Lesões do Plexo Braquial

O plexo braquial é uma rede de nervos que se origina nas raízes nervosas cervicais inferiores e torácicas superiores. As causas das plexopatias braquiais incluem lesões traumáticas, lesões relacionadas com o parto, procedimentos iatrogénicos, processos neoplásicos e tratamento prévio com radiação. Os doentes apresentam défices sensitivos e motores relacionados com o local da lesão e os nervos envolvidos. O diagnóstico é feito com base em achados clínicos, exames de imagem e estudos eletrodiagnósticos. O tratamento está relacionado com a causa subjacente e pode ser médico ou cirúrgico.

Última atualização: Jan 15, 2024

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

Descrição Geral

Anatomia

O plexo braquial é uma rede de nervos de onde se originam todos os nervos motores e sensitivos da extremidade superior. É formado pelas raízes nervosas de C5 a T1 e divide-se em:

  • Troncos:
    • Tronco superior: formado pelas raízes C5 e C6
    • Tronco médio: formado pela raiz C7
    • Tronco inferior: formado pelas raízes C8 e T1
  • Divisões: cada tronco divide-se em divisão anterior e posterior.
  • Cordões, ramos e nervos:
    • O cordão lateral ramifica-se em:
      • Nervo musculocutâneo
      • Nervo mediano
    • O cordão posterior ramifica-se em:
      • Nervo axilar
      • Nervo subescapular
      • Nervo toracodorsal
      • Nervo radial
    • O cordão medial ramifica-se em:
      • Nervo mediano
      • Nervo cubital
      • Nervos cutâneos mediais do braço e antebraço
    • Nervo supraescapular: emerge da parte superior do tronco
    • Nervo escapular dorsal: emerge da raiz C5
    • Nervo torácico longo: emerge das raízes C5, C6 e C7

Epidemiologia

  • As síndromes do plexo braquial são raras:
    • Ocorrem em 0,4% dos doentes com cancro
    • Ocorrem em 2% a 5% dos doentes expostos a radiação
  • A incidência de plexopatia braquial idiopática ou amiotrofia braquial é de 2-3 por 100.000.
  • A taxa de incidência de lesões traumáticas é de 2:1, homens para mulheres.

Classificação

  • Com base na localização da lesão
  • Pré-ganglionar supraclavicular:
    • Associado à avulsão de raízes nervosas
    • Geralmente resulta em défices motores e sensitivos permanentes
    • A desnervação dos músculos do pescoço é comum.
  • Supraclavicular pós-ganglionar:
    • Muitas vezes devido a lesões de tração
    • As raízes nervosas permanecem intactas.
  • Infraclavicular: envolve ramos individuais do plexo

Patogénese

O plexo braquial pode ser lesado por vários mecanismos:

  • Tração nervosa:
    • Também conhecida como lesão por estiramento (como observada durante o parto)
    • Ocorre por tração ou tensão súbita e severa dos nervos
  • Compressão nervosa:
    • Incomum: o plexo braquial é protegido por estruturas ósseas.
    • Ocorre em desportos de contacto
  • Transecção aberta do nervo com grande trauma
  • Isquemia resultante da oclusão de pequenos vasos intraneurais devido a:
    • Inflamação
    • Radiação
    • Alterações metabólicas
  • Invasão direta de nervos por células neoplásicas
Mechanisms of brachial plexus injury

Mecanismos de lesão do plexo braquial:
Topo: Lesões por avulsão puxam as raízes da medula espinhal.
Centro: Lesões por esticamento adelgaçam o nervo.
Baixo: Ruturas levam à descontinuidade completa do nervo.

Imagem por Lecturio.

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Apresentação Clínica

O início dos sintomas clínicos pode variar de agudo a insidioso, com dor no ombro ou no braço descrita como “semelhante a um choque elétrico” ou a uma sensação de queimadura.

Plexopatias traumáticas

  • Trauma por lesões:
    • Abertas: ferimentos de faca ou arma de fogo, mordidas de animais
    • Fechadas: acidentes com motociclos / automóveis, quedas em altura, hematomas
    • As manifestações estão relacionadas com o (s) nervo (s) afetado (s) pela lesão.
  • Trauma por lesões desportivas: queimadura (também chamado de burner/ stinger, em inglês)
    • Causada pela tração inferior do ombro, envolvendo a parte superior do tronco do plexo braquial
    • Na maioria das vezes ao intercetar o adversário
    • Manifesta-se como dormência transitória, parestesias ou fraqueza no braço
    • Normalmente breve e autolimitado; ocasionalmente, a recuperação pode levar dias a semanas
  • Paralisia do mochileiro (também conhecida como paralisia da mochila ou paralisia do cadete):
    • Afeta a parte superior do tronco (C5-C6)
    • Apresenta-se após o uso de uma mochila ou similar
    • Geralmente indolor, deve-se ao estiramento ou compressão das fibras nervosas
    • Sintomas:
      • Fraqueza da abdução e elevação do ombro
      • Fraqueza na extensão do antebraço, punho e dedos
      • Alguma perda sensitiva na mesma distribuição
      • A maioria dos doentes recupera totalmente em alguns meses.
  • Paralisia obstétrica do plexo braquial:
    • Paralisia Erb:
      • Mais comum do que paralisia de Klumpke
      • Afeta as raízes nervosas C5 e C6
      • Deformidade: braço pendurado adjacente ao corpo, aduzido e em rotação medial
    • Paralisia de Klumpke:
      • Afeta as raízes nervosas C8 e T1
      • Deformidade “mão em garra”: hiperextensão nas articulações metacarpofalângicas e flexão nas articulações interfalângicas

Plexopatias não traumáticas

Amiotrofia neurálgica (atrofia progressiva dos tecidos musculares):

  • Alteração inflamatória do plexo braquial
  • Também conhecida como síndrome de Parsonage-Turner ou plexopatia braquial idiopática
  • Pode afetar crianças e adultos
  • Início súbito de dor no ombro/braço → fraqueza e atrofia progressivas

Plexopatia braquial hereditária:

  • Autossómica dominante
  • Caracterizada por plexopatias braquiais recorrentes e dolorosas
  • Características: baixa estatura, hipotelorismo, pregas cutâneas invulgares, pregas no pescoço
  • Rara

Plexopatia braquial neoplásica:

  • Apresenta-se com dor no ombro/axila
  • Tipos:
    • Primário: devido a tumores com origem neuronal (e.g., schwanomas, neurofibromas)
    • Secundário: devido à compressão nervosa por gânglios linfáticos regionais; mais frequentemente devido a cancro da mama e do pulmão
    • Paraneoplásico: devido a lesão desmielinizante por anticorpos contra a bainha de mielina, associada ao linfoma de Hodgkin
  • Envolvimento da raiz nervosa C8 ou T1:
    • Observado em tumores de Pancoast (geralmente carcinoma pulmonar de não pequenas células (NSCLC, pela sigla em inglês))
    • Neurónios simpáticos percorrem o plexo braquial até ao ápice pulmonar.
    • Sintomas clínicos: síndrome de Horner (ptose, miose e anidrose) devido a uma interrupção da inervação do olho pela cadeia simpática cervical

Plexopatia braquial induzida por radiação:

  • Pode não ter apresentação até meses ou anos após a radiação
  • Deve-se ao dano axonal direto, à desmielinização, ao enfarte microvascular e à fibrose
  • Risco ↑ se quimioterapia concomitante

Síndrome do desfiladeiro torácico (SDT):

  • Deve-se à compressão dos vasos sanguíneos e nervos à medida que passam entre a clavícula e a primeira costela
  • Causas:
    • Acidentes
    • Lesões ocupacionais por uso repetitivo
    • Variantes anatómicas
    • Hipertrofia do músculo escaleno ou peitoral menor em levantadores de peso e atletas
  • Os sintomas variam, mas podem incluir:
    • Fraqueza muscular
    • Dormência
    • Alterações isquémicas
    • Edema das extremidades superiores
    • Trombose venosa

Plexopatia braquial relacionada com a diabetes:

  • Não é tão comum quanto a plexopatia lombossacral
  • Podem ser mononeuropatias dos nervos cubital e mediano

Plexopatias iatrogénicas:

  • Parésia pós-operatória clássica:
    • Causada por tração ou pressão durante a cirurgia
    • Apresenta-se com fraqueza indolor e parestesias
    • A recuperação é rápida e completa.
  • Plexopatia pós-esternotomia mediana:
    • Ocorre após a cirurgia aberta ao coração
    • Causada por lesão no ramo anterior C8
    • Apresenta-se com fraqueza nas mãos, parestesias e dor no dermátomo C8
  • Plexopatia de bloqueio anestésico:
    • Ocorre após bloqueio infraclavicular regional do plexo braquial
    • Deve-se ao trauma da agulha de infusão, à formação de hematoma ou à neurotoxicidade do anestésico local
  • Síndrome do compartimento fascial braquial medial:
    • Ocorre após a punção da artéria axilar ou braquial durante procedimentos como arteriografia ou bloqueios anestésicos regionais axilares
    • O hematoma em expansão causa mais frequentemente compressão nervosa dos nervos mediano ou cubital

Diagnóstico

A lesão patológica primária na maioria das plexopatias é a perda axonal, seja devido a trauma, desmielinização ou compressão. O diagnóstico é baseado na apresentação clínica e exames complementares de diagnóstico.

História

  • Duração dos sintomas
  • Características da dor, alterações sensitivas, fraqueza e atrofia muscular
  • Infeção, atividade ou lesão associados ao início da apresentação
  • Alteração nos sintomas com a mudança na posição da cabeça, pescoço ou braço
  • Sintomas autonómicos
  • Mudança na funcionalidade do braço
  • História médica:
    • Malignidade, radiação, quimioterapia
    • Doenças desmielinizantes
    • Diabetes
    • Plexopatia braquial anterior
  • Detalhes da gravidez e parto em doentes neonatais (e.g., estiramento/tração)

Exame objetivo

  • Inspeção visual para pesquisa de alterações na pele:
    • Cicatrizes cirúrgicas ou feridas
    • Atrofia muscular
  • Palpação dos músculos do ombro e braço
  • Amplitude do movimento (ROM, pela sigla em inglês) da coluna cervical e extremidade superior
  • Exame de pupila para pesquisa de síndrome de Horner
  • Exame neurológico:
    • Força motora
    • Exame sensitivo
    • Reflexos osteotendinosos profundos (ROTs)
  • Doentes neonatais: o diagnóstico clínico é feito quando a fraqueza do braço ao nascimento se apresenta com uma distribuição consistente com uma lesão do plexo braquial.

Imagem e exames complementares de diagnóstico

  • Raio-X da coluna cervical para pesquisa de alterações ósseas
  • Radiografia de tórax se possibilidade de malignidade pulmonar
  • RNM para alterações estruturais (e.g., hérnia discal, tumor)
  • A ultrassonografia pode distinguir lesões traumáticas pré-ganglionares de pós-ganglionares de forma não invasiva.
  • Eletromiografia (EMG)/ estudos de condução nervosa:
    • Avalia danos axonais em nervos motores
    • Fornece informações sobre outros diagnósticos (e.g., síndromes de compressão nervosa)
    • Os estudos de condução nervosa sensitiva são mais sensíveis à perda axonal do que os estudos dos nervos motores.

Tratamento

Lesões traumáticas agudas podem levar a plexopatias que são autolimitadas, durando poucos meses. Os tratamentos específicos para plexopatias não traumáticas incluem fisioterapia e fármacos.

Plexopatias traumáticas

  • Algumas situações podem exigir intervenção cirúrgica de emergência.
  • Cirurgia não emergente: indicada se sem melhora após 3-4 meses
  • Tipos de procedimentos:
    • Neurólise
    • Enxertos de nervo
    • Transferência de nervos
    • Transferências de tendões e músculos
  • Prognóstico: melhoria da função observada em aproximadamente 60% dos doentes após a intervenção cirúrgica

Plexopatias não traumáticas

Amiotrofia neurálgica:

  • Tratamento conservador:
    • Fisioterapia
    • Glucocorticoides
    • Analgésicos
  • Prognóstico:
    • A recuperação é lenta ao longo de 1–3 anos.
    • Alguns doentes podem ficar com deficiência persistente.

Plexopatia braquial hereditária:

  • Glicocorticoides
  • Analgésicos
  • Fisioterapia

Plexopatia neoplásica:

  • Radioterapia (RT) para controlo da dor
  • Analgésicos

Plexopatia induzida por radiação:

  • Gabapentinóides (inibem a neurotransmissão)
  • Glicocorticoides
  • Antidepressivos tricíclicos (TCAs, pela sigla em inglês)

Síndrome do desfiladeiro torácico (TOS, pela sigla em inglês):

  • Medidas conservadoras:
    • Perda de peso
    • Analgésicos
    • Programa de fortalecimento muscular
  • Cirurgia:
    • TOS neurogénico verdadeiro → libertação cirúrgica da banda fibrosa ou resseção da costela cervical rudimentar
    • TOS vascular → cirurgia descompressiva

Plexopatias iatrogénicas:

  • Tratamento conservador
  • Descompressão cirúrgica

Paralisia do plexo braquial neonatal:

  • Fisioterapia para promover o fortalecimento muscular
  • As indicações cirúrgicas incluem:
    • Pan-plexopatia e lesão pré-ganglionar da raiz do nervo
    • Rutura nervosa completa e avulsões das raízes nervosas
    • Recuperação funcional incompleta
  • Injeção de toxina botulínica: pode ser útil para contraturas/desequilíbrios musculares
  • Apoio psicossocial se deficiência contínua na infância
  • Prognóstico:
    • A recuperação espontânea ocorre ao longo de 1–3 meses, na maioria dos casos.
    • Prognóstico mais favorável se houver melhora clínica precoce em algumas semanas
    • Bom prognóstico com força normal ou quase normal na flexão do cotovelo, rotação externa do ombro e supinação do antebraço aos 3 meses de idade

Diagnóstico Diferencial

  • Radiculopatia cervical: refere-se à dor e sintomas neurológicos nas extremidades superiores por lesão ou inflamação das raízes nervosas da coluna cervical. As causas da radiculopatia cervical incluem herniação de disco cervical, infeção, infiltração tumoral e desmielinização. As características clínicas variam dependendo da localização e do grau de envolvimento da raiz nervosa cervical. O diagnóstico é feito com base no exame clínico, na ressonância magnética e nos estudos eletrodiagnósticos. O tratamento pode ser conservador com fisioterapia e controlo da dor ou com descompressão cirúrgica se sem melhora.
  • Síndrome de Guillain-Barré (SGB): refere-se a uma família de polineuropatias imunomediadas que ocorrem após infeções (e.g., Campylobacter jejuni ). A SGB típica é caracterizada por paralisia neuromuscular monofásica aguda, que é simétrica e ascendente e pode progredir para insuficiência respiratória, requerendo hospitalização prolongada. O tratamento é principalmente de suporte e pode exigir plasmaférese ou imunoglobulina IV (IVIG).
  • Esclerose múltipla (EM): doença inflamatória crónica autoimune que leva à desmielinização do SNC. A etiologia é incerta, mas os fatores genéticos e ambientais desempenham provavelmente algum papel. O diagnóstico é feito por ressonância magnética e também por exame de LCR. O tratamento envolve corticosteroides nas exacerbações agudas e agentes modificadores de prognóstico para reduzir as exacerbações e retardar a progressão da doença.
  • Lesão da medula espinhal: associada a síndromes completas ou incompletas por fratura vertebral, hérnia de disco ou, em alguns casos, oclusão/isquemia arterial. O sinal cardinal é um nível de lesão discreto, acima do qual a função neurológica está intacta e abaixo do qual está ausente ou acentuadamente diminuída. O diagnóstico é feito com base no exame clínico e na ressonância magnética. A abordagem depende da causa da síndrome medular espinhal e envolve tratamento sintomático de longo prazo e reabilitação.

Referências

  1. Bromberg, MB. (2021). Brachial plexus syndromes. UpToDate. Retrieved August 17, 2021, from https://www.uptodate.com/contents/brachial-plexus-syndromes
  2. Rubin, M. (2020). Brachial plexus and lumbosacral plexus disorders. MSD Manual Professional Version. Retrieved August 17, 2021, from https://www.msdmanuals.com/professional/neurologic-disorders/peripheral-nervous-system-and-motor-unit-disorders/brachial-plexus-and-lumbosacral-plexus-disorders
  3. Selcen, D. (2021). Neonatal brachial plexus palsy. UpToDate. Retrieved August 21, 2021, from https://www.uptodate.com/contents/neonatal-brachial-plexus-palsy
  4. Kuhlman, G. (2021). Burners (Stingers): Acute brachial plexus injury in the athlete. UpToDate. Retrieved August 21, 2021, from https://www.uptodate.com/contents/burners-stingers-acute-brachial-plexus-injury-in-the-athlete
  5. Dorhout Mees, SM, Van Faals, NL, & Van Alfen, N. (2020). Backpack palsy and other brachial plexus neuropathies in the military population. J Peripher Nerv Syst. 25, 27–31. https://doi.org/10.1111/jns.12363
  6. Upadhyaya, V, & Upadhyaya, DN. (2019). Current status of magnetic resonance neurography in evaluating patients with brachial plexopathy. Neurology India. 67(Supplement), S118–S124. https://doi.org/10.4103/0028-3886.250730
  7. Warade, AC, Jha, AK, Pattankar, S, & Desai, K. (2019). Radiation-induced brachial plexus neuropathy: A review. Neurology India. 67(Supplement), S47–S52. https://doi.org/10.4103/0028-3886.250704

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