Pica

Pica é uma perturbação do comportamento alimentar caracterizada por um desejo ou compulsão recorrente de comer substâncias que não são nutritivas nem alimentos. Estas compulsões e substâncias ingeridas não são adequadas para a idade nem para a cultura. A pica manifesta-se mais frequentemente durante a infância e durante a gravidez, portanto, apresenta um risco elevado de desnutrição e anemia. Os doentes geralmente apresentam deficiências nutricionais ou complicações decorrentes da ingestão de substâncias não alimentares. O objetivo do tratamento é uma estabilização farmacológica do doente e depois iniciar uma psicoterapia apropriada como opção de 1ª linha.

Última atualização: Oct 27, 2022

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

Descrição Geral

Definição

Pica é uma perturbação do comportamento alimentar de etiologia pouco clara, caracterizada por um desejo ou compulsão de comer substâncias que não são alimentos, num contexto que não é social ou culturalmente apropriado.

As substâncias específicas desejadas variam:

  • Geofagia (ingestão de terra):
    • Comum
    • Leva à obstipação, hipocalemia com miopatia e deficiências nutricionais.
    • Pode ser uma fonte de parasitas
    • O envenenamento por chumbo pode ser uma complicação grave aquando da ingestão de argila.
  • Pagofagia (ingestão de gelo):
    • Associado à deficiência de ferro
    • Cáries e sensibilidade dentária
  • Amilofagia (ingestão excessiva de amido):
    • Associada à deficiência de ferro
    • Leva a um alta taxa de açúcar no sangue e obesidade

Epidemiologia

  • A incidência é difícil de ser estimada:
    • Diversas definições clínicas
    • Subdiagnosticado
  • Maior taxa de prevalência surge em:
    • Crianças
    • Mulheres grávidas
  • Os rapazes e as raparigas são igualmente afetados
  • Fatores de risco:
    • Deficiência nutricional
      • Deficiência de ferro
      • Deficiência de zinco
    • Gravidez
    • Stress
    • Baixo nível socioeconómico
    • Deficiência intelectual
    • Negligência infantil
    • Doença mental subjacente:
      • Esquizofrenia
      • POC
      • Tricotilomania

Apresentação Clínica e Diagnóstico

Apresentação clínica

  • Os doentes normalmente procuram ajuda ou são trazidos pelos cuidadores quando os hábitos alimentares anormais são notados.
  • Pode também apresentar-se com as seguintes complicações:
    • Toxicidade e envenenamento (por exemplo, envenenamento por chumbo se ingestão de tintas ou argila)
    • Hipocalemia (ingestão de argila)
    • Obstrução GI (ingestão de bezoares)
    • Infeção parasitária (areia, lama, ingestão de argila)
  • Os doentes não têm intenção de automutilação/suicida; distinguir entre intoxicação intencional/sobredosagem.

Diagnóstico

O diagnóstico da pica é clínico e baseado nos padrões de comportamento alimentar observados:

  • Episódios recorrentes de ingestão de substâncias não nutricionais /não alimentares (por exemplo, giz, argila, pano, carvão, sujidade, pastilhas elásticas, cabelo, metal, tinta, papel, seixos, sabão, fio ou lã)
  • O comportamento alimentar é inadequado para o nível de desenvolvimento do doente e não é cultural ou socialmente aceitável.
  • Dura pelo menos 1 mês
  • Desordens do espectro do autismo, atrasos no desenvolvimento e incapacidade intelectual devem ser excluídos.

Os testes adicionais devem ser dirigidos para a etiologia, sintomatologia e substâncias ingeridas:

  • Contagens de células sanguíneas e estudos do ferro para o diagnóstico de anemia
  • Teste de chumbo se o doente ingeriu tinta
  • Painel metabólico básico para identificar hipocalemia na ingestão de argila
  • Análise para infeções parasitárias que podem ocorrer com a ingestão de solo
  • Radiografias abdominais para identificar obstrução intestinal por bezoars
Geofagia

Raio-X abdominal de um doente com pica:
Os doentes com pica têm compulsões de ingerir material não nutritivo. Alguns doentes fixam-se na ingestão de terra o que pode levar a obstrução intestinal. As radiografias abdominais podem ajudar na identificação das substâncias ingeridas (material brilhante visto na pélvis do paciente).

Imagem: “Silica in the soil that has been eaten by a woman” por SuSanA Secretariat. Licença: CC BY 2.0

Tratamento

Prevenção

  • Identificação de indivíduos em situação de risco
  • Remoção do doente da área de exposição
  • Fornecer substâncias alimentares com textura e cor semelhantes para substituição do material não alimentar

Tratamento médico

  • Avaliar e tratar as deficiências nutricionais subjacentes:
    • Anemia por deficiência de ferro
    • Zinco
    • Potássio
  • Psicoterapia:
    • TCC (Terapia de 1ª linha)
    • Reabilitação Nutricional
    • Terapia de aversão ligeira
  • Tratar complicações:
    • Limpeza intestinal médica/cirúrgica
    • Terapia antiparasitária
    • Tratar potenciais toxicidades.

Diagnóstico Diferencial

A Pica é classificada como uma perturbação alimentar e pode ter características em comum com outras perturbações desse tipo.

  • Anorexia nervosa: perturbação alimentar caracterizada pelo medo intenso de ganhar peso, hábitos alimentares restritos e imagem corporal distorcida. Os doentes com anorexia nervosa estão geralmente abaixo do peso e relutantes na procura de ajuda médica. O tratamento envolve TCC e medicação antidepressiva. Os casos mais graves podem exigir hospitalização.
  • Bulimia nervosa: perturbação alimentar causada por ansiedade, definida por uma alimentação compulsiva episódica e recorrente, associada a um comportamento compensatório inapropriado (por exemplo, indução do vómito, abuso de laxantes, exercício excessivo). Os doentes com bulimia nervosa podem ter IMC normal ou elevado. Os doentes com bulimia nervosa são mais propensos a procurar ajuda. O tratamento envolve uma combinação de TCC e inibidores da recaptação da serotonina (SSRI).
  • Perturbação de Ingestão Alimentar Compulsiva: perturbação alimentar marcada por episódios recorrentes de compulsão sem comportamento compensatório inadequado o que resulta em flutuações no peso corporal. Os episódios ocorrem pelo menos semanalmente durante 3 meses. O tratamento consiste numa combinação de psicoterapia e medicamentos antidepressivos.
  • Perturbação de ruminação: regurgitação repetida de alimentos (que podem ser mastigados de novo, redeglutidos ou cuspidos) e que não se deve a nenhuma condição médica identificável (por exemplo, DRGE). O tratamento envolve múltiplas técnicas de TCC, incluindo psicoterapia de biofeedback e terapêutica médica quando apropriada (por exemplo, inibidores da bomba de protões).

Referências

  1. American Psychiatric Association. (2013). Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, 5th ed. (DSM-5). Arlington, VA: American Psychiatric Association.
  2. McNaughten B, Bourke T, Thompson A. (2017). Fifteen-minute consultation: the child with pica. Arch Dis Child Educ Pract Ed. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/28487433/
  3. Call NA, Simmons CA, Mevers JE, Alvarez JP. (2015). Clinical outcomes of behavioral treatments for pica in children with developmental disabilities. J Autism Dev Disord. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/25636679/

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