Doenças do Humor Vítreo

O humor vítreo é uma substância transparente e gelatinosa que está presente no espaço entre o cristalino e a retina, proporcionando estabilidade estrutural e mantendo a forma do olho. Algumas patologias podem afetar o humor vítreo, nomeadamente o descolamento posterior do vítreo, hemovítreo, sínquise cintilante, hialose asteróide ou persistência da vasculatura fetal. Estas patologias podem ser assintomáticas ou apresentar-se com moscas volantes no campo visual, fotópsias e diminuição da acuidade visual. A fundoscopia e o exame na lâmpada de fenda são frequentemente utilizados no diagnóstico destas doenças. As formas de tratamento dependem da patologia e da gravidade do quadro, e vão desde manter uma atitude expectante até métodos de correção da visão e cirurgia.

Última atualização: May 11, 2022

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

Descrição Geral

O humor vítreo é a substância presente entre o cristalino e a retina.

  • Material tipo gel que fornece:
    • Um meio óptico transparente
    • Integridade estrutural ao olho
  • Consiste, em grande parte, em:
    • Água (99%)
    • Rede de fibrilas de colagénio
    • Ácido hialurónico
    • Células periféricas (hialócitos)
Anatomia do olho

Diagrama da anatomia do olho.

Image by Lecturio.

Descolamento Posterior do Vítreo

Definição

O descolamento posterior do vítreo consiste na separação do humor vítreo da membrana limitante interna da retina.

Epidemiologia

  • Mais comum em idosos:
    • Geralmente surge por volta dos 60-70 anos de idade
    • A maioria dos olhos estão afetados por volta dos 80 anos de idade.
  • Homens e mulheres igualmente afetados

Etiologia

  • Degeneração vítrea relacionada com a idade (causa mais comum):
    • Com a idade, o humor vítreo sofre liquefação (passa de um gel espesso para uma substância líquida fina).
    • O vítreo começa a encolher → isto pode levar ao seu descolamento da retina
  • Trauma ocular
  • Cirurgia ocular (catarata)
  • Doença inflamatória ocular (uveíte)
  • Altos míopes apresentam maior risco devido ao alongamento do globo ocular.

Apresentação clínica

  • A maioria dos casos é assintomática.
  • Miodesópsias (moscas volantes):
    • Coleções de depósitos no humor vítreo
    • As moscas volantes são mais visíveis contra um fundo claro e aparecem em diferentes formas e tamanhos.
  • Fotópsias:
    • Flashes de luz que são repentinos e breves
    • Geralmente unilateral e ocorrem em áreas escuras
    • Induzidas pelo movimento da cabeça ou dos olhos
    • Causadas por tração vitreorretiniana
  • Visão turva

Diagnóstico

  • Biomicroscopia na lâmpada de fenda: Anel de Weiss é uma membrana característica e móvel dentro da cavidade vítrea, com aspeto brilhante e enrugado.
  • Ecografia Modo-B:
    • Utilizada para avaliar as alterações do humor vítreo
    • Também ajuda a determinar a extensão do descolamento do vítreo posterior
Ultrassonografia b-scan mostrando extensão do descolamento do vítreo.

Ecografia Modo-B a revelar um descolamento anterior do vítreo na imagem c.
Descolamento posterior do vítreo na imagem d.

Image: “B-scan ultrasonography showing extent of vitreous detachment” by Ophthalmology Unit, DAI Head/Neck, Azienda Policlinico Umberto I, University of Rome “Sapienza”, viale del Policlinico 155, Rome, 00161, Italy. License: CC BY 4.0., edited by Lecturio.

Tratamento

  • Não é necessário nenhum tratamento em doentes sem lesão retiniana.
  • Ao longo do tempo há uma adaptação aos sintomas visuais e as moscas volantes podem desaparecer.
  • Pode-se considerar a realização de vitrectomia nos casos de sintomas persistentes.

Complicações

  • Descolamento de retina
  • Rasgadura de retina
  • Hemorragia vítrea

Vídeos recomendados

Hemorragia Vítrea

Definição

A hemorragia vítrea (ou hemovítreo) corresponde ao extravasamento de sangue para o humor vítreo.

Etiologia

Existem muitas causas para hemovítreo. Algumas causas comuns incluem:

  • Retinopatia diabética proliferativa
  • Descolamento posterior do vítreo
  • Trauma ocular
  • Rasgadura espontânea da retina
  • Degenerescência macular
  • Retinopatia de células falciformes

Apresentação clínica

A hemorragia vítrea é geralmente indolor e unilateral. Os sinais e sintomas incluem:

  • Visão turva
  • Moscas volantes
  • Fotópsias
  • Fotofobia
  • Perceção de sombras ou teias de aranha
  • A acuidade visual pode estar afetada, dependendo da quantidade de sangue presente.

Diagnóstico

  • O exame fundoscópico pode permitir a visualização da hemorragia.
  • Biomicroscopia na lâmpada de fenda: pode observar-se sangue entre a base posterior do vítreo e a membrana limitante interna.
  • A ecografia ocular pode ser utilizada nos casos em que o segmento posterior não é visível devido à presença de hemorragia excessiva.
  • A TC/RM pode ser necessária para avaliar estruturas ósseas e descartar corpos estranhos.
Fotografias de fundo de hemorragia vítrea

Fotografia de fundo do olho direito com hemorragia vítrea.

Image: “Fundus photographs of right eye showing peripapillary, subhyaloid, vitreous hemorrhage and several flame shaped hemorrhages obscuring the view of the optic disc” by Smt Kanuri Shanthamma Center for Retina Vitreous Diseases, L V Prasad Eye Institute, Kallam Anji Reddy Campus, Banjara Hills, Hyderabad 500 034, India. License: CC BY 2.0, edited by Lecturio.

Tratamento

  • A hemorragia vítrea pode resolver espontaneamente.
  • O tratamento é dirigido à causa subjacente.
  • A vitrectomia é realizada em casos de doença grave e casos de descolamento de retina.
  • A fotocoagulação laser está indicada em retinopatias proliferativas ou rasgaduras de retina.

Sínquise Cintilante

Definição

A sínquise cintilante, também conhecida como colesterolosis bulbi, é uma patologia degenerativa definida pela acumulação de cristais de colesterol no humor vítreo liquefeito.

Epidemiologia

  • Patologia muito rara
  • Geralmente ocorre na 3ª década de vida
  • Sem predominância de sexo ou raça

Fatores de risco

  • Hemorragia vítrea crónica ou recorrente (mais comum)
  • Retinopatia diabética
  • Uveíte crónica
  • Descolamento de retina
  • Trauma ocular

Apresentação clínica

  • Geralmente assintomática
  • Podem existir moscas volantes

Diagnóstico

  • Lâmpada de fenda:
    • Pode ser possível visualizar partículas em suspensão na câmara posterior bilateralmente
      • Altamente refrativas
      • Planas
      • Cor dourada/branca
    • Os cristais flutuam livremente (efeito “bola de neve”)
  • Biópsia vítrea: pode ser realizada como teste confirmatório para identificar os cristais de colesterol.

Tratamento

  • Em geral, não é necessário qualquer tratamento.
  • Está indicado proceder ao tratamento das doenças subjacentes.

Hialose Asteróide

Definição

A hialose asteróide é uma patologia na qual complexos de cálcio-lípido (sabão de cálcio) estão ligados à estrutura de colágeno do humor vítreo.

Epidemiologia

  • Observada em aproximadamente 1 em 200 indivíduos
  • Mais frequentemente observado após os 50 anos de idade
  • Mais comum em homens

Etiologia

A etiologia da doença é desconhecida.

  • Fortemente correlacionada com a idade
  • Não está claramente associada a outras doenças

Apresentação clínica

A hialose asteróide é geralmente assintomática.

Diagnóstico

O diagnóstico é feito através do exame na lâmpada de fenda, que demonstre:

  • Envolvimento unilateral
  • Várias opacidades amarelas/brancas, redondas
  • As partículas em suspensão (“estrelas no céu noturno”) → podem mover-se, mas geralmente retornam à sua posição original
Hialose de asteroides

Múltiplas opacidades brilhantes suspensas no vítreo, consistentes com hialose asteróide.

Image: “Asteroid hyalosis: multiple yellow mobile vitreous particles” by University of Mohamed V souissi, hôpital des Spécialités, Ophtalology A Department. License: CC BY 2.0, edited by Lecturio.

Tratamento

  • Raramente é necessário qualquer tratamento.
  • A vitrectomia pode estar indicada em casos de perda severa da acuidade visual.

Persistência da Vasculatura Fetal

Definição

A persistência da vasculatura fetal, anteriormente conhecida como vítreo primário hiperplásico persistente, é uma patologia na qual os vasos sanguíneos embrionários não regridem.

Etiologia

  • Falência do vítreo primário embrionário e do sistema vascular hialóide em regredir
  • A maioria dos casos não é genética

Apresentação clínica

Esta patologia é geralmente unilateral e pode apresentar-se com:

  • Leucocoria: reflexo pupilar branco (também associado ao retinoblastoma)
  • Diminuição da acuidade visual
  • Microftalmia do olho afetado (olho anormalmente pequeno devido à falência no seu desenvolvimento)
  • Estrabismo

Diagnóstico

A persistência da vasculatura fetal geralmente é diagnosticada logo após o nascimento.

  • Fundoscopia e exame com lâmpada de fenda:
    • Processo ciliar alongado e rodado
    • Haste fibrosa acima do nervo óptico
  • A ecografia pode revelar um pedúnculo fibrovascular entre o cristalino e o nervo óptico.
  • A TC pode mostrar:
    • Câmara anterior baixa
    • Aumento da densidade da cavidade vítrea
    • Hipersinal do tecido intravítreo
    • Cristalino irregular
Vasculatura fetal persistente (pfv)

Persistência da vasculatura fetal:
Ao exame com lâmpada de fenda, identifica-se tração dos processos ciliares para o centro da cápsula posterior do cristalino no olho esquerdo e massa retrolenticular.

Image: “ersistent fetal vasculature (PFV)” by Department of Ophthalmology, Hippokration General Hospital, 54642 Thessaloniki, Greece. License: CC BY 3.0, edited by Lecturio.

Tratamento

  • O tratamento é sintomático
  • Pode ser necessária correção da visão.
  • A cirurgia pode estar recomendada para prevenir ou tratar complicações.

Complicações

  • Glaucoma
  • Catarata
  • Hemorragia intraocular
  • Descolamento de retina

Referências

  1. Ahmed F., Tripathy K. (2021). Posterior vitreous detachment. StatPearls. Retrieved October 10, 2021, from https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK563273/
  2. Ang A., Poulsen A. V., Snead D. R. J., Snead M. P. (2005). Posterior vitreous detachment. MedScape. Retrieved October 10, 2021, from https://www.medscape.com/viewarticle/513226_5
  3. Jena S, Tripathy K. (2021). Vitreous hemorrhage. StatPearls. Retrieved October 10, 2021, from https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK559131/
  4. Johnson, B. B. (2021). Vitreous hemorrhage. EyeWiki. Retrieved October 10, 2021, from https://eyewiki.aao.org/Vitreous_Hemorrhage
  5. Kuriakose A. (2021). Synchysis Scintillans. American Academy of Ophthalmology. Retrieved October 10, 2021, from https://eyewiki.aao.org/Synchysis_Scintillans
  6. Man V. (2021). Asteroid hyalosis. American Academy of Ophthalmology. Retrieved October 10, 2021, from https://eyewiki.aao.org/Asteroid_Hyalosis_(AH)
  7. Phillpotts B. A. (2018). Vitreous hemorrhage. Medscape. Retrieved October 10, 2021, from https://emedicine.medscape.com/article/1230216
  8. Ramasubramanian, A., Duff-Lynes, S. M. (2021, September 5). Persistent hyperplastic primary vitreous. EyeWiki. https://eyewiki.aao.org/Persistent_Hyperplastic_Primary_Vitreous
  9. Goncalves, M.B. (2020). Asteroid hyalosis and synchysis scintillans. In: Rodrigues, E., Meyer, C., and Tomazoni, E. (Eds.), Trauma and Miscellaneous Disorders in Retina. Retina Atlas. Springer, Singapore, pp. 67–71. https://www.researchgate.net/publication/336072427_Asteroid_Hyalosis_and_Synchysis_Scintillans
  10. Ramkissoon, P. (2018). Asteroid hyalosis versus synchisis scintillans. Vision Magazine Online. http://visionmagazineonline.co.za/2018/04/01/asteroid-hyalosis-versus-synchysis-scintillans/
  11. Columbia University Department of Ophthalmology (n.d.), Asteroid hyalosis. Retrieved October 10, 2021, from https://www.columbiaeye.org/education/digital-reference-of-ophthalmology/vitreous-retina/tumor-others/asteroid-hyalosis.
  12. Sihota R, Tandon R. (2014). Parson’s Diseases of the Eye, 22nd ed., pp. 341–348.
  13. Vitreous degeneration. (n.d.). Retrieved October 11, 2021, from http://www.med.umich.edu/1libr/Ophthalmology/comprehensive/VitreousDegeneration.pdf
  14. Mai, A., et al. (2018). Persistent fetal vasculature. University of Iowa Health Care. Retrieved October 10, 2021, from  https://webeye.ophth.uiowa.edu/eyeforum/cases/270-persistent-fetal-vasculature.htm

Aprende mais com a Lecturio:

Complementa o teu estudo da faculdade com o companheiro de estudo tudo-em-um da Lecturio, através de métodos de ensino baseados em evidência.

Estuda onde quiseres

A Lecturio Medical complementa o teu estudo através de métodos de ensino baseados em evidência, vídeos de palestras, perguntas e muito mais – tudo combinado num só lugar e fácil de usar.

User Reviews

Details