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Bronquiolite Obliterante

A bronquiolite obliterante é uma doença pulmonar obstrutiva desencadeada por uma lesão bronquiolar, que leva à fibrose inflamatória e estenose dos bronquíolos distais. A lesão bronquiolar desencadeante deve-se muitas vezes à inalação de uma substância nociva, infeção ou toxicidade farmacológica. A bronquiolite obliterante está também associada à doença reumática, sendo uma complicação que importa  reconhecer após um transplante pulmonar ou de células estaminais hematopoiéticas. Na sequência da lesão bronquiolar, há uma fibroproliferação anormal nos bronquíolos, que resulta na obstrução das pequenas vias aéreas. Os doentes apresentam tosse progressiva persistente e dispneia. O diagnóstico é geralmente baseado em testes de função pulmonar (que mostram um padrão obstrutivo irreversível, aprisionamento do ar e trocas gasosas diminuídas) e na TC de alta resolução (que mostra aprisionamento aéreo e espessamento da parede brônquica). O tratamento envolve cuidados de suporte, broncodilatadores, glucocorticoides e/ou antibióticos macrólidos. A terapêutica imunossupressora é geralmente aumentada nos doentes submetidos a transplante, sendo que se a doença agravar, pode ser necessário o retransplante.

Última atualização: May 31, 2022

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

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Definição e Epidemiologia

Definições

  • Bronquiolite obliterante:
    • Doença pulmonar obstrutiva desencadeada por uma lesão bronquiolar, que leva a fibrose inflamatória e a estenose dos bronquíolos distais
    • Resulta em dispneia e ↓ fluxo aéreo que não é reversível com broncodilatadores
    • Síndrome da bronquiolite obliterante (SBO) :
      • Quando a doença ocorre após um transplante de pulmão ou de células estaminais hematopoiéticas
      • Considerada uma forma de rejeição do aloenxerto
  • Doenças que representam entidades distintas da bronquiolite obliterante:
    • Bronquiolite aguda:
      • Processo inflamatório intenso nos pequenos bronquíolos
      • Comum nas crianças pequenas, rara em adultos
      • Causada geralmente pelo vírus sincicial respiratório (VSR)
    • Pneumonia organizativa criptogénica:
      • Anteriormente conhecida como bronquiolite obliterante com pneumonia organizativa.
      • Doença pulmonar intersticial difusa que afeta os bronquíolos e os alvéolos

Epidemiologia

  • Rara em indivíduos não submetidos a transplante
  • > 50% dos doentes submetidos a transplante pulmonar desenvolvem SBO em 5 anos

Etiologia

A lesão das pequenas vias aéreas que desencadeia a bronquiolite obliterante pode resultar de inalação, infeções, exposição a fármacos, inflamação pulmonar reumatológica ou rejeição crónica de transplante.

  • Lesão por inalação:
    • Fumos e gases tóxicos:
      • Óxidos de azoto
      • Amónia
      • Cloro
      • Vapores de soldagem
      • Gás mostarda de enxofre
    • Cigarros eletrónicos
    • Aerossóis de nicotina
    • Compostos orgânicos voláteis
    • Metais pesados e poeiras minerais
    • Aroma das pipocas (diacetil)
  • Infeções:
    • VSR
    • Adenovírus
    • Mycoplasma pneumoniae
    • VIH
  • Exposição a fármacos:
    • Bussulfano
    • Ouro
    • Penicilamina
  • Doenças reumáticas → inflamação pulmonar:
    • Artrite reumatoide
    • Lúpus eritematoso sistémico
  • Transplante → doença do enxerto contra o hospedeiro:
    • Transplante de pulmão
    • Transplante de células estaminais hematopoéticas

Fisiopatologia e Apresentação Clínica

Patogénese

A lesão dos bronquíolos distais resulta em inflamação. Uma resposta imune desregulada leva à fibroproliferação e estreitamento dessas pequenas vias aéreas e à diminuição do fluxo de ar.

  • Mecanismo:
    • Lesão do epitélio bronquiolar (bronquíolos terminais e respiratórios) → inflamação dos bronquíolos e alvéolos adjacentes → fibrose (anormal) em vez da reparação normal
    • O resultado global é a estenose ou obliteração das pequenas vias aéreas levando a:
      • Obstrução
      • Aprisionamento de ar
      • ↓ Trocas gasosas
  • Em doentes submetidos a transplante, a lesão das vias aéreas é causada por:
    • Insuficiência microvascular
    • Respostas aloimunes
    • DRGE com microaspiração
Fisiopatologia da bronquiolite

Fisiopatologia da bronquiolite:
A imagem da esquerda representa a estrutura de um bronquíolo normal. A imagem da direita representa as alterações que ocorrem na bronquiolite obliterante. A lesão dos bronquíolos distais resulta na inflamação dos bronquíolos e alvéolos adjacentes. Desenvolve-se fibrose (o que é anormal) ao invés da reparação normal. Há acumulação de muco, constrição e hipertrofia do músculo liso brônquico, com estenose posterior das pequenas vias aéreas.

Imagem de Lecturio.

Apresentação clínica

Deve-se suspeitar de bronquiolite obliterante em doentes com dispneia e tosse lentamente progressivas, especialmente quando a apresentação é atípica para se tratar de asma ou de doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC).

  • Dispneia
  • Tosse:
    • Persistente (em oposição à asma episódica)
    • Progressiva, aparecendo lentamente ao longo de semanas a meses
    • Pode ter ou não expetoração
  • Possíveis achados ao exame objetivo:
    • Taquipneia
    • ↓ Sons respiratórios
    • Prolongamento da fase expiratória
    • Crepitações e/ou sibilos

Vídeos recomendados

Diagnóstico

O diagnóstico de bronquiolite obliterante é feito geralmente com base na história clínica, testes de função pulmonar, exames de imagem e biópsia.

Testes pulmonares

  • Os testes pulmonares incluem:
    • Espirometria:
      • Mede o volume de ar inspirado e expirado
      • Geralmente realizada antes e após a administração de broncodilatadores → determina o grau de reversibilidade da obstrução do fluxo aéreo
    • Capacidade de difusão:
      • Mede a transferência de gases para o sangue
      • Uma baixa concentração de monóxido de carbono no ar inalado é absorvida pela hemoglobina nas hemácias.
    • Útil no diagnóstico de várias doenças pulmonares
  • Definições e siglas importantes:
    • Capacidade pulmonar total (CPT): volume total de ar nos pulmões no final de uma inspiração máxima
    • Volume expiratório forçado no 1º segundo (VEF1)
    • Capacidade vital forçada (CVF): volume total expirado forçado
    • Volume residual (VR): volume restante após uma expiração máxima
    • Capacidade residual funcional (CRF): volume restante no final de uma respiração em volume corrente
    • Capacidade de difusão dos pulmões de monóxido de carbono (DLCO, pela sigla em inglês): reflete a capacidade do pulmão de transferir o gás inalado através da membrana alvéolo-capilar
  • Obstrução versus restrição:
    • Padrão restritivo:
      • ↓ CPT e CVF
      • Pensar: “os pulmões não podem expandir-se (restrição) → ↓ volumes que entram e saem”
      • Exemplo: doença pulmonar intersticial
    • Padrão obstrutivo:
      • ↓ Relação VEF 1 /CVF
      • Pensar: “Os pulmões podem expandir-se e contrair, mas o ar move-se lentamente (obstrução)”.
      • Exemplos: asma, DPOC e bronquiolite
Interpretação dos testes de função pulmonar

Algoritmo para interpretação dos testes de função pulmonar:
VEF1: volume expiratório forçado no 1º segundo
CVF: capacidade vital forçada (volume exalado forçado total)
DLCO: capacidade de difusão dos pulmões de monóxido de carbono (reflete a capacidade do pulmão de transferir o gás inalado através da membrana alvéolo-capilar)
DPOC: doença pulmonar obstrutiva crónica
DPI: doença pulmonar intersticial

Imagem de Lecturio.

Bronquiolite obliterante

  • Obstrução irreversível do fluxo de ar: ↓ VEF1
  • Evidência de aprisionamento de ar: ↑ VR e CRF
  • Possível hiperinsuflação: ↑ CPT
  • Trocas gasosas prejudicadas: ↓ DLCO
  • Pode ser normal:
    • O ser humano tem um número elevado de bronquíolos.
    • Tem de haver afeção de uma percentagem elevada para haver alterações na espirometria.

Outros exames de diagnóstico

  • Radiografia de tórax:
    • Geralmente é normal
    • Pode mostrar:
      • ↑ Espessamento da parede brônquica
      • Hiperinsuflação
  • TC de alta resolução (TC-AR):
    • Espessamento da parede brônquica: opacidades lineares ramificadas
    • Opacidades em vidro fosco num padrão de mosaico
  • Broncoscopia:
    • Raramente é necessária para o diagnóstico.
    • Os achados são geralmente inespecíficos.
    • Usada quando há suspeita de outras causas de obstrução do fluxo aéreo:
      • Tumores endobrônquicos
      • Sarcoidose
      • Infeções que condicionam lesões pulmonares
  • Biópsia pulmonar:
    • Necessária para o diagnóstico definitivo (apesar de, habitualmente, poder ser feito um diagnóstico clínico sem uma biópsia)
    • Uma amostra cirúrgica (transbrônquica) é preferencial
    • Histopatologia:
      • Hipertrofia do músculo liso bronquiolar
      • Infiltrados inflamatórios peribronquiolares
      • Acumulação de muco bronquiolar
      • Fibrose e obliteração dos bronquíolos (por fibrose submucosa)
Tcar na bronquiolite obliterante

TC de alta resolução (TC-AR) na bronquiolite obliterante:
A TC-AR na expiração mostra um padrão de atenuação em mosaico que resulta do aprisionamento do ar.

Imagem: “Mimics in chest disease: interstitial opacities” by Oikonomou A, Prassopoulos P.  Licença: Domínio Público, cortada por Lecturio.

Tratamento

A bronquiolite obliterante é habitualmente progressiva e refratária à terapêutica; assim, a abordagem é geralmente de suporte, orientada pelos sintomas e baseada na etiologia.

Tratamento Geral

  • Remover quaisquer agentes agressores / desencadeantes.
  • Cessação tabágica
  • Vacinação atualizada anti-influenza e anti-pneumocócica
  • Tratar a DRGE:
    • Inibidores da bomba de protões
    • Antagonistas do recetor da histamina-2
  • Alívio dos sintomas:
    • Antitússicos:
      • Dextrometorfano
      • Codeína
    • Broncodilatadores inalatórios
  • Oxigenoterapia suplementar, se necessária, para saturações de oxigénio ≥ 89%
  • Considerar uma prova terapêutica (3 a 6 meses) de antibioterapia com macrólidos:
    • Opções:
      • Azitromicina
      • Eritromicina
      • Claritromicina
    • Não está formalmente estudada em doentes não submetidos a transplante
    • Evidência limitada sugere que pode haver alguns benefícios.
  • Considerar uma prova terapêutica (4 a 6 semanas) com glucocorticoides em doentes com:
    • Doença reumática
    • Asma coexistente

Tratamento em Doentes Transplantados

  • Aumentar a imunossupressão:
    • Tacrolimus
    • Ciclosporina
    • Micofenolato mofetil
    • Prednisona
  • A evidência mostra melhoria na função pulmonar em doentes (submetidos a transplante de células estaminais hematopoiéticas) que estão sob a seguinte terapêutica:
    • Fluticasona (corticoide inalado)
    • Montelucaste (antagonista do recetor de leucotrienos oral)
    • Azitromicina (antibiótico macrólido oral)
  • Considerar o retransplante quando a SBO for grave.

Diagnóstico Diferencial

  • Asma: doença que resulta de hiperreatividade brônquica e de inflamação crónica das vias aéreas que leva à obstrução intermitente do fluxo aéreo. A asma apresenta-se geralmente com dispneia intermitente, tosse e sibilos em resposta a uma variedade de estímulos. É diagnosticada com base na história clínica e na espirometria, que mostra uma relação VEF1 /CVF (obstrução) reduzida, reversível com broncodilatadores (ao contrário da bronquiolite obliterante, que não é reversível). O tratamento envolve a evicção dos precipitantes e a utilização de broncodilatadores e glucocorticoides.
  • DPOC: doença pulmonar obstrutiva que se deve à inflamação resultante da exposição crónica a partículas ou gases nocivos (geralmente tabagismo). Os subtipos de DPOC incluem o enfisema, a bronquite crónica e a asma obstrutiva crónica. Tanto as pequenas vias aéreas como o parênquima pulmonar podem ser afetados. A espirometria mostra habitualmente obstrução irreversível ou apenas parcialmente reversível (relação VEF 1 /CVF reduzida). O tratamento envolve a cessação tabágica e a utilização de broncodilatadores de ação prolongada.
  • Bronquiectasias: dilatação anormal dos brônquios com destruição e espessamento da parede brônquica. As bronquiectasias são desencadeadas por infeções crónicas ou recorrentes, no contexto de disfunção ou obstrução da drenagem das vias aéreas, sendo caracterizadas por tosse crónica, dispneia e produção diária de expetoração. As bronquiectasias são uma patologia que afeta as grandes vias aéreas, enquanto a bronquiolite obliterante afeta as pequenas vias aéreas. O diagnóstico é geralmente confirmado com uma TC de tórax que mostra espessamento da parede brônquica e dilatação das grandes vias aéreas.
  • Pneumonite de hipersensibilidade: doença pulmonar intersticial caracterizada por uma reação imunológica anormal no parênquima pulmonar em resposta a uma substância inalada. Os agentes desencadeantes estão frequentemente relacionados com poeiras agrícolas ou microorganismos associados à agricultura, manipulação de animais e trabalhos na ventilação e construção. Os doentes apresentam tosse produtiva, dispneia, fadiga e perda de peso. O diagnóstico envolve achados característicos na TC-AR e linfocitose no lavado broncoalveolar.

Referências

  1. Bronchiolitis: Causes, symptoms and treatments (n.d.). Retrieved March 19, 2021, from https://my.clevelandclinic.org/health/diseases/8272-bronchiolitis
  2. King, T. (2020). Overview of bronchiolar disorders in adults. In Hollingsworth, H. (Ed.). UpToDate. Retrieved February 11, 2021, from https://www.uptodate.com/contents/overview-of-bronchiolar-disorders-in-adults
  3. McCormack, M. (2020). Overview of pulmonary function testing in adults. In Hollingsworth, H. (Ed.). UpToDate. Retrieved February 11, 2021, from https://www.uptodate.com/contents/overview-of-pulmonary-function-testing-in-adults
  4. Krishna, R., Anjum, F. (2020). Bronchiolitis obliterans. In Oliver, T. (Ed.). StatPearls. Retrieved February 11, 2021, from https://www.statpearls.com/articlelibrary/viewarticle/18642/

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