Avaliação Psiquiátrica

A avaliação psiquiátrica (ou exame do estado mental) é equivalente a um exame físico, e está projetada de forma a avaliar um doente para a presença de patologia psiquiátrica. Embora a avaliação psiquiátrica tenha uma abordagem predominantemente padronizada e bem definida, o médico pode adaptá-la com base nos sintomas apresentados pelo doente. A avaliação psiquiátrica procura avaliar sistematicamente várias características das doenças psiquiátricas e envolve tanto questões diretas como observação passiva.

Última atualização: Apr 27, 2022

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

Visão Geral de uma Entrevista Psiquiátrica

Embora possa haver variabilidade na forma como diferentes médicos conduzem a entrevista, nomeadamente adaptando-se às necessidades do doente e ao seu diagnóstico mais provável, a estrutura geral da entrevista deve ser reproduzível e seguir um curso lógico e sistematizado.

  1. Rever os registos disponíveis e garantir um local seguro e privado para a entrevista psiquiátrica.
  2. Observar os sinais de comunicação não-verbal do doente e avaliar o seu nível de agitação.
  3. Apresentar-se ao doente.
  4. Perceber qual o motivo principal para a consulta do doente.
  5. Obter a história pregressa do doente e conduzir a entrevista psiquiátrica.
  6. Obter os antecedentes pessoais do doente (nomeadamente, história médica/psiquiátrica prévia, história familiar, história social).
  7. Fazer um exame do estado mental.
  8. Listar os diagnósticos diferenciais.
  9. Desenvolver um plano de cuidados apropriado reunindo uma equipa multidisciplinar de tratamento:
    • Nível de cuidados necessários (internamento, hospital de dia, ambulatório)
    • Farmacoterapia
  10. Determinar um intervalo de seguimento adequado.

Parte Inicial da Entrevista Psiquiátrica

  • Antes de falar com o doente:
    • Garantir um local seguro e privado para a entrevista:
      • Especialmente importante para doentes com potencial de agressividade tanto no hospital psiquiátrico como na urgência
      • Os profissionais de saúde devem ter acesso fácil de fuga, e a sala deve estar livre de objetos que possam causar danos a si mesmos ou a outros.
    • Também é geralmente útil fazer uma revisão dos registros médicos anteriores e estudos laboratoriais, embora estes dados possam influenciar a entrevista.
  • Contacto inicial com o doente:
    • Observar a comunicação não verbal e avaliar o nível de agitação.
    • Apresentar-se ao paciente e estabelecer a relação médico-paciente.
    • Usar perguntas abertas.
    • Nos doentes que não conseguem fornecer história pode ser necessário contactar informantes colaterais.

História da Doença Atual

  • Determinar o início e caracterizar os sintomas: estar atento a quaisquer eventos stressantes anteriores, doenças médicas ou uso de substâncias.
  • Evolução dos sintomas:
    • História de sintomas semelhantes no passado
    • Crescentes vs. decrescentes ou ambos de forma intermitente
    • Progressão dos sintomas
  • Triggers para os sintomas: fatores de alívio e de agravamento
  • Rastreio de 5 critérios diagnósticos chave:
    • Sintomas de humor: depressão vs. mania
    • Sintomas psicóticos
    • Sintomas relacionados com ansiedade
    • Uso de substâncias
    • Suicidalidade/homicidalidade

Obter a História Passada

  • História médica/cirúrgica pregressa:
    • Muitas doenças médicas apresentam sintomas que podem associar-se a condições psiquiátricas (por exemplo, hipotiroidismo e depressão).
    • Registar a medicação atual, incluindo suplementos alimentares.
  • História familiar:
    • A história familiar psiquiátrica é importante, uma vez que algumas doenças mentais são vistas mais predominantemente em crianças e familiares de doentes afetados.
    • A história familiar médica também é importante.
  • História Social:
    • Muito mais extensa do que na colheita de história noutras especialidades
    • História do desenvolvimento/primeira infância
    • Nível de educação
    • Histórico de ocupação e recursos financeiros
    • Crenças religiosas/espirituais
    • Relacionamentos, namoro, orientação sexual e história sexual
    • Hobbies e interesses

Exame do Estado Mental (EEM)

  • Equivalente psiquiátrico do exame físico
  • Alguns componentes do EEM são obtidos por meio da observação, enquanto outros são obtidos através de perguntas.
  • Útil para identificar défices cognitivos, perturbações de humor, sintomas psicóticos e pensamentos suicidas.
Tabela: Principais componentes do EEM
Categoria Componentes
Aparência Descrição geral da aparência e comportamento do doente:
  • Idade
  • Sexo
  • Raça
  • Constituição corporal
  • Postura
  • Contato visual excessivo ou reduzido
  • Adequação do vestuário
  • Asseio
  • Maneiras
  • Atenção ao examinador
  • Características distintas
  • Anormalidades físicas proeminentes
  • Expressão facial emocional
  • Vigilância/alerta
Orientação Consciência de tempo, espaço e pessoa
Atenção e
concentração
  • Capacidade de soletrar uma palavra para trás e para frente
  • Série 7s (contagem regressiva desde 100 em 7s)
Orientação espacial Capacidade de desenhar uma casa ou um relógio com ponteiros indicando uma hora específica
Motor
  • Lentificação
  • Agitação
  • Movimentos anormais
  • Marcha
  • Catatonia
Discurso
  • Frequência
  • Ritmo
  • Volume
  • Quantidade
  • Articulação
  • Espontaneidade
Humor Estado emocional interno e auto-descrito do paciente
Afeto Expressão do humor do doente ou impressão clínica do humor para o médico
  • Adequação do afeto: como o afeto se correlaciona com o contexto. Por exemplo, um doente que descreve sintomas de depressão enquanto ri, apresenta um afeto incongruente ou inadequado com o seu humor.
  • Um termo frequentemente utilizado para descrever o afeto é “aplanado”, que traduz restrição dos afetos e que é encontrado em alguns pacientes com esquizofrenia.
Conteúdo do pensamento
Que pensamentos estão na mente dos doentes:
  • Ideação suicida
  • Desejos de morte
  • Ideação homicida
  • Cognições depressivas
  • Obsessões
  • Ruminações
  • Fobias
  • Ideias de referência
  • Ideação paranóica
  • Ideação mágica
  • Delírios
  • Ideias sobrevalorizadas
Processo do pensamento
Descreve como certos pensamentos são contruídos, organizados e expressados:
  • Associações (circunstanciais ou tangenciais)
  • Fuga de ideias
  • Associações sonoras
  • Perseveração
  • Neologismo
  • Bloqueio
Memória
  • Capacidade de recordar 3 objetos simples após 2 e 5 minutos
  • Capacidade de recordar eventos distantes do passado
Pensamento abstrato
Capacidade de alternar entre conceitos gerais e exemplos específicos (por exemplo: “Em que aspeto são iguais laranjas e maçãs?”)
Perceção
  • Alucinações
  • Ilusões
  • Despersonalização
  • Desrealização
  • Déjà vu
  • Jamais vu
Capacidade cognitiva
  • Média, acima da média, abaixo da média
  • Determinado durante a entrevista através do conteúdo dos pensamentos e pelas conquistas educacionais e profissionais
Crítica Consciência da própria doença, humor e nível de funcionamento e suas implicações
Julgamento
  • Capacidade de tomar e agir conforme boas decisões
  • Nem sempre se correlaciona com o insight

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Avaliação do Risco de Suicídio

  • Um dos componentes mais críticos da avaliação psiquiátrica
  • Determina se o doente preenche critérios de internamento versus tratamento ambulatório
  • Definições:
    • Desejos de morte passivos: quando se pensa em não acordar sem agir ativamente para se prejudicar
    • Automutilação: métodos para causar dor sem intenção de cometer suicídio (por exemplo, corte)
    • Ideação suicida: quando os pensamentos se transformaram em atos de automutilação
    • Tentativa de suicídio: é cometida uma ação (por exemplo, tiro, enforcamento, overdose) na tentativa de se prejudicar a si mesmo
    • Ideação suicida e tentativas anteriores são fatores de risco independentes para suicídio.
  • Começar com perguntas mais indiretas, como “Você já sentiu que a vida não vale a pena ser vivida?”
  • Os psiquiatras podem então ser diretos e perguntar:
    • “Você teve pensamentos ou planos para se matar?”
    • “Você tem acesso a uma arma de fogo?”
  • A formulação de um plano suicida específico é indicativa de intenção mais séria e iminente, comparativamente a ideias vagas de automutilação sem planos concretos.

Escalas de Avaliação Psiquiátrica

  • Existem escalas validadas pela evidência científica ou reportadas pelos doentes que são usadas para auxiliar no diagnóstico e avaliar o estado mental.
  • Frequentemente aplicadas rapidamente com papel e lápis
  • Não são suficientes para diagnosticar uma condição psiquiátrica por si só
  • Para EEM:
    • Mini-exame do estado mental (MMSE)
    • Avaliação Cognitiva de Montreal (MoCA, pela sigla em inglês)
  • Para depressão:
    • Questionário de saúde do paciente
    • Inventário de Depressão de Beck II
  • Para ansiedade:
    • Transtorno de ansiedade generalizada 7 (GAD-7)
    • Rastreio de transtornos relacionados com a ansiedade infantil (SCARED)
  • Para transtorno obsessivo compulsivo: Yale Brown Obsessive Compulsive Scale (Y-BOCS)
  • Para PHDA: classificação de diagnóstico de PHDA de Vanderbilt
  • Para transtornos de uso de substâncias
    • Cut down, A nnoyed , G uilty, E ye-opener (CAGE): especificamente para rastreio breve de transtorno de uso de álcool
      • Você já sentiu que precisava diminuir o consumo de álcool?
      • Já foi interpelado por outras pessoas em relação aos consumos?
      • Já se sentiu culpado pelo consumo excessivo de álcool?
      • Já sentiu necessidade de beber logo como primeira ação da manhã?

Referências

  1. American Psychiatric Association. (2006). Practice guidelines for the psychiatric evaluation of adults, second edition. Am J Psychiatry. 163(6Suppl), 1–36. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/16866240/ 
  2. Black, D. (2017). The psychiatric interview and mental status examination. DeckerMed Medicine. Retrieved October 15th, 2021, from  https://doi.org/10.2310/7800.13001 
  3. Sadock, BJ, Sadock, VA, & Ruiz, P. (2014). Chapter 5: Examination and diagnosis of the psychiatric patient. In Kaplan and Sadock’s Synopsis of Psychiatry: Behavioral Sciences/Clinical Psychiatry, 11th ed., pp. 192–289. Philadelphia, PA: Lippincott Williams and Wilkins.

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