Blefarite

A blefarite é uma condição ocular caracterizada por inflamação das pálpebras. A blefarite anterior envolve a pele da pálpebra e os cílios, enquanto a blefarite posterior afeta as glândulas meibomianas. Muitas vezes, estas condições sobrepõem-se. A apresentação típica da blefarite inclui edema palpebral com prurido e hiperemia, crostas e escamas à volta dos cílios e sensação de corpo estranho. O diagnóstico é clínico, através de um exame com lâmpada de fenda que fornece detalhes das alterações estruturais que afetam o olho. A base do tratamento é a higiene das pálpebras com compressas mornas e esfoliação palpebral. Em casos moderados a graves, são utilizados antibióticos tópicos e orais. Os glucocorticóides tópicos também ajudam a melhorar os sintomas, mas requerem uma avaliação oftalmológica adequada devido aos potenciais efeitos adversos.

Última atualização: Jul 13, 2025

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

Descrição Geral

Definição

  • Inflamação da margem palpebral
  • A irritação crónica recorrente pode levar a fibrose e cicatrizes nas pálpebras e afetar as estruturas circundantes (córnea e conjuntiva).

Anatomia

  • As pálpebras protegem os olhos de lesões e da luz.
  • Camadas da pálpebra (de superficial para mais profundo):
    • Pele
    • Tecido celular subcutâneo laxo
    • Músculo orbicular do olho:
      • Fecha as pálpebras
      • Auxilia na drenagem lacrimal
    • Placa tarsal:
      • Tecido conjuntivo que confere rigidez estrutural à pálpebra
      • Contém as glândulas meibomianas
      • O músculo elevador da pálpebra superior é inserido na placa tarsal superior.
    • Conjuntiva palpebral: cobre a superfície interna das pálpebras
  • Glândulas da pálpebra:
    • Glândulas de Meibomius
      • Glândulas sebáceas modificadas com orifícios atrás dos cílios
      • Meibum (secreção rica em lipídios): previne a evaporação das lágrimas e uniformiza o filme lacrimal sobre a superfície do olho
    • Glândula de Moll
      • Glândulas sudoríparas modificadas
      • Orifício entre cílios adjacentes
    • Glândula de Zeiss
      • Glândula sebácea
      • Orifício no folículo dos cílios
  • Cílios:
    • Protegem os olhos de partículas ou detritos, que podem causar infeção ou lesão
    • Dispostos em fileiras duplas ou triplas na junção mucocutânea

Tipos

  • Categorizadas com base na localização anatómica, mas muitas vezes sobrepõem-se
  • Blefarite posterior:
    • Mais comum
    • Causada principalmente por disfunção/bloqueio das glândulas meibomianas
    • Envolve as glândulas meibomianas, placa tarsal e junção blefaro-conjuntival
  • Blefarite anterior:
    • Inflamação da pele da pálpebra, base dos cílios e folículos dos cílios
    • Variantes:
      • Blefarite estafilocócica: crostas à volta dos cílios causadas por Staphylococcus aureus e Staphylococcus coagulase-negativo
      • Blefarite seborreica: escamas e crostas gordurosas sobre a base das pálpebras com alterações escamosas na pele
Corte sagital da pálpebra superior

Corte sagital da pálpebra superior apresentando as suas estruturas internas

Image by Lecturio.

Fisiopatologia e Etiologia

Fisiopatologia

  • Blefarite posterior:
    • Anomalia funcional das glândulas meibomianas → composição alterada do meibum
    • As secreções tipo cera podem bloquear os orifícios glandulares.
    • Material estagnado e composição lipídica alterada → promove o crescimento bacteriano → inflamação
    • A inflamação crónica danifica a estrutura da pálpebra e facilita ainda mais a disfunção da glândula.
  • Blefarite anterior: mecanismo não totalmente compreendido, mas as vias incluem
    • Infeção direta a partir da colonização palpebral por Staphylococcus
    • Irritação provocada pelas toxinas bacterianas e inflamação mediada por células em resposta aos antigénios
    • Envolvimento de infestação parasitária (ácaro Demodex): o tratamento do Demodex melhora os casos de blefarite refratária mas o seu papel exato é ainda desconhecido.

Etiologia

  • Doenças de pele
    • Dermatite seborreica
      • Geralmente causa blefarite anterior
      • Crostas cor de mel ao longo dos bordos palpebrais e em redor dos cílios
    • Rosácea
      • Geralmente causa blefarite posterior
      • Distúrbio inflamatório que resulta em rubor e eritema facial
    • Dermatite atópica
      • Caracterizada por escamas ao longo da linha dos cílios, edema e hiperemia
    • Psoríase
      • Manifesta-se com pálpebras edemaciadas e descamação dos cílios
      • Associada a placas bem definidas e descamativas nos cotovelos e joelhos
  • Infeções
    • Infeção bacteriana
      • Dermatite estafilocócica (mais comum)
      • Tipicamente associada à blefarite anterior
    • Infeção vírica
      • Molusco contagioso
      • Dermatite Varicela Zoster
      • Dermatite por herpes simples
    • Infestação parasitária
      • Demodex folliculorum (nos folículos palpebrais): causa blefarite anterior
      • Demodex brevis (nas glândulas meibomianas): causa blefarite posterior
      • Nem todos com infestação desenvolvem blefarite
  • Outros
    • Irritantes e alergénios
      • Pálpebras eritematosas, edemaciadas e com prurido
      • Melhora com a remoção do agente agressor
    • Medicamentos: retinóides
      • Causa blefarite posterior
      • Melhora com a descontinuação do fármaco

Apresentação Clínica

Sintomas

  • Tipicamente bilateral
  • Pálpebras vermelhas, edemaciadas e com prurido, de uma forma crónica e episódica
  • Sensação de areias ou de ardência ocular
  • Lacrimejo
  • Crostas na pele e descamação na margem palpebral e cílios
  • Secreções pela manhã que encerram os cílios
  • Visão turva transitória
  • Vesículas e ulcerações encontradas em infeções por herpes ou varicela

Sinais

  • Exame com lâmpada de fenda da blefarite posterior:
    • Orifícios das glândulas meibomianas aumentados
    • Glândulas obstruídas com secreções espessas, cerosas, brancas ou amarelas
  • Exame com lâmpada de fenda da blefarite anterior:
    • Eritema e edema da margem palpebral
    • Telangiectasias na pálpebra externa
    • Colarette: crosta em forma de anel à volta dos cílios (Staphylococcus)
    • Manga: caspa cilíndrica (infestação Demodex)
    • Flocos gordurosos (tipo seborreico)
    • Madarose: perda de cílios
    • Poliose: branqueamento dos cílios
    • Triquíase: direção errada dos cílios
    • Entrópio: pálpebra virada para dentro
    • Ectrópio: pálpebra virada para fora
  • Outros achados:
    • Hiperemia conjuntival
    • Estabilidade do filme lacrimal: tempo de rutura da lágrima < 10 segundos é considerado anormal
    • Córnea:
      • Erosões: provocadas pelas margens palpebrais inflamadas
      • Infiltrados e flicténulas (nódulos da córnea): reação de hipersensibilidade a antigénios estafilocócicos
      • Úlceras
      • Cicatrizes de irritação crónica

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Diagnóstico e Tratamento

Diagnóstico

  • Clínico, com base nos sinais e sintomas
  • Em casos refratários: o exame microscópico dos cílios para verificar a presença de ácaros Demodex pode ajudar nos casos de apresentação típica (mangas nos cílios)

Tratamento

  • Higiene das pálpebras
    • Tratamento básico e mais importante na blefarite
    • Compressas mornas (10 minutos, 4 vezes/dia) para amolecer crostas/escamas e aquecer as secreções
    • Massagem da pálpebra para expressar secreções
    • Lavagem da pálpebra para remover detritos
    • Lágrima artificial para aliviar o olho seco
  • Eliminar fatores despoletantes ou agentes agressores
  • Doença associada ao Demodex
    • Esfoliantes palpebrais e champô com óleos: mostraram ser eficazes
    • Ivermectina oral
  • Antibióticos tópicos
    • Se as medidas sintomáticas iniciais falharem
    • Erradicam bactérias nos cílios e conjuntiva
    • Opções: bacitracina, eritromicina, azitromicina
  • Antibióticos orais
    • Para blefarite crónica moderada a grave
    • Para blefarite que não responde a medicamentos tópicos
    • Opções: doxiciclina, minociclina, zithromax
  • Glucocorticóides tópicos
    • Prescritos apenas após avaliação por um oftalmologista
    • Podem aumentar a pressão intraocular, por isso é necessário acompanhamento e reavaliação
  • Ciclosporina tópica
    • Para blefarite resistente aos tratamentos standard

Diagnóstico Diferencial

  • Conjuntivite: inflamação da conjuntiva, o revestimento externo do olho. A etiologia pode ser infeciosa ou não infeciosa. Os pacientes apresentam-se com hiperemia e secreção ocular de um ou ambos os olhos. A conjuntivite bacteriana geralmente apresenta secreções purulentas, enquanto as causas víricas apresentam secreções aquosas.
  • Dacriocistite : inflamação do saco nasolacrimal frequentemente causada por obstrução do ducto. Esta condição apresenta-se como eritema e edema na área do ducto lacrimal. A estase lacrimal facilita o sobrecrescimento bacteriano permitindo assim a ocorrência de infeção, que se manifesta com secreção mucopurulenta. Para o tratamento, são aplicadas compressas quentes e antibióticos, se indicado. Nos casos de obstrução persistente, são opções de tratamento a intubação do ducto nasolacrimal ou outras intervenções cirúrgicas.
  • Hordéolo (terçolho): abcesso que afeta o folículo dos cílios ou as glândulas da pálpebra. Esta condição manifesta-se na maioria dos casos por uma margem palpebral localmente dolorosa, eritematosa e edemaciada. A maioria das lesões resolve espontaneamente, sendo que é possível facilitar a sua drenagem com a aplicação de compressas mornas suaves. Se o abcesso não resolver, é realizada incisão e drenagem por um oftalmologista.
  • Chalázio: massa firme e indolor na pálpebra, que resulta da obstrução das glândulas Zeiss ou meibomianas (glândulas sebáceas). Esta condição é geralmente tratada de forma conservadora com compressas mornas. A persistência da lesão requer incisão e curetagem ou injeção de glucocorticóide por um oftalmologista.

Referências

  1. Denniston, A., Murray, P. (2014) Oxford Handbook of Ophthalmology, Third edition.Oxford University Press.
  2. Eberhardt, M., Zeppieri, M., & Rammohan, G. (2025). Blepharitis. In StatPearls. StatPearls Publishing. Retrieved July 10, 2025, from https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK459305/
  3. Lowery, R., Law, S., Dahl, A. (2023). Adult Blepharitis. Retrieved July 10, 2025, from https://emedicine.medscape.com/article/1211763-overview
  4. Putnam, C. (2016) Diagnosis and management of blepharitis. Clin Optom (Auckl), 8: 71–78. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6095371/
  5. Shtein, R. M. (2025). Blepharitis. In D. S. Jacobs (Ed.), UpToDate. Retrieved July 10, 2025, from https://www.uptodate.com/contents/blepharitis

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