Aparelho Branquial e Arcos Aórticos

Os arcos branquiais, também conhecidos como arcos faríngeos ou viscerais, são estruturas embrionárias encontradas no desenvolvimento de vertebrados, que servem como precursores para muitas estruturas da face, pescoço e cabeça. Estes arcos são compostos por um núcleo central de mesoderme, que é coberto externamente pela ectoderme e internamente pela endoderme. As reentrâncias entre arcos são conhecidas como fendas faríngeas, ou sulcos, externamente e as bolsas faríngeas internamente. Cada arco faríngeo contém componentes cartilaginosos e musculares, que são supridos por um nervo craniano (derivado das células da crista neural) e uma artéria, conhecida como arco aórtico faríngeo. Alguns destes arcos aórticos formam os grandes vasos próximos do coração.

Última atualização: Nov 4, 2023

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

Revisão do Desenvolvimento Embriológico Inicial

Blastocisto e disco bilaminar

A mórula (bola de células) passa por um processo denominado blastulação, no qual uma cavidade começa a formar-se. As células começam, então, a diferenciar-se em massas celulares externa e interna.

  • Massa celular externa → trofoblasto → placenta e membranas
  • Massa celular interna → embrioblasto → disco bilaminar:
    • Epiblasto
    • Hipoblasto
  • Saco amniótico: cavidade de fluido que se desenvolve “acima” do epiblasto (entre o epiblasto e o trofoblasto)
  • Saco vitelino primitivo: cavidade que se forma “abaixo” do hipoblasto (entre hipoblasto e trofoblasto)

Disco trilaminar

O disco bilaminar sofre um processo denominado gastrulação para formar o disco trilaminar. As células da camada epiblástica migram inferiormente, substituindo o hipoblasto (endoderme) e criando uma 3ª camada intermediária (mesoderme).

  • Ectoderme (camada dorsal):
    • Contínua com o âmnios
    • Formada a partir de células remanescentes na camada do epiblasto
    • Estruturas derivadas da ectoderme:
      • Tubo neural → cérebro e medula espinhal
      • Células da crista neural → nervos cranianos associados aos arcos branquiais, SNP
  • Mesoderme (camada intermediária), tem vários componentes:
    • Mesoderme paraxial → forma o componente mesodérmico dos arcos branquiais
    • Mesoderme intermediária → sistema geniturinário
    • Mesoderme da placa lateral (LPM, pela sigla em inglês):
      • Camada somática da LPM
      • Camada esplâncnica da LPM → forma o tubo cardíaco primitivo e os arcos aórticos faríngeos
    • Mesoderme extraembrionária:
      • Circunda a cavidade amniótica → contínua com a LPM somática
      • Envolve o saco vitelino → contínua com a LPM esplâncnica
  • Endoderme (camada ventral):
    • Endoderme embrionária (geralmente denominada apenas de endoderme) → torna-se o tubo intestinal primitivo → origina a maioria dos órgãos GI
    • Endoderme extraembrionária → reveste o saco vitelino
  • Formação do disco trilaminar (dobra em 2 direções):
    • Dobra lateral:
      • Dá origem a uma estrutura cilíndrica cercada por ectoderme e cavidade amniótica
      • Dá origem ao tubo intestinal primitivo internamente a partir da endoderme
    • Dobra crânio-caudal:
      • Dá origem a uma extremidade cranial e uma extremidade caudal (o embrião adopta uma forma em feijão)
      • Força o saco vitelino para longe do corpo. A haste alongada que conecta o saco vitelino ao tubo intestinal é o ducto vitelino.

Origem e Estrutura do Aparelho Branquial

Desenvolvimento do aparelho branquial

O aparelho branquial (que significa “brânquias”) também é conhecido como aparelho faríngeo em humanos.

  • Ocorre na 4ª a 5ª semana embrionária
  • Nos humanos, formam-se 5 protuberâncias ou dobras em forma de arco no lado ventral do intestino anterior (parte do tubo intestinal primitivo), na região que se tornará a cabeça e o pescoço.
    • Arcos branquiais nomeados I-VI
      • Em humanos, existem os arcos I, II, III, IV e VI
      • O arco V não existe em humanos; é uma estrutura noutros vertebrados (e.g., peixes).
      • Os 4º e 6º arcos fundem-se → resulta num total de 4 arcos faríngeos
    • Cada um dos arcos consiste em todas as 3 camadas germinativas:
      • Endoderme: camada interna
      • Mesoderme: núcleo central
      • Ectoderme: camada externa
  • As células mesenquimais migram inferiormente (ventralmente) a partir da mesoderme paraxial, circundando o intestino anterior derivado da endoderme:
    • Formam a parede lateral do trato digestivo
    • Continuam a proliferar na porção cranial do tubo, formando o núcleo mesodérmico dos arcos branquiais
  • Associado a cada arco está:
    • Um nervo craniano (inervação)
    • Um arco aórtico faríngeo (irrigação sanguínea)
  • Os arcos são separados:
    • Externamente por fendas faríngeas, também denominadas sulcos faríngeos:
      • Consistem em recortes de ectoderme
      • A reentrância/fenda I está abaixo do arco I.
    • Internamente por bolsas faríngeas
      • Consistem em recortes de endoderme, diretamente em frente aos sulcos
      • A bolsa I está abaixo do arco I.
  • Diferentes segmentos do tubo têm diferentes padrões de expressão génica → desencadeiam várias diferenciações distintas em cada sulco/arco/bolsa

Estrutura e derivados do aparelho branquial

  • Fendas faríngeas (também denominadas de sulcos faríngeos):
    • 4 recortes de ectoderme localizados na superfície externa da estrutura
    • Tornam-se o epitélio externo
  • Arcos faríngeos:
    • 4 núcleos de mesoderme localizados no meio da estrutura
    • Desenvolvem-se em:
      • Cartilagem e tecido conjuntivo
      • Músculo
      • Ossos
    • Contém também:
      • Nervos
      • Artérias
  • Bolsas faríngeas:
    • 4 reentrâncias de endoderme localizadas na superfície interna da estrutura
    • Desenvolvem-se em:
      • Epitélio interno
      • Glândulas

Desenvolvimento dos Arcos Faríngeos

Desenvolvimento dos arcos faríngeos

Os arcos faríngeos desenvolvem-se em componentes-chave da cabeça e pescoço.

  • Cada arco contém um núcleo do mesênquima denso que se desenvolve em:
    • Estrutura de cartilagem → osso, via ossificação endocondral
    • Músculos
    • Tecido conjuntivo
  • Somitómeros:
    • Tecido muscular, segmentado de mesoderme paraxial, localizado em ambos os lados do tubo neural
    • Migram para os arcos em desenvolvimento
    • Associados ao desenvolvimento de cartilagem nestes locais
  • Nervos branquiais:
    • Derivados das células da crista neural, que estão originalmente localizadas dorsalmente ao tubo neural
    • Migram com os somitómeros para o tecido mesenquimal, em desenvolvimento, dos arcos faríngeos
    • Desenvolvem-se nos nervos cranianos, inervando os músculos, desenvolvendo-se simultaneamente dentro de cada arco.
  • O suprimento sanguíneo é através dos arcos aórticos branquiais associados.
Derivados dos arcos faríngeos e nervos cranianos associados

Derivados dos arcos faríngeos e os nervos cranianos (NCs) associados

Imagem por Lecturio.

Derivações e associações de cada arco faríngeo

Tabela: Derivações de cada arco faríngeo
Arco Elemento de cartilagem Musculatura Nervo
  • Osso temporal
  • Osso maxilar
  • Osso zigomático
  • Osso da mandíbula
  • Martelo e bigorna (1ºs 2 ossículos do ouvido interno)
  • Músculos da mastigação
  • Músculo digástrico (ventre anterior)
  • Músculo milo-hioideu
  • Músculo tensor do tímpano
  • Músculo tensor do véu palatino
NC V: ramo mandibular do nervo trigémeo
  • Corno menor e corpo do hioide
  • Estapédio (3º ossículo)
  • Processo estiloide
  • Ligamento estilo-hioideu
  • Músculos da expressão facial
  • Músculo digástrico (ventre posterior)
  • Músculo estilo-hióideo
  • Músculo estapédio (ouvido interno)
NC VII: nervo facial
Corno maior do osso hioide Músculo estilofaríngeo NC IX: nervo glossofaríngeo
4º/6º
  • Cartilagem da tiroide
  • Cartilagem cricoide
  • Cartilagem aritenoide
  • Músculos do palato, faringe e laringe
  • Músculo cricotiroideu
  • Músculo constritor da faringe
  • Músculo elevador do véu palatino
NC X: nervo vago
  • 4º arco: nervo laríngeo superior
  • 6º arco: nervo laríngeo recorrente

Arcos Aórticos Faríngeos

Cada arco branquial tem o seu próprio par de artérias do arco branquial; existem 5 arcos aórticos em humanos.

Desenvolvimento precoce

  • O tubo cardíaco primitivo forma-se a partir da camada esplâncnica da LPM nas primeiras 3 semanas de desenvolvimento.
  • A vasculogénese faz com que a porção superior do tubo cardíaco primitivo se divida em:
    • Tronco pulmonar
    • Saco aórtico
  • Arcos aórticos faríngeos:
    • Originam-se como vasos pareados do saco aórtico
    • Enrolam-se em redor do tubo intestinal em desenvolvimento
    • Originam as 2 aortas dorsais pareadas que correm longitudinalmente ao longo do embrião (as aortas dorsais fundem-se, caudalmente, na aorta descendente)
  • Em humanos, desenvolvem-se um total de 5 pares de arcos:
    • Os arcos mais cranianos desenvolvem-se 1º (e regridem)
    • Os arcos caudais desenvolvem-se mais tarde

Derivados do arco aórtico faríngeo

  • 1º e 2º arcos aórticos: maioritariamente regridem
    • 1º arco → artéria maxilar
    • 2º arco → artéria estapediana (muitas vezes degenera completamente, persiste numa minoria de indivíduos)
  • 3º arco aórtico: artéria carótida comum e interna:
  • 4º arco aórtico:
    • Esquerda → o arco aórtico definido
    • Direita → secção proximal da artéria subclávia direita
  • 5º arco aórtico: não se desenvolve em humanos
  • 6º arco aórtico: arco pulmonar
    • Esquerda:
      • Artéria pulmonar esquerda
      • Canal arterial
    • Direita:
      • Tronco pulmonar
      • Artéria pulmonar direita
Diagrama: arcos aórticos faríngeos

Diagrama que descreve a formação, regressão e diferenciação dos arcos aórticos faríngeos

Imagem por Lecturio.

Desenvolvimento das Fendas e Bolsas Faríngeas

Fendas faríngeas (sulcos faríngeos)

As fendas faríngeas são formadas pelas invaginações da ectoderme na parte externa, entre os arcos faríngeos.

  • Apenas 1 das 4 fendas faríngeas ectodérmicas se desenvolvem num sistema de órgãos definido.
  • 1ª fenda faríngea desenvolve-se em:
    • Canal auditivo externo
    • Superfície externa da membrana timpânica
  • 2ª fenda faríngea:
    • Prolifera e cresce caudalmente
    • Cresce “sobre” a 3ª e 4ª fendas faríngeas
    • Funde-se com a crista epicárdica → forma o seio cervical (revestido pela ectoderme):
      • Mais tarde degenera
      • Se a degeneração falhar, podem desenvolver-se quistos laterais de fenda branquial.
  • 3ª e 4ª fendas faríngeas:
    • Formam o revestimento medial do seio cervical
    • Por último, degeneram
Desenvolvimento das fendas faríngeas

Desenvolvimento das fendas faríngeas

Imagem por Lecturio.

Desenvolvimento das Bolsas Faríngeas

As bolsas faríngeas são criadas pelas pregas para o exterior da endoderme, entre os arcos faríngeos.

  • 1ª bolsa faríngea:
    • Cavidade timpânica (ou seja, cavidade do ouvido médio)
    • Trompa auditiva ou de Eustáquio (drenagem do ouvido médio para a cavidade nasal)
  • 2ª bolsa faríngea: amígdalas
  • 3ª bolsa faríngea: divide-se em componente dorsal e ventral:
    • Broto dorsal → glândulas paratiroides inferiores (começa mais superiores, mas movem-se inferiormente)
    • Broto ventral → timo (começa no pescoço e desce para o peito)
  • 4ª bolsa faríngea: divide-se em componente dorsal e ventral:
    • Broto dorsal → glândulas paratiroides superiores (começam mais inferiormente e depois sobem)
    • Broto ventral → corpo ultimobranquial (às vezes atribuído a uma 5ª bolsa faríngea) → células parafoliculares ou células C produtoras de calcitonina na glândula tiroide
Desenvolvimento das bolsas faríngeas

Desenvolvimento das bolsas faríngeas

Imagem por Lecturio.

Relevância Clínica

Síndromes do 1º e 2º arco

  • Síndrome de Treacher-Collins: subdesenvolvimento da mandíbula (micrognatia) e deformidade dos ossos zigomáticos, ossículos e ouvido externo (resulta em problemas de audição). Mutações genéticas, que resultam num défice de células da crista neural, podem causar uma deficiência na migração de células da crista neural para o 1º arco faríngeo, levando a uma escassez de células necessárias para criar estas estruturas.
  • Sequência de Pierre-Robin: O subdesenvolvimento da mandíbula (possivelmente devido ao posicionamento e/ou compressão in útero) leva a uma posição mais posterior da língua, que por sua vez leva a uma incapacidade da oclusão do palato (resultando numa fenda palatina).
  • Agnatia: condição rara na qual o maxilar inferior não se forma completamente.
  • Síndrome de Goldenhar: malformação combinada do 1º e 2º arcos branquiais de etiologia desconhecida, levando a anomalias que afetam principalmente os olhos, ouvidos e coluna vertebral. A apresentação é com anomalias faciais assimétricas, incluindo malformações do ouvido externo (e.g., microtia, anotia), tumores oculares ou dermoides, ossos e músculos faciais subdesenvolvidos e anomalias da coluna. Também são possíveis outras anomalias do coração, rins, pulmões e membros.

Condições do 3º e/ou 4º arcos

  • Síndrome de DiGeorge: resultado de uma microdeleção cromossómica 22q11.2 que causa anomalias da formação da 3ª e 4ª bolsas faríngeas. Esta resulta em infeções frequentes por hipoplasia tímica, hipocalcemia (por desenvolvimento anormal da paratiroide), fenda palatina, fácies anormal (como micrognatia e orelhas de implantação baixa) e defeitos cardíacos (incluindo, potencialmente, tetralogia de Fallot, defeito do septo ventricular, e/ou truncus arteriosus).
  • Quistos e fístulas branquiais laterais: Se o seio cervical persistir, formam-se quistos de fenda branquial lateral. Estes quistos são geralmente benignos, mas podem ser incómodos. As fístulas também podem formar-se entre estes quistos, seja com uma abertura externa (geralmente na borda anterior do músculo esternocleidomastoideu) e/ou uma abertura interna (conduzindo para a fossa supra-amigdalina, o que pode resultar em mau hálito).

Referências

  1. Miles, B. (2021). Embryology, pharyngeal pouch. StatPearls. Retrieved Nov 1, 2021, from https://www.statpearls.com/articlelibrary/viewarticle/89854/ 
  2. Isaacson, G. C. (2019). Congenital anomalies of the jaw, mouth, oral cavity, and pharynx. UpToDate. Retrieved Nov 2, 2021, from https://www.uptodate.com/contents/congenital-anomalies-of-the-jaw-mouth-oral-cavity-and-pharynx

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