Compartimentos dos Fluidos Corporais

O corpo humano adulto é composto em 60% por água e está dividido em compartimento líquido extracelular e intracelular. O fluido extracelular está presente fora das células e compõe ⅓ da água corporal total. O fluido intracelular está presente dentro das células e compõe ⅔ da água corporal total. Os fluidos intracelulares e extracelulares são separados em compartimentos por membranas semipermeáveis, e o transporte de fluidos e íões é mantido por canais na membrana celular. Cada compartimento contém diferentes concentrações de íões e moléculas osmolares. A carga relativa e a osmolaridade são rigorosamente mantidas pelo transporte de água e substâncias entre os compartimentos. A hipernatrémia, a hiponatrémia e o edema são condições clínicas decorrentes de distúrbios na manutenção da osmolaridade dos compartimentos líquidos corporais.

Última atualização: Oct 18, 2022

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

Descrição Geral

A água no corpo humano adulto representa aproximadamente 60% do peso corporal total. Os fluidos estão distribuídos por vários órgãos, sistemas de órgãos e tecidos. A soma da água nesses tecidos é conhecida como água corporal total.

  • A percentagem de água no corpo muda com o desenvolvimento do mesmo:
    • Até 70% da massa corporal em bebés
    • 50%–60% em adultos normais
    • Pode chegar aos 45% em adultos mais velhos
  • O peso da água corporal total é responsável por:
    • 60% do peso magro em homens
    • 50% do peso magro em mulheres

Compartimentos dos Fluidos Corporais

Descrição Geral

A água corporal total está distribuída principalmente entre 2 compartimentos, a saber, os compartimentos do líquido extracelular (LEC) e do líquido intracelular (LIC).

  • O LEC está presente fora das células:
    • Compõe cerca de ⅓ da água corporal total
    • O LEC inclui:
      • Líquido intravascular (¼ de LEC): componente primário do plasma
      • Líquido intersticial (¾ do LEC): encontra-se fora dos vasos sanguíneos
  • O LIC está presente no interior das células:
    • Compõe cerca de ⅔ da água corporal total
    • Componente principal do citoplasma das células

Movimento dos fluidos entre compartimentos

  • Os fluidos estão separados, em compartimentos, por membranas semipermeáveis. As membranas são altamente permeáveis à água, mas requerem energia para transportar iões.
  • A distribuição dos fluidos entre os compartimentos intracelular e extracelular é determinada pela concentração de Na+, cloreto (Cl) e de outros eletrólitos.
  • A água move-se, entre os compartimentos, segundo gradientes osmóticos.
  • Uma alteração na concentração relativa de solutos ou de água fará com que a água se desloque entre os compartimentos.
  • Existem 2 processos responsáveis pelo movimento passivo dos fluidos através das membranas:
    • Difusão: Uma substância passa de uma área de maior concentração para uma área de menor concentração.
    • Osmose: A água é puxada, através de uma membrana, em direção a uma região onde há uma maior concentração de solutos.

Medição dos compartimentos de fluidos corporais

Os volumes dos compartimentos podem ser medidos, determinando o volume de distribuição de uma substância indicadora. Adiciona-se uma quantidade conhecida de um indicador a um compartimento e a concentração do indicador nesse compartimento é medida, após passar tempo suficiente para permitir a distribuição uniforme por todo o compartimento. O volume do compartimento é calculado da seguinte forma:

Volume = quantidade do indicador / concentração do indicador

Tabela: Compartimentos de fluidos corporais e indicadores associados
Volume Indicadores
Água corporal total 3H2O, 2H2O, antipirina
Fluido extracelular 22Na, 125I-iotalamato, tiossulfato, inulina
Fluido intracelular Calculado como: (água corporal total – volume de líquido extracelular)
Volume de plasma 125I-albumina, corante azul de Evans (T-1824)
Volume de sangue Hemácias marcadas com 51Cr, ou calculadas como: (volume de sangue = volume de plasma / (1 − hematócrito))
Fluido intersticial Calculado como: (volume de fluido extracelular – volume de plasma)
Movement of body fluids between compartments

Ilustração a representar o movimento dos fluidos corporais entre compartimentos

Image by Lecturio.

Alterações nos Compartimentos de Fluidos

Expansão de volume hipo-osmótica

  • Resulta num aumento na água corporal total e na redução da osmolalidade
  • Pode ser encontrada em casos de:
    • Ingestão excessiva de água
    • SIADH
  • Alterações nos constituintes do LEC:
    • Diminuição dos níveis de Na+
    • Diminuição dos níveis de proteína total
    • O hematócrito permanece o mesmo.
  • Resposta endócrina:
    • Diminuição dos níveis de aldosterona (suprimida pela hipervolemia)
    • Diminuição dos níveis de hormona antidiurética (e.g., diabetes insipidus)
Hypo-osmotic volume expansion caused by siadh
A SIADH causa expansão do volume hipo-osmótica: O corpo retém água a mais e produz hormona antidiurética de forma excessiva.
ICF, pela sigla em inglês: fluido intracelular
ECF, pela sigla em inglês: fluido extracelular

Imagem por Lecturio.

Contração de volume hipo-osmótica

  • Diminuição da água corporal total juntamente com uma diminuição da osmolalidade total dos solutos
  • Geralmente encontrada em casos de insuficiência adrenal
  • Alterações no LEC resultam em:
    • Redução da pressão arterial devido à diminuição do volume
    • Diminuição dos níveis de Na+
    • Aumento dos níveis de proteína total
    • Aumento do hematócrito
  • Resposta endócrina:
    • Aumento da aldosterona (estimulada pela hipovolemia e hipocalemia)
    • Sem alteração nos níveis de hormona antidiurética
Hypo-osmotic volume contraction seen in adrenal insufficiency

Contração de volume hipo-osmótica observada na insuficiência adrenal: A diminuição da aldosterona leva a uma diminuição na absorção tubular de sódio, resultando em contração de volume hipo-osmótica.

ICF, pela sigla em inglês: fluido intracelular
ECF, pela sigla em inglês: fluido extracelular

Imagem por Lecturio.

Expansão de volume iso-osmótica

  • Expansão de volume onde não há alteração na osmolalidade
  • Encontrada na expansão de volume com soluções IV
  • Alterações no LEC resultam em:
    • Aumento da pressão arterial
    • Ausência de alterações nos níveis de Na+
    • Diminuição dos níveis de proteína total
    • Diminuição do hematócrito
  • Resposta endócrina à expansão de volume iso-osmolar:
    • Diminuição da aldosterona (suprimida pela expansão do volume)
    • Sem alterações nos níveis de hormona antidiurética
Infusion of isotonic nacl results in iso-osmotic volume expansion

A infusão de NaCl isotónico resulta em expansão de volume iso-osmótica: São observadas alterações no LEC (ou seja, aumento de volume), mas a osmolaridade permanece a mesma.

ICF, pela sigla em inglês: fluido intracelular
ECF, pela sigla em inglês: fluido extracelular

Imagem por Lecturio.

Contração de volume iso-osmótica

  • Contração de volume que ocorre sem quaisquer alterações na osmolalidade
  • Observada em casos de perda de fluido iso-osmótico (e.g., diarreia e vómitos)
  • Alterações no LEC que resultam em:
    • Diminuição da pressão arterial
    • Ausência de alterações nos níveis de Na+
    • Aumento dos níveis de proteína total
    • Aumento do hematócrito
  • Resposta endócrina:
    • Aumento nos níveis de aldosterona (estimulado pela contração de volume)
    • Sem alteração nos níveis de hormona antidiurética
Iso-osmotic volume contraction caused by diarrhea

A contração de volume iso-osmótica é observada na diarreia: O fluido na diarreia tem a mesma osmolaridade que o fluido extracelular. O volume do LEC diminui, mas a osmolaridade não.

ICF, pela sigla em inglês: fluido intracelular
ECF, pela sigla em inglês: fluido extracelular

Imagem por Lecturio.

Expansão de volume hiperosmótica

  • Aumento da osmolalidade associada a um aumento do volume
  • Encontrada em casos de:
    • Hipersecreção de aldosterona
    • Ingestão de alimentos salgados
    • Indivíduos com tumores
  • Alterações no LEC resultam em:
    • Aumento da pressão arterial
    • Aumento nos níveis de Na+
    • Redução nos níveis de proteína total
    • Redução do hematócrito
  • Resposta endócrina:
    • Redução dos níveis de aldosterona
    • Aumento dos níveis de hormona antidiurética
Hyper-osmotic volume expansion seen in increased intake of nacl

A expansão hiperosmótica do volume é observada no aumento da ingestão de NaCl: Um aumento nos níveis de sódio causa retenção de líquidos.

ICF, pela sigla em inglês: fluido intracelular
ECF, pela sigla em inglês: fluido extracelular

Imagem por Lecturio.

Contração de volume hiperosmótica

  • Redução da água corporal total, mas aumento da osmolalidade:
    • Encontrada em casos de desidratação
    • O suor contém mais água do que solutos; assim, a sudorese excessiva resulta em contração de volume hiperosmótica.
  • Alterações no LEC resultam em:
    • Diminuição da pressão arterial
    • Aumento nos níveis de Na+
    • Aumento dos níveis de proteína total
    • Sem alterações no hematócrito
  • Resposta endócrina:
    • Aumento dos níveis de aldosterona
    • Aumento dos níveis de hormona antidiurética
Hyper-osmotic volume contraction observed in dehydration

A contração de volume hiperosmótica, observada na desidratação, causa hipotensão: A hipotensão pode atingir um nível perigosamente baixo, privando os órgãos de oxigénio.

ICF, pela sigla em inglês: fluido intracelular
ECF, pela sigla em inglês: fluido extracelular

Imagem por Lecturio.

Composição dos Fluidos Corporais

  • Os compartimentos dos fluidos corporais contêm água, iões e moléculas osmolares em diferentes concentrações.
  • A concentração relativa dos componentes depende das trocas entre células e tecidos do corpo, sendo determinada pela atividade de transportadores nas membranas celulares.
  • A composição de cada compartimento de fluido é rigorosamente mantida pelo movimento contínuo de água e outras substâncias entre os compartimentos.
Tabela: Níveis normais de íons e moléculas osmolares no plasma, fluido intersticial e fluido intracelular
Plasma Fluido intersticial Fluido intracelular
(mOsm/L) (mOsm/L) (mOsm/L)
Na+ 142 139 14
K+ 4.2 4.0 140
Ca2+ 1.3 1.2 0
Mg2+ 0.8 0.7 20
Cloreto (Cl) 106 108 4
HCO3 24 28.3 10
HPO42– , H 2 PO 4 2 2 11
SO42– 0.5 0.5 1
Fosfocreatina 45
Carnosina 14
Aminoácidos 2 2 8
Creatinina 0.2 0.2 9
Lactato 1.2 1.2 1.5
ATP 5
Monofosfato de hexose 3.7
Glicose 5.6 5.6
Proteínas 1.2 0.2 4
Ureia 4 1 4
Outros 4.8 3.9 10
Total mOsm/L 299.8 300.8 301.2
Atividade osmolar corrigida 282.0 281.0 281.0

Relevância Clínica

  • Hiponatremia: diminuição dos níveis de Na+ no organismo. A hiponatremia ocorre com mais frequência no contexto de diarreia e vómitos graves, uso excessivo de diuréticos e doença de Addison. Pode, também, ocorrer menos frequentemente como resultado da SIADH e progredir para edema celular, com risco de causar danos cerebrais. O edema celular apresenta-se com sintomas neurológicos tais como cefaleia, náuseas e letargia. O tratamento envolve a reposição gradual de Na+, pois uma reposição rápida pode levar à síndrome de desmielinização osmótica.
  • Hipernatremia: aumento dos níveis de Na+ no organismo. A hipernatremia ocorre mais frequentemente como resultado da desidratação grave. Os indivíduos afetados geralmente são assintomáticos, pois os sintomas geralmente ocorrem quando os níveis de Na+ se aproximam dos 160 mmol/L. A hipernatremia pode ser corrigida com a administração de NaCl hipo-osmótico ou de solução de dextrose.
  • Edema: presença de excesso de líquidos nos tecidos corporais. Ambos os compartimentos, LEC e LIC, podem estar envolvidos. O edema é muitas vezes clinicamente aparente nas extremidades inferiores e ocorre quando o gradiente osmótico entre o espaço intravascular e o espaço intersticial promove o fluxo de água da vasculatura para os tecidos. O edema pode ser tratado através da diurese ou da adição de moléculas osmolares (e.g., albumina) ao espaço vascular.

Referências

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