Articulação da Anca

A articulação da anca é uma articulação esferoidal formada pela cabeça do fémur e o acetábulo da anca. É a articulação mais estável do corpo e é suportada por uma cápsula muito forte e vários ligamentos, permitindo que a articulação sustente forças que podem ser várias vezes o peso total do corpo. É possível tolerar estas forças graças ao alinhamento ósseo e ao suporte substancial dos estabilizadores estáticos e dinâmicos da anca. Existem vários grupos musculares que se ligam aos componentes da articulação da anca, permitindo a amplitude de movimento da articulação. Os músculos que se ligam à articulação da anca incluem os da região glútea e da coxa.

Última atualização: Jan 17, 2024

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

Estrutura Óssea da Articulação da Anca

A articulação da anca é uma articulação multiaxial que liga a bacia às extremidades inferiores. Em comparação com a articulação glenoumeral (ombro), a anca tem menor amplitude de movimento e tem como principal função a sustentação do peso e estabilidade.

  • Tipo: diartrose (articulação sinovial) de esfera e encaixe
  • Superfícies articulares:
    • Cabeça do fémur
    • Acetábulo do osso ilíaco (labrum acetabular: um anel de cartilagem que aumenta a profundidade e a estabilidade da superfície articular)
  • Estruturas de apoio:
    • Cápsula fibrosa
    • Ligamentos intra-articulares e extra-articulares
    • Bursas iliopectíneas, trocantéricas e isquiáticas
  • Funções:
    • Conecta o esqueleto axial aos membros inferiores
    • Suporta peso durante condições estáticas (ou seja, em pé) e dinâmicas (ou seja, caminhando e correndo)
    • Permite flexão-extensão, rotação lateromedial, abdução-adução e circundução da coxa
Vista anterior da articulação da anca

Vista anterior da articulação da anca (bacia com maior transparência), onde se observam os pontos ósseos mais importantes da extremidade proximal do fémur

Imagem por BioDigital, editada por Lecturio.

Estruturas de Suporte da Articulação da Anca

Cápsula articular

Composto por 2 camadas:

  1. Cápsula fibrosa:
    • A camada externa da cápsula
    • Fixa-se proximalmente ao acetábulo, próximo ao bordo
    • Fixa-se distalmente em redor da extremidade proximal do fémur:
      • Anteriormente, à linha intertrocantérica (área mais espessa)
      • Superiormente, até a base do colo do fémur (área mais espessa)
      • Posteriormente, a cerca de 1 cm da crista intertrocantérica
      • Inferiormente, no colo do fémur próximo ao trocânter menor
    • Tem fibras circulares profundas que formam um colar em redor do colo do fémur, chamado zona orbicular (ou ligamento anular)
  2. Membrana sinovial:
    • A camada interna da cápsula
    • Produz líquido sinovial, uma substância viscosa que lubrifica e permite a circulação de nutrientes para a articulação
    • Tem origem na margem da superfície articular da cabeça femoral, cobre uma porção do colo femoral, reflete-se na superfície interna da cápsula, atinge o tecido adiposo da fossa acetabular e envolve o ligamento da cabeça do fémur.
Corte transversal da articulação do quadril

Corte transversal da articulação da anca, apresentando as inserções da cápsula articular e ligamentos de suporte

Imagem por Lecturio.

Ligamentos

Podem ser divididos em 2 grupos:

  1. Intra-articulares:
    • Ligamento da cabeça femoral ou ligamento redondo do fémur: leva a artéria à cabeça femoral
    • Ligamento transverso do acetábulo
  2. Extra-articulares, que sustentam a cápsula:
    • Iliofemoral ou “ligamento Y de Bigelow”: é o ligamento mais forte do corpo humano
    • Pubofemoral: evita a abdução excessiva
    • Ligamentos isquiofemorais: previnem a hiperextensão
Tabela: Ligamentos intra-articulares
Inserções Funções
Ligamento da cabeça femoral (ou ligamento redondo do fémur) Ápex da fóvea femoral para cada lado da incisura acetabular Limita a abdução e a rotação lateral quando a coxa está em semiflexão; leva a artéria para a cabeça do fémur
Ligamento transverso do acetábulo Estrutura fibrosa que converte a incisura acetabular em forámen Permite a passagem da neurovasculatura para a articulação
Tabela: Ligamentos extra-articulares
Inserções Funções
Ligamento iliofemoral Espinha ilíaca anteroinferior e bordo acetabular até a linha intertrocantérica e o trocânter maior
  • Evita a rotação lateral excessiva e a hiperextensão da anca em pé
  • Reforça a cápsula anteriormente
Ligamento pubofemoral Parte púbica da borda acetabular e ramo púbico superior até a parte inferior do colo do fémur
  • Limita abdução e extensão
  • Reforça a cápsula inferiormente
Ligamento isquiofemoral Região isquiática do acetábulo até o colo do fémur, medial ao trocânter maior
  • Limita a rotação medial e extensão
  • Reforça a cápsula posteriormente
Zona orbicular Ligamento anular formado pelas fibras circulares profundas da cápsula fibrosa, que contém fibras de todos os ligamentos extra-articulares Estabiliza a anca

Bursas

As bursas são pequenas bolsas cheias de líquido sinovial que reduzem o atrito entre os componentes ósseos da articulação e os músculos circundantes.

  • Bolsa trocantérica: entre o trocânter maior e o trato iliotibial
  • Bursa isquiática: entre a tuberosidade isquiática e o glúteo máximo
  • Bursa subglúteo médio: entre a superfície superior do trocânter maior e o glúteo médio
  • Bursa do subglúteo mínimo: entre a superfície superior do trocânter maior e o glúteo mínimo
  • Bursa iliopectínea ou do iliopsoas:
    • A maior bolsa do corpo humano
    • Localizado entre a cápsula fibrosa da anca e o iliopsoas
Bursas da articulação do quadril

Bursas da articulação da anca

Imagem por Lecturio.

Músculos Flexores da Articulação da Anca

Os principais músculos flexores da anca são o iliopsoas e o reto femoral.

Tabela: Músculos flexores da articulação da anca
Músculo Origem Inserção Inervação
Iliopsoas Ilíaco: Bordo lateral do sacro e fossa ilíaca Tendão iliopsoas: trocânter menor do fémur Nervo femoral (L2-L4)
Psoas maior: processos transversos das vértebras T12-L5 Plexo lombar (L1-L3)
Psoas menor: corpos vertebrais de T12-L1 Ramo iliopúbico Ramo anterior do nervo L1
Reto femoral (quadricípite) Espinha ilíaca anteroinferior, bordo superior do acetábulo femoral Base da patela através do tendão do quadricípite Nervo femoral
Tensor da fáscia lata Espinha ilíaca anterossuperior Trato iliotibial Nervo glúteo superior (L4-L5)
Sartório Espinha ilíaca anterossuperior Lado medial superior da tíbia Nervo femoral (L2-L3)

Músculos Extensores da Articulação da Anca

O músculo extensor primário da anca é o glúteo máximo, auxiliado pelos músculos bicípite femoral, semitendinoso e semimembranoso.

Tabela: Músculos extensores da articulação da anca
Músculo Origem Inserção Inervação
Glúteo máximo Ílio, sacro, cóccix e ligamento sacrotuberoso Tuberosidade glútea do fémur e banda iliotibial Nervo glúteo inferior (L4-S1)
Bicípite femoral
  • Cabeça longa: tuberosidade isquiática
  • Cabeça curta: linha supracondilar superior e linha áspera
  • Côndilo tibial lateral
  • Cabeça da fíbula
  • Cabeça longa: nervo tibial (L5-S2)
  • Cabeça curta: nervo fibular comum (L5-S2)
Semitendinoso Tuberosidade isquiática Superfície superomedial da tíbia Nervo tibial (L5-S2)
Semimembranoso Côndilo medial da tíbia
Vista lateral e posterior do músculo glúteo máximo

Músculo glúteo máximo: com a sua origem e inserção nas vistas posterior e lateral

Imagem por BioDigital, editada por Lecturio.

Músculos Abdutores da Articulação da Anca

Tabela: Músculos abdutores da articulação da anca
Músculo Origem Inserção Inervação
Glúteo médio Superfície externa do ílio, entre a crista ilíaca e as linhas glúteas anterior e posterior Trocânter maior Nervo glúteo superior (L4-S1)
Glúteo mínimo Superfície externa do ílio, entre as linhas glúteas anterior e posterior
Piriforme Superfície anterior do sacro e ligamento sacrotuberoso Nervo para o piriforme (L5-S2)
Tensor da fáscia lata Espinha ilíaca anterossuperior, lábio da crista ilíaca Trato iliotibial Nervo glúteo superior (L4-S1)

Músculos Adutores da Articulação da Anca

Tabela: Músculos adutores da articulação da anca
Músculo Origem Inserção Inervação
Pectíneo Linha pectínea do púbis e tubérculo púbico Linha pectínea do fémur Nervos obturador e femoral (L2-L4)
Gracilis Ramo púbico inferior Face medial da tuberosidade da tíbia Nervo obturador (L2-L4)
Adutor longo Osso púbico, entre a crista e a sínfise Linha áspera do fémur
Adutor curto Corpo e ramo inferior do púbis
Magno adutor Tuberosidade isquiática e ramo inferior do púbis Linha áspera e tubérculo adutor Nervos obturador e tibial (L3-S2)

Músculos Rotadores Externos da Articulação da Anca

Tabela: Músculos rotadores externos da articulação da anca
Músculo Origem Inserção Inervação
Obturador interno Membrana obturadora e ramos isquiopúbicos Trocânter maior Nervo para o obturador interno (L5-S2)
Obturador externo Área lateral do forámen obturador, membrana obturadora externa e ramo isquiopúbico Fossa intertrocantérica do fémur Nervo para os músculos obturadores (L3-L4)
Músculos gémeos
  • Gémeo superior: espinha isquiática
  • Gémeo inferior: tuberosidade isquiática
  • Gémeo superior: tendão do trocanter maior e obturador interno
  • Gémeo inferior: tendão obturador interno
  • Gémeo superior: nervo para o obturador interno (L5-S2)
  • Gémeo inferior: nervo para o quadrado femoral (L4-S1)
Quadrado femoral Tuberosidade isquiática Crista intertrocantérica do fémur Nervo para o quadrado femoral (L4-S1)
Piriforme Superfície anterior do sacro e ligamento sacrotuberoso Trocânter maior Nervo para o piriforme (L5-S2)

Neurovasculatura da Anca

Vascularização

As artérias que fornecem a articulação da anca originam-se da artéria ilíaca comum, que se bifurca em artérias ilíacas internas e externas.

  • Artéria ilíaca interna – divide-se em tronco posterior e tronco anterior, que possui múltiplos ramos:
    • Artérias glúteas: ramos superior e inferior
    • Artéria obturadora: dá origem à artéria da cabeça do fémur dentro do ligamento da cabeça do fémur
  • Artéria ilíaca externa – torna-se a artéria femoral após passar sob o ligamento inguinal:
    • A artéria femoral profunda, um ramo profundo da artéria femoral, fornece vasculizarização sanguínea para a articulação da anca juntamente com os seus ramos:
      • Artéria femoral circunflexa medial (AFCM)
      • Artéria femoral circunflexa lateral (AFCL)
  • Os ramos das artérias ilíaca interna (glútea inferior) e ilíaca externa (profunda femoral) formam uma importante conexão na anca: a anastomose cruzada.

As veias da articulação da anca acompanham as artérias em trajetória e nome.

Inervação

Os nervos femoral e obturador, originados do plexo lombar (T12-L4), e vários nervos menores que surgem do plexo sagrado (L4-S4), inervam a articulação da anca.

  • Coxa anterior/medial:
    • Nervo femoral (L2-L4): inerva os músculos anteriores da coxa e a região anterior da articulação da anca
    • Nervo obturador (L2-L4): inerva principalmente os músculos adutores e a face inferior da articulação
    • Nervo safeno: ramo cutâneo terminal do nervo femoral
  • Região posterior da coxa/glúteo:
    • Nervo ciático (L4–S3): passa pelo forámen isquiático maior até a região glútea; o nervo ciático é o nervo mais longo e largo do corpo
    • Nervo glúteo superior (L4-S1): inerva os músculos glúteo médio, glúteo mínimo e tensor da fáscia lata e a face superior da articulação
    • Nervo glúteo inferior (L5-S2): inerva o músculo glúteo máximo
    • Nervo quadrado femoral: inerva a face posterior da articulação, o músculo gémeo inferior e o músculo quadrado femoral

Dica clínica: A articulação do joelho também é inervada pelos nervos femoral, obturador e ciático, explicando os padrões de irradiação da dor do joelho para a anca.

Relevância Clínica

Os pontos seguintes são clinicamente relevantes relativamente à articulação e região da anca:

  • Doença de Legg-Calve-Perthes: também conhecida como necrose avascular idiopática da cabeça femoral proximal, caracterizada por necrose avascular idiopática da cabeça femoral. Apresenta-se como claudicação com início insidioso e dor na anca associada.
  • Epífise femoral capital deslizante: um distúrbio ortopédico do início da adolescência caracterizado pelo “deslizamento” patológico ou deslocamento da cabeça do fémur, ou epífise, no colo do fémur.
  • Fratura da anca: classificada de acordo com a localização anatómica da fratura em intracapsular ou extracapsular. A queda de baixo impacto é o mecanismo típico de lesão em idosos, muitas vezes associada à osteoporose. Nos jovens, são mais comuns os acidentes automobilísticos e outros traumas de alta velocidade.
  • Fratura e necrose do colo do fémur: Se a fratura for secundária a trauma ou osteoporose, a vascularização sanguínea da cabeça femoral pode ficar comprometida, podendo levar à necrose avascular pós-traumática.
  • Luxação da anca: ocorre mais frequentemente em casos de trauma de alta energia, como acidentes automobilísticos. A luxação posterior (90%) é a mais comum, e a extremidade geralmente apresenta-se aduzida e em rotação interna. As luxações da anca podem estar associadas à necrose avascular e lesão do nervo ciático.
  • Displasia da anca: uma malformação inata ou adquirida da anca geralmente observada em recém-nascidos. Caracterizada pela instabilidade da anca, resultando em subluxação ou luxação. O diagnóstico precoce é essencial porque o diagnóstico tardio pode resultar em danos irreversíveis à articulação, o que pode levar a uma anca dolorosa e marcha anormal.
  • Osteoartrite: caracterizada pela perda da cartilagem articular hialina, mas também envolve alterações no osso subcondral, na sinovial e nas estruturas articulares circundantes. A osteoartrite é a forma mais comum de artrite e é principalmente uma doença do envelhecimento. Os pacientes apresentam uma perda de amplitude de movimento e artralgias.
  • Síndrome do piriforme: também chamada síndrome glútea profunda ou nevrite da carteira, é caracterizada por uma combinação de sintomas envolvendo a anca, nádegas e parte superior da coxa. Descrita como nevrite periférica do nervo ciático e pode estar relacionada com a irritação do nervo ciático ao nível do músculo piriforme. Pode ser causada por trauma, hematoma, demasiado tempo sentado e variações anatómicas do músculo e do nervo.
  • Marcha de Trendelenburg: marcha anormal secundária à fraqueza dos músculos abdutores da anca, principalmente os músculos glúteo médio e glúteo mínimo, essenciais para manter o equilíbrio da bacia durante o ciclo da marcha. A fraqueza dos abdutores da anca causa uma queda da bacia contralateral durante a caminhada, ou marcha de Trendelenburg.

Referências

  1. Drake, R.L., Vogl, A.W., & Mitchell, A.W.M. (2014). Gray’s Anatomy for Students (3rd ed.). Philadelphia, PA: Churchill Livingstone.
  2. Gold, M., Munjal, A, & Varacallo, M. (2020). Anatomy, Bony Pelvis and Lower Limb, Hip Joint. In StatPearls. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK470555/

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