Leiomioma Uterino e Leiomiossarcoma

Os leiomiomas uterinos (ou miomas uterinos) são tumores benignos que surgem de células musculares lisas do miométrio uterino. No entanto, os leiomiossarcomas são tumores malignos, surgindo de novo (não de miomas). Os leiomiomas são muito comuns, com um risco de desenvolvimento ao longo da vida de > 70% para mulheres afro-americanas e caucasianas. Por outro lado, os leiomiossarcomas são raros. Os leiomiossarcomas podem apresentar-se de forma semelhante aos miomas uterinos, tornando o diagnóstico pré-operatório desafiador. Ambas as condições apresentam hemorragia anormal, dor pélvica e/ou sintomas de massa uterina. Um mioma é identificado como uma massa hipoecoica, bem circunscrita e redonda na ecografia pélvica. Um leiomiossarcoma é geralmente diagnosticado numa amostra pós-operatória. Dependendo dos sintomas e da preferência da doente, o tratamento para leiomioma pode incluir resseção cirúrgica ou opções médicas para reduzir a hemorragia e/ou massa. O tratamento do leiomiossarcoma, que acarreta um prognóstico desfavorável, pode incluir quimioterapia adjuvante com base no estadio.

Última atualização: May 10, 2022

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

Epidemiologia

Os leiomiomas são tumores benignos do músculo liso que surgem do miométrio uterino, enquanto os leiomiossarcomas são tumores malignos agressivos do miométrio.

Leiomioma

  • Tumor pélvico mais comum em mulheres
  • Ocorrem em mulheres em idade reprodutiva:
    • Prevalência ↑ com a idade durante os anos reprodutivos
    • Pode ser diagnosticado (mas não se forma) após a menopausa
  • Risco estimado ao longo da vida:
    • Mulheres afro-americanas: 80%
    • Mulheres caucasianas: 70%

Leiomiossarcoma

  • Muito raro
  • < 10% dos cancros do corpo uterino
  • Incidência:
    • 3-7 por 100.000
    • 1 por 500 em doentes submetidas a cirurgia para massa miometrial
  • Pico de incidência: 40-60 anos

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Fisiopatologia

Leiomioma

  • Tumor monoclonal do miométrio uterino
  • Surge dos miócitos
  • Contém quantidade considerável de colagénio
  • Massa(s) redonda, firme, elástica, bem circunscrita
  • Responsivo ao estrogénio:
    • ↑ Na gravidez
    • ↓ Após a menopausa

Fatores predisponentes:

  • Raça: afro-americana > mulheres caucasianas
  • Fatores reprodutivos:
    • Nuliparidade (a gravidez é um estado dominante de progesterona → um alívio da exposição crónica ao estrogénio que pode estimular o aparecimento de leiomiomas)
    • Menarca precoce
    • Menopausa tardia
  • Obesidade
  • História familiar de miomas

Classificação:

  • Intramural:
    • Localizado dentro da parede do miométrio
    • Pode estender-se para a cavidade/subserosa ou estar completamente contido na parede
    • De forma geral, o mais comum
  • Submucoso:
    • Localizado logo abaixo do endométrio
    • Distorce a cavidade endometrial
    • Mais frequentemente responsável por hemorragia anormal e dificuldades na fertilidade
    • Pode ter um crescimento pedunculado em haste na cavidade endometrial
  • Subseroso:
    • Localizado logo abaixo da serosa
    • Mais provável de causar sintomas de massa
  • Pedunculado:
    • Crescimento fora do corpo uterino em haste
    • Pode torcer e causar dor aguda
  • Cervical:
    • Com origem no colo do útero
    • Rara
Miomas uterinos

Miomas uterinos (localização):
Mioma subseroso (abaixo da serosa), mioma submucoso (sob o endométrio), mioma intramural (na parede do miométrio), mioma pedunculado (crescimento do corpo uterino em haste)

Imagem por Lecturio.

Leiomiossarcoma

  • Tumores malignos do corpo uterino
  • Surgem de novo (não derivados de leiomiomas)

Padrões:

  • Massa volumosa e carnuda que invade a parede uterina
  • Massa polipoide que se projetando para a cavidade endometrial

Diferenciação dos leiomiomas pelo grau de:

  • Atipia nuclear
  • Atividade mitótica

Fatores predisponentes:

  • ↑ Risco em mulheres afro-americanas
  • Idade avançada e estado pós-menopausa
  • Uso de tamoxifeno
  • História de radiação pélvica

Apresentação Clínica

As apresentações de leiomioma e leiomiossarcoma podem ser clinicamente indistinguíveis.

Tanto o leiomioma como o leiomiossarcoma podem ser assintomáticos.

Sintomas menstruais/hemorragia

  • Hemorragia menstrual intensa
  • Hemorragia menstrual prolongada
  • Hemorragia intermenstrual ou pós-coital (especialmente com miomas prolapsados pelo colo do útero)
  • Hemorragia pós-menopausa

Sintomas de dor

  • Dismenorreia
  • Dor pélvica
  • Dispareunia (coito doloroso)
  • Dor aguda devido a:
    • Degeneração do leiomioma
    • Torção de lesões pediculadas

Sintomas relacionados a massa

  • Pressão pélvica
  • ↑ Frequência urinária
  • Obstipação (com compressão retal)
  • Massa pélvica

Disfunção reprodutiva

  • Infertilidade (causada por distorção da cavidade endometrial)
  • Abortos recorrentes
  • Outras complicações obstétricas

Diagnóstico

Os passos para o doagnóstico para leiomiomas e leiomiossarcomas são os mesmos, mas não há exames ou achados com alto valor preditivo positivo para sarcomas.

Exame pélvico

  • Útero assimétrico aumentado com contorno irregular
  • Os miomas pequenos não aumentam o tamanho do útero.

Imagiologia e endoscopia

  • Ecografia transvaginal (1º passo):
    • Sensibilidade para detetar leiomiomas: 95%–100%
    • Massa hipoecoica, bem circunscrita, redonda
    • Calcificações → mioma degenerado
    • Características relativas ao leiomiossarcoma: ecogenicidade mista, necrose central, distribuição irregular dos vasos
  • Ecografia com infusão salina (teste de follow-up):
    • Solução salina estéril é injetada na cavidade endometrial para distendê-la durante a ecografia vaginal para avaliar lesões intracavitárias.
    • Usada em casos de suspeita de miomas submucosos e doentes com infertilidade
  • Histeroscopia: permite avaliação e tratamento simultâneo de patologia intracavitária, incluindo miomas submucosos
  • Ressonância magnética pélvica:
    • Raramente indicada (ajuda no planeamento de cirurgias)
    • Leiomiomas: imagens T2 escuras e homogéneas
    • Leiomiossarcomas: margens mal definidas
  • Achados com alto valor preditivo negativo para sarcoma:
    • Aparência típica de leiomioma na ressonância magnética (imagens escuras e homogéneas em T2)
    • Ausência de calcificações
Radiologia de miomas uterinos

Mulher de 49 anos com histórico de menorragia:
A: Imagem de ecografia transabdominal que mostra um útero volumoso com mioma submucoso de 10 cm (entre os cursores)
B: RM ponderada em T2 sagital na mesma doente mostra que o mioma submucoso (cabeça de seta) é heterogéneo, o que indica degeneração. Também se verifica a presença um mioma cervical de 2,5 cm (seta).

Imagem : “Menorrhagia” por Department of Radiology, Norfolk & Norwich University Hospital, Colney Lane, Norwich, Norfolk, NR4 7UY, United Kingdom. Licença: CC BY 2.0

O diagnóstico definitivo requer exame histológico

  • Biópsia endometrial:
    • Improvável de diagnosticar leiomioma ou leiomiossarcoma
    • Usada para descartar outras causas de hemorragia anormal
  • Avaliação intraoperatória

Tratamento e Prognóstico

Tratamento médico para leiomiomas

Abordagem geral:

  • Tratar a dor: AINEs
  • Tratar anemia: suplementação de ferro
  • A observação/vigilância é uma opção se as doentes forem assintomáticas.

Para tratar sintomas hemorrágicos (tratmento médico de 1ª linha):

  • Hormonal:
    • Progestativos: dispositivo intrauterino (DIU) libertador de levonorgestrel
    • Contracetivos hormonais combinados (comprimidos, adesivo, anel vaginal)
  • Não-hormonais: antifibrinolíticos (ácido tranexâmico)

Para tratar sintomas da massa ou dor (1ª linha) ou sintomas da hemorragia (2ª linha):

Análogos da hormona libertadora de gonadotrofinas (GNRH, pela sigla em inglês):

  • Elagolix (antagonista da GNRH)
  • Leuprolida (agonista da GNRH)
  • Tanto os agonistas como os antagonistas suprimem completamente a hormona folículo-estimulante (FSH, pela sigla em inglês) → ↓ estrogénio → miomas encolhem
  • Limitar a terapia a 6-12 meses para prevenir a osteoporose.

Tratamento cirúrgico para leiomiomas

  • Resseção histeroscópica:
    • Útil apenas para leiomiomas submucosos
    • Tratamento de 1ª linha para miomas submucosos associados a:
      • Hemorragia menstrual intensa
      • Dificuldades na fertilidade
  • Miomectomia:
    • Remoção de leiomiomas do útero
    • Usado em doentes que desejam manter a fertilidade com leiomiomas não submucosos
  • Histerectomia:
    • Remoção de todo o útero
    • Considerada tratamento definitivo para leiomiomas
    • 1ª linha se houver suspeita de leiomiossarcoma
  • Alternativas à resseção cirúrgica:
    • Embolização da artéria uterina
      • ↓ Suprimento sanguíneo para miomas → necrose
      • Benéfico para hemorragia e sintomas de massa
      • Não deve ser usada em doentes que desejam fertilidade futura
    • Cirurgia focada na ecografia: ecografia de alta intensidade induz necrose

Tratamento e prognóstico dos leiomiossarcomas

Os leiomiossarcomas são geralmente diagnosticados apenas após a cirurgia para miomas presumidos. As decisões de tratamento são normalmente tomadas após um procedimento inicial:

  • Histerectomia total, se ainda não realizada
  • Terapia adjuvante dependendo do estadio:
    • Quimioterapia
    • Radioterapia ainda está em investigação

Prognóstico:

  • Geralmente desfavorável
  • ↑ Risco de recorrência
  • Sobrevivência específica da doença aos 5 anos: 66%

Diagnóstico Diferencial

Os diagnósticos diferenciais de massa uterina e/ou dor pélvica incluem:

  • Gravidez: pode-se apresentar como uma massa uterina aumentada com aumento da pressão pélvica, sintomas de massa e anomalias hemorrágicas se houver complicações obstétricas (por exemplo, hemorragia subcoriónica). O diagnóstico é feito com um teste de gravidez e confirmado por ecografia.
  • Endometriose: implantação ectópica de endométrio funcional fora da cavidade uterina, que leva a dismenorreia potencialmente grave, inflamação e dificuldade na fertilidade. A ecografia pode mostrar um endometrioma (quisto ovárico preenchido por tecido endometrial), mas não demonstra uma massa uterina. O tratamento geralmente envolve a supressão do endométrio com progestativos ou, em casos mais graves, análogos de GNRH/tratamento laparoscópico.
  • Adenomiose: implantes endometriais dentro do miométrio uterino, que levam a hemorragia menstrual intensa, prolongada e muitas vezes dolorosa, semelhante aos leiomiomas. Os implantes fazem com que o útero se torne simetricamente aumentado, laxo e globular. Não estão presentes massas discretas, o que distingue adenomiose de leiomiomas na ecografia. O tratamento é semelhante à endometriose. No entanto, a adenomiose também frequentemente inclui histerectomia como tratamento definitivo.
  • Pólipos endometriais: surgem do crescimento excessivo no epitélio endometrial. Os pólipos são geralmente (embora nem sempre) benignos e normalmente apresentam hemorragia uterina anormal (se sintomático). Os pólipos endometriais são melhor visualizados com uma ecografia com infusão salina e aparecem como uma massa intracavitária pedunculada (em comparação com a maioria dos miomas submucosos, que são menos propensos a ter um pedúnculo). O tratamento (e diagnóstico definitivo) é por resseção histeroscópica.
  • Outras doenças malignas: outras doenças malignas do útero ou órgãos reprodutivos também podem apresentar aumento de massa uterina e/ou hemorragia anormal. As malignidades mais importantes a serem consideradas incluem carcinossarcoma uterino, carcinoma endometrial e metástases de outros órgãos (especialmente ovários, trompas de Falópio, colo do útero e vagina). O leiomioma é muitas vezes facilmente diferenciado de outras malignidades na ecografia. As melhores opções para identificar cancro endometrial e cervical são, respetivamente, biópsia endometrial e exame de Papanicolau.

Referências

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  2. Memarzadeh, S. and Berek, J.S. (2019). Uterine sarcoma: Classification, epidemiology, clinical manifestations, and diagnosis. In Chakrabarti, A. (Ed.), UpToDate. Retrieved February 10, 2021, from https://www.uptodate.com/contents/uterine-sarcoma-classification-epidemiology-clinical-manifestations-and-diagnosis
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  6. Crum, C.P. (2005). The female genital tract. In Kumar, V., Abbas, A.K., and Fausto, N. (Eds). Robbins and Cotran Pathologic Basis of Disease (7th ed., pp. 1089-1090). 

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