Perturbação de Pânico

A perturbação de pânico é uma condição caracterizada por ataques de pânico recorrentes e episódicos que ocorrem abruptamente e sem nenhum fator desencadeante. Estes episódios são limitados no tempo e apresentam sintomas cardiorrespiratórios (palpitações, falta de ar, asfixia), gastrointestinais (náuseas, desconforto abdominal) e neurológicos (parestesias, tonturas). Pode surgir medo de morrer ou de “enlouquecer”. Os doentes podem desenvolver agorafobia (medo de estar em lugares ou situações em que a saída ou fuga é difícil). Os sintomas têm impacto funcional diário. O diagnóstico de perturbação de pânico é um diagnóstico difícil porque os ataques de pânico também surgem noutras perturbações de ansiedade e noutros distúrbios mentais. Além disso, determinadas doenças orgânicas podem ter sintomas semelhantes. Uma história clínica detalhada, um exame físico completo e exames de diagnóstico orientados para o doente (com base na sua idade, nos riscos e comorbilidades) ajudam no diagnóstico. O tratamento inclui psicoterapia e farmacoterapia (inibidor selectivo da recaptação de serotonina (IRSS) e inibidor da recaptação de serotonina-norepinefrina (IRSN)).

Última atualização: Oct 19, 2022

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

Descrição Geral

Definição

A perturbação de pânico é caracterizada por episódios recorrentes e crónicos de ataques de pânico (sem fator desencadeante) associada a uma preocupação significativa com ataques futuros, comportamento desadaptativo e impacto funcional num período ≥ 1 mês.

Um ataque de pânico não é uma perturbação mental. Pelo contrário, esta perturbação é uma sensação de ansiedade/medo intenso que surge repentinamente, de modo espontâneo, limitada no tempo (minutos a uma hora) e surge muitas vezes com sintomas físicos.

Epidemiologia

  • A prevalência de perturbação de pânico ao longo da vida nos Estados Unidos é de 4,7%.
  • As mulheres são duas vezes mais suscetíveis a serem afetadas do que os homens.
  • Normalmente surge na adolescência até ao início dos 30.
  • Quase 40% das pessoas com perturbação de pânico têm história pregressa de depressão grave.

Fisiopatologia

Fatores genéticos e ambientais desempenham um papel importante.

  • Genética:
    • ↑ Prevalência de perturbação de pânico nas pessoas com família em 1º grau com a condição
    • Grandes níveis de concordância em gémeos monozigóticos
  • Mudanças estruturais no cérebro:
    • Envolve múltiplos circuitos neurais incluindo as seguintes regiões:
      • Pré-frontal
      • Temporal
      • Cingulado anterior
      • Ínsula
      • Amígdala
      • Hipocampo
      • Hipotálamo
    • São observadas alterações nestas regiões aquando de um ataque de pânico.
    • Também implica a alteração dos recetores GABA-benzodiazepina e recetores de serotonina (↑ generalização do medo)
  • Temperamento ansioso e neurótico: maior reatividade ao stress e más estratégias de cooping perante estímulos que provocam ansiedade
  • História de abuso físico/sexual, tabagismo e asma também estão associados a um aumento do risco no desenvolvimento de perturbação de pânico.

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Apresentação Clínica e Diagnóstico

Características clínicas/critérios

  • O ataque de pânico é abrupto e frequentemente espontâneo, mas pode surgir como resultado de excitação, trauma ou esforço físico.
  • Sintomas físicos e mentais:
    • Palpitações, coração acelerado, taquicardia
    • Sudorese
    • Sensação de frio ou de calor
    • Tremores
    • Parestesias
    • Sensação de falta de ar
    • Sensação de asfixia
    • Dor ou desconforto torácico
    • Náusea ou desconforto abdominal
    • Sensação de tontura, instabilidade, vertigem ou desmaio.
    • Desrealização (sensações de irrealidade) ou despersonalização (sensação de estar distanciado de si mesmo)
    • Medo de perder o controle ou “enlouquecer”
    • Medo de morrer
  • Algumas pessoas desenvolvem agorafobia (medo e evitamento de situações ou lugares onde é difícil sair ou escapar, especialmente se ocorrerem sintomas de pânico).
  • Ataques de pânico seguidos de ≥ 1 mês de uma ou de ambas as seguintes características:
    • Preocupação persistente acerca de eventuais ataques de pânico futuros ou das suas consequências (por exemplo, ter um ataque cardíaco, “enlouquecer”).
    • Uma mudança desadaptativa significativa no comportamento relacionada com os ataques (por exemplo, comportamentos de evitamento)

Avaliação

  • Uma história clínica médica, psiquiátrica, social e familiar detalhada combinada com exame físico
  • Testes laboratoriais e outros métodos de diagnóstico (por exemplo, ECG, monitorização de Holter, provas de função pulmonar) com base na idade, risco e história clínica do doente.
  • Exclusão de outras doenças psiquiátricas.
  • Exclusão do uso de substâncias ou efeitos de medicação(s).
  • Escala de Gravidade da Perturbação de Pânico:
    • A ferramenta usa uma classificação de gravidade para diferentes comportamentos (escala: 0-4).
    • Informação obtida:
      • Frequência de ataque
      • Intensidade do ataque
      • Ansiedade antecipatória
      • Evitamento de fobias
      • Evitamento de sensações corporais internas
      • Disfunções nos relacionamentos, impacto laboral

Tratamento

Com uma abordagem terapêutica adequada a maioria dos doentes apresenta melhoria nos seus sintomas.

A escolha de tratamento pode incluir TCC e/ou farmacoterapia, dependendo da preferência do doente, da sua disponibilidade e da resposta.

Terapia cognitivo-comportamental

  • O objetivo é fazer com que o doente compreenda que os ataques de pânico duram pouco tempo e que não são mortais.
  • São ensinadas determinadas habilidades cognitivas e somáticas para que o doente possa reconhecer o ataque de pânico e para que possa substituir pensamentos catastróficos.
  • Os doentes são encorajados a aplicar essas habilidades durante os momentos de exposição para poderem aprender a gerir os seus sintomas.
  • Usada em combinação com farmacoterapia para manutenção, se a monoterapia não for eficaz.

Farmacoterapia

  • Em ataques agudos:
    • Benzodiazepinas (BDZs), como o alprazolam
    • O uso de BZDs está recomendado para tratamento de curto prazo em conjunto com os inibidores seletivos de recaptação de serotonina (SSRIs), como a paroxetina.
    • Devem ser usadas com precaução devido aos seus efeitos adversos e ao risco de uso indevido
  • Terapia de manutenção:
    • Os antidepressivos (SSRIs ou os inibidores de recaptação de serotonina-norepinefrina (SNRIs) são os fármacos de 1ª linha.
    • Os SSRIs incluem a paroxetina, o citalopram e a sertralina.
    • Os SNRIs incluem a venlafaxina e a duloxetina.
    • São necessárias semanas a meses até começaram a ser eficazes
    • Se a manutenção com SSRI falhar podem ser utilizados antidepressivos tricíclicos ou inibidores da monoamina oxidase.

Outras Perturbações de Ansiedade

Tabela: Comparação das perturbações de ansiedade
Condição Características mais importantes Duração Tratamento
Perturbação de pânico Surtos abruptos recorrentes e inesperados (em minutos) de medo ou desconforto intenso ≥ 1 mês
  • Episódio agudo: BDZs
  • Manutenção: SSRI, TCC
Perturbação de ansiedade generalizada Múltiplas preocupações crónicas que incidem normalmente em assuntos, eventos ou atividades ≥ 6 meses Combinação de antidepressivos (SSRIs) e TCC
Fobia específica Medo inapropriado de um determinado objeto ou situação ≥ 6 meses
  • 1ª linha: TCC
  • A medicação não tem um papel importante no tratamento.
Fobia social (perturbaçao de ansiedade social) Ansiedade ou evitamento de situações sociais por medo de ser humilhado ≥ 6 meses
  • 1ª linha: SSRIs ou TCC
  • Subtipo “Apenas de desempenho”: β-bloqueantes ou BDZs
Agorafobia Medo de estar em situações ou lugares de onde é difícil sair ou fugir ≥ 6 meses 1ª linha: SSRIs ou TCC
Perturbação de ansiedade de separação Medo de separação envolvendo figuras importantes de apego ≥ 1 mês
  • 1ª linha: TCC
  • Fármacos podem ser usados se a TCC não for eficaz.
Perturbação de ansiedade relacionada com a doença A ansiedade surge da preocupação de ter ou desenvolver uma determinada doença. ≥ 6 meses
  • Agendamento de visitas regulares para acompanhamento.
  • Evitar fazer testes de diagnóstico desnecessários.
  • Evitar referenciar para outros colegas.
  • TCC e antidepressivos se estas medidas falharem
Perturbação de ansiedade induzida por substâncias ou drogas
  • Intoxicação com cocaína ou anfetaminas
  • Abstinência de álcool ou de benzodiazepinas
  • Fármacos como β2-agonistas(albuterol) ou levotiroxina

Diagnóstico Diferencial

  • Feocromocitoma: um tumor secretor de catecolaminas derivado de células cromafins. A maioria destes tumores tem origem na medula adrenal, mas também podem surgir em gânglios simpáticos (também chamados paragangliomas). Os sintomas estão associados à produção excessiva de catecolaminas e geralmente incluem hipertensão, taquicardia, dor de cabeça e sudorese. As características clínicas do feocromocitoma são muito semelhantes às da perturbação de pânico, com excessão da hipertensão grave que não está presente na perturbação de pânico.
  • SSPT: surge depois de um evento especialmente stressante com risco de vida. Os sintomas duram > 1 mês e incluem revivências do evento com flashbacks ou pesadelos, evitamento de “lembranças” do evento, irritabilidade, hiperatividade e diminuição da memória e da concentração. Os ataques de pânico são achados comuns nos doentes com SSPT, mas o diagnóstico de SSPT deve incluir outros critérios como história de eventos traumáticos, presença de sintomas de intrusão ou mudanças de humor negativas (que normalmente não estão presentes em doentes com perturbação de pânico).
  • Perturbação de ansiedade generalizada: doença mental frequente definida por preocupações excessivas e incontroláveis que causam sofrimento e ocorrem durante ≥ 6 meses. A apresentação clínica inclui fadiga, baixos níveis de concentração, inquietação, irritabilidade e alterações no sono. Se os doentes apresentam sintomas de ansiedade sem relatar ataques de pânico (como definido acima), os critérios para o diagnóstico de perturbação de pânico não são cumpridos.
  • Abstinência (de álcool ou de benzodiazepinasde): doentes com perturbações de adição com álcool/benzodiazepianas correm um maior risco de sintomas de abstinência se interromperem abruptamente o uso da substância. Os sintomas incluem o agravamento da ansiedade inicial, insónia, psicose e convulsões. A abstinência do álcool/ansiolíticos distinguem-se das perturbações de pânico pela história, exame físico e exame toxicológico da urina.

Referências

  1. Dave, P. (2017). Clinical management of anxiety disorders. https://www.researchgate.net/publication/348489972_Clinical_Management_of_Anxiety_Disorders
  2. Grant, J. (2021). Overview of anxiety disorders. https://www.researchgate.net/publication/348435567_Overview_of_Anxiety_Disorders
  3. Palkar, P. (2020). Neurobiology of anxiety disorders. https://www.researchgate.net/publication/341407589_Neurobiology_of_Anxiety_Disorders
  4. Roy-Byrne, P. (2019). Panic disorder in adults: Epidemiology, pathogenesis, clinical manifestations, course, assessment, and diagnosis. UpToDate. Retrieved June 24, 2021, from https://www.uptodate.com/contents/panic-disorder-in-adults-epidemiology-pathogenesis-clinical-manifestations-course-assessment-and-diagnosis
  5. Roy-Byrne, P. (2020). Pharmacotherapy for panic disorder with or without agoraphobia in adults. UpToDate. Retrieved June 24, 2021, fromhttps://www.uptodate.com/contents/pharmacotherapy-for-panic-disorder-with-or-without-agoraphobia-in-adults
  6. Sadock, B. J., Sadock, V. A., Ruiz, P. (2014). Anxiety disorders. Chapter 9 of Kaplan and Sadock’s Synopsis of Psychiatry: Behavioral Sciences/Clinical Psychiatry, 11th ed. Philadelphia: Lippincott Williams and Wilkins, pp. 387–417.

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