.
  • Efeitos adversos maternos: hipotensão (pode causar insuficiência uteroplacentária até ser corrigida)
  • Contraindicações:
    • Determinadas coagulopatias
    • Aumento da pressão intracraniana
    • Infeções cutâneas na região inferior da coluna
Local de colocação do cateter epidural

Local de colocação do cateter epidural

Imagem por Lecturio. Licença: CC BY-NC-SA 4.0

Raquianestesia

  • Injeção única de opioides no espaço subaracnoideu
  • Alívio da dor:
    • Dura 2–4 horas
    • Excelente alívio da dor ao nível de T10 e abaixo
  • Utilizada para: cesarianas
  • Efeitos adversos maternos da raquianestesia:
    • Hipotensão (pode causar insuficiência uteroplacentária até ser corrigida)
    • Bradicardia
Local onde é injetado o opioide durante a raquianestesia

Local onde é injetado o opioide durante a raquianestesia

Imagem por Lecturio. Licença: CC BY-NC-SA 4.0

Anestesia regional

Tabela: Anestesia regional
Anestesia epidural Raquianestesia
Local da injeção Espaço epidural Espaço subaracnoideu
Nível da injeção T8 T10
Duração do alívio da dor Contínuo enquanto o cateter permanece no sítio 2–4 horas
Efeitos adversos Hipotensão Hipotensão e bradicardia

Anestesia Geral

  • Reservada para cesarianas emergentes: a raquianestesia deve ser sempre realizada como 1.ª linha, caso o tempo permita e não existam contraindicações específicas.
  • Aumenta o risco de:
    • Aspiração materna → pneumonite de aspiração
    • Hemorragia pós-parto (a anestesia geral causa atonia uterina)
    • Depressão respiratória fetal ao nascimento
  • Cuidados fetais:
    • Os pediatras devem estar presentes no parto para fornecerem suporte ventilatório, visto que o recém-nascido também estará sob os efeitos da anestesia geral.
    • O parto deve ocorrer o mais rapidamente possível após a administração da anestesia, para minimizar os efeitos fetais.

Referências

  1. Lowe, NK. (2002). The nature of labor pain. Am J Obstet Gynecol. 186(5 Suppl Nature), S16–24. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/12011870/
  2. Melzack, R, Taenzer, P, Feldman, P, & Kinch, RA. (1981). Labour is still painful after prepared childbirth training. Can Med Assoc J. 125(4), 357–63. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/7272887/
  3. Hodnett, ED. (2002). Pain and women’s satisfaction with the experience of childbirth: A systematic review. Am J Obstet Gynecol. 186(5 Suppl Nature), S160–72. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/12011880/
  4. Brownridge, P. (1995). The nature and consequences of childbirth pain. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 59 Suppl, S9–15. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/7556828/
  5. Goetzl, LM, ACOG Committee on Practice Bulletins-Obstetrics. (2002). ACOG Practice Bulletin. Clinical Management Guidelines for Obstetrician-Gynecologists Number 36, July 2002. Obstetric analgesia and anesthesia. Obstet Gynecol. 100(1), 177–91. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/12100826/
  6. Committee on Obstetrics. (2019). American College of Obstetrics and Gynecology Practice Bulletin No. 209: Obstetric Analgesia and Anesthesia. Retrieved May 27, 2021, from https://www.acog.org/clinical/clinical-guidance/practice-bulletin/articles/2019/03/obstetric-analgesia-and-anesthesia

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