Dermatite Atópica (Eczema)

A dermatite atópica, também conhecida como eczema, é uma doença cutânea inflamatória crónica, recidivante e pruriginosa que ocorre com maior frequência em crianças, embora os adultos também possam ser afetados. Esta patologia está frequentemente associada a níveis séricos elevados de IgE e história pessoal ou familiar de atopia. Caracteriza-se por xerose cutânea, eritema, exsudação, crostas e liquenificação. O prurido é um sintoma cardinal. O diagnóstico é clínico. Os pilares do tratamento são a evicção de desencadeantes, emolientes e corticosteroides tópicos.

Última atualização: Jun 20, 2022

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

Descrição Geral

Definição

A dermatite atópica (também conhecida como eczema) é uma patologia que se caracteriza pela alteração da integridade da barreira cutânea e desregulação imunológica e apresenta-se como uma doença inflamatória crónica cutânea recorrente.

Epidemiologia

  • Prevalência:
    • Crianças em idade escolar: cerca de 17%
    • Adultos: 2%–10%
  • Tríade atópica (presente em 30%–50% dos pacientes):
    • Dermatite atópica
    • Rinite alérgica
    • Asma
  • 30% dos pacientes desenvolvem asma.
  • A maioria dos casos ocorre em crianças; relação com história familiar de atopia
  • A maioria dos casos ocorre antes dos 5 anos de idade.
  • Ligeira predominância no sexo feminino
  • A história prévia de atopia é um importante fator de risco.
  • Incidência maior em:
    • Áreas urbanas
    • Países desenvolvidos

Etiologia

  • Multifatorial e não completamente compreendida
  • Genética:
    • História familiar de atopia
    • Mutações do gene da filagrina (mutação de perda de função):
      • Fator de risco genético conhecido mais forte
      • Disfunção da barreira de queratinócitos
      • Maior suscetibilidade a potenciais antigénios
  • Defeitos imunológicos: doença Th2 (células T auxiliares)
  • Fatores pré-natais: elevação de IgE no sangue do cordão umbilical
  • Infeção:
    • Colonização por Staphylococcus aureus:
      • Causa frequentemente surtos
      • Atua como um superantigénio
    • VHS (vírus herpes simples)
  • Hipótese da higiene: a exposição precoce na infância a microrganismos e alergénios previne a atopia.

Fisiopatologia e Apresentação Clínica

Fisiopatologia

  • A patogénese é mal definida.
  • Caracterizada por espongiose (edema epidérmico)
  • O edema provoca a disrupção de ligações intercelulares → formação de vesículas
  • Estão presentes infiltrados dérmicos linfocíticos.
  • Podem estar presentes acantose e hiperqueratose.
  • 2 vias interrelacionadas têm sido implicadas:
    • Rutura da barreira epitelial primária (hipótese outside-in):
      • Disrupção de junções apertadas e aumento da permeabilidade do estrato córneo
      • Aumento da perda de água transepidérmica
      • Pode estar associada a defeitos em proteínas estruturais (a filagrina é a principal proteína implicada)
      • A rutura da barreira também pode ser causada por colonização microbiana e libertação de citocinas inflamatórias.
    • Defeito da resposta imune (hipótese inside-out):
      • Desregulação imunológica secundária
      • Um defeito nos toll-like receptors tem sido associado a perda da imunidade inata epidérmica (a colonização por S. aureus provoca inflamação grave).
      • Sensibilização alérgica mediada por IgE → aumento da suscetibilidade a irritantes/alergénios secundário a defeitos estruturais epidérmicos
Achados histológicos dermatite atópica

Dermatite atópica:
Imagem histológica da camada epidérmica com discreto infiltrado linfo-histiocitário e granulocítico, predominantemente eosinofílico

Imagem: “Atopic dermatitis, short stature, skeletal malformations, hyperimmunoglobulin E syndrome, hypereosinophilia and recurrent infections” por Leonardi S, Filippelli M, Costanzo V, Rotolo N, La Rosa M. Licença: CC BY 2.0

Apresentação clínica

  • Curso crónico com períodos de remissão e exacerbação
  • Prurido intenso: sintoma cardinal
  • Hiperreatividade cutânea a estímulos ambientais
  • Idade:
    • Lactentes e crianças pequenas:
      • Lesões papulovesiculares
      • Prurido intenso
      • Eritema
      • Edema
      • Escoriações: resultado do prurido intenso
      • Localização: face, couro cabeludo, superfícies extensoras, poupa a área da fralda
    • Crianças mais velhas e adultos jovens:
      • Lesões crónicas com liquenificação
      • Superfícies flexoras dos cotovelos, joelhos e laterais do pescoço, punhos e tornozelos
      • Melhoria com a idade, com remissão observada aos 13 anos de idade em cerca de 50% dos casos
  • Gravidade:
    • Ligeira:
      • Áreas de xerose cutânea
      • Prurido: pouco frequente
      • Impacto mínimo nas atividades, sono e bem-estar psicossocial
    • Moderada:
      • Áreas de xerose cutânea
      • Prurido: frequente
      • Eritema
      • Espessamento cutâneo localizado com ou sem escoriação
      • Impacto moderado nas atividades e no bem-estar psicossocial
      • Sono frequentemente alterado
    • Severa:
      • Xerose cutânea generalizada
      • Prurido: incessante
      • Eritema
      • Extenso espessamento da pele, hemorragia, exsudação, fissuras e alteração da pigmentação
      • Impacto severo nas atividades, funcionamento psicossocial e sono

Diagnóstico

História clínica

  • Prurido
  • 3 ou mais dos seguintes (além do prurido):
    • Pregas cutâneas envolvidas:
      • Fossa antecubital
      • Fossa poplítea
      • Pescoço
      • Áreas periorbitárias
      • Tornozelos anteriormente
    • História de asma ou febre dos fenos (ou familiar de 1.º grau se criança < 4 anos de idade)
    • Xerose cutânea no último ano
    • Sintomas com início antes dos 2 anos de idade (não utilizar se criança com < 4 anos)
    • Dermatite de superfícies flexoras (se criança < 4 anos, maçãs do rosto, testa ou áreas externas das extremidades)
  • Curso crónico ou recorrente
  • Estímulos ambientais (certos alimentos, alergénios, medicações)

Exame físico (pele)

  • Lactentes/crianças pequenas:
    • Face
    • Couro cabeludo
    • Pescoço
    • Superfícies extensoras
    • Lesões papulovesiculares
    • Eritema
    • Edema
    • Escoriações
  • Crianças maiores e adultos:
    • Liquenificação
    • Superfícies flexoras:
      • Cotovelos
      • Joelhos
      • Laterais do pescoço, punhos, tornozelos
  • Xerose cutânea

Análises laboratoriais

  • Apenas para excluir outras patologias cutâneas
  • IgE sérica: elevada em 80% dos pacientes
  • Biópsia cutânea
  • Preparação de hidróxido de potássio em raspados cutâneos para excluir Tinea corporis
  • Teste epicutâneos para excluir dermatite de contacto
  • Testes genéticos

Tratamento

Medidas de suporte/profiláticas

Aconselhamento do paciente:

  • Crianças
  • Pais

Eliminação de fatores exacerbantes:

  • Evitar desencadeantes:
    • Calor
    • Baixa humidade
    • Banhos excessivos (sem hidratação)
    • Stress e ansiedade
    • Exposição a solventes e detergentes
    • Xerose (pele seca)
    • Sobreaquecimento da pele
    • Detergentes agressivos
  • Tratar infeções cutâneas associadas:
    • S. aureus
    • Herpes simples

Hidratação cutânea (base do tratamento para reduzir o prurido e os episódios de inflamação):

  • Emolientes:
    • Aplicar pelo menos duas vezes por dia
    • Imediatamente após o banho ou lavagem das mãos
  • Hidratantes que contenham:
    • Ácido glicirretínico
    • Ureia
    • Glicerol

Fármacos/intervenções

Tratamentos tópicos:

  • Corticosteróides: o uso prolongado pode causar atrofia cutânea ou outros efeitos adversos.
  • Inibidores da calcineurina: tratamento de 2.ª linha
  • Inibidores da fosfodiesterase 4 (PDE4) (crisaborol)

Anti-histamínicos orais:

  • Antagonistas H1
  • Benéficos quando há perturbação do sono pelo prurido
  • Difenidramina
  • Hidroxizina
  • Ciproheptadina

Imunossupressores orais:

  • Ciclosporina
  • É comum a recorrência após a descontinuação do tratamento

Anticorpo monoclonal humano:

  • Dupilumab
  • Inibe IL-4 e IL-13

Fototerapia:

  • Utilizada em pacientes com prurido difuso não controlado apenas com tratamento tópico
  • Redução da produção de histamina dos mastócitos e basófilos
  • Ultravioleta B em banda estreita (UVBBE)
  • Ultravioleta A1 (UVA1)

Diagnóstico Diferencial

  • Dermatite de contacto: uma dermatite eritematosa, papular, frequentemente com áreas de vesiculação. Ocorre por exposição direta da pele a um irritante agressivo, com efeito citotóxico direto. O diagnóstico é feito pela história e achados ao exame objetivo. O tratamento é realizado com a prevenção da exposição a irritantes e adoção de medidas de proteção, bem como o uso de emolientes e hidratantes. Os corticosteroides tópicos são o tratamento de 1.ª linha.
  • Dermatite seborreica: uma forma crónica, recidivante e geralmente ligeira de dermatite, com incidência bifásica em lactentes e adultos. Esta condição é caracterizada por placas eritematosas bem delimitadas, com escamas amareladas de aparência oleosa, em áreas abundantes em glândulas sebáceas. A causa é desconhecida, mas as glândulas sebáceas parecem ser necessárias para o desenvolvimento desta patologia. O diagnóstico é clínico. O tratamento é realizado com antifúngicos tópicos, anti-inflamatórios e fármacos de venda livre.
  • Dermatite das fraldas: forma de dermatite irritante mais comum em lactentes e crianças. A humidade excessiva, a fricção, o pH aumentado e a alta atividade enzimática contribuem para a rutura local da barreira cutânea. Esta condição é limitada à área inguinal e poupa frequentemente as pregas onde a urina/fezes não entram em contacto com a pele. O diagnóstico é clínico. O tratamento envolve medidas gerais de cuidados com a pele (troca frequente de fraldas, exposição ao ar e limpeza), corticosteroides tópicos e antifúngicos (em casos graves de sobreinfeção por Candida).
  • Micose fungóide: um tipo de linfoma cutâneo de células T. Esta doença tem apresentação cutânea, mas também pode envolver os gânglios linfáticos, o sangue e as vísceras. A micose fungóide geralmente atinge locais sob roupa interior e é pouco frequente em crianças. A doença apresenta-se com lesões cutâneas progressivas persistentes de formas e tamanhos variados e podem ser placas ou tumores localizados ou disseminados, ou eritrodermia generalizada. O prurido é comum. O diagnóstico é clínico juntamente com biópsia cutânea com histologia de rotina. O tratamento é realizado com agentes tópicos, incluindo corticosteroides, quimioterapia, retinóides, imiquimod, radiação local e fototerapia.
  • Psoríase: uma doença inflamatória cutânea crónica comum caracterizada por pápulas e placas eritematosas com escamas prateadas. A psoríase é uma doença imunomediada complexa onde os linfócitos T, citocinas, células dendríticas e o fator de necrose tumoral desempenham um papel predominante. Anteriormente, era vista como uma doença hiperproliferativa. O diagnóstico é efetuado através do exame objetivo. O tratamento é realizado com corticosteroides tópicos, fototerapia, retinóides, metotrexato, ciclosporina ou agentes biológicos imunomodificadores.
  • Escabiose: uma infestação cutânea causada pelo ácaro Sarcoptes scabiei. A escabiose é uma erupção cutânea intensamente pruriginosa com pequenas pápulas eritematosas nos dedos, punhos, axilas, aréolas, cintura, genitais e nádegas. O diagnóstico é feito pela história e exame objetivo, com a identificação de ácaros, ovos ou pellets fecais à avaliação microscópica. O tratamento deve ser realizado ao paciente e aos contactos próximos. A permetrina tópica e a ivermectina oral são os pilares do tratamento.

Referências

  1. Weston, W., Howe, W. (2021). Atopic dermatitis (eczema): Pathogenesis, clinical manifestations, and diagnosis. In Corona, R. (Ed.). UpToDate. Retrieved March 15, 2021, from https://www.uptodate.com/contents/atopic-dermatitis-eczema-pathogenesis-clinical-manifestations-and-diagnosis
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  3. Spergel, J., Lio, P. (2021). Management of severe atopic dermatitis (eczema) in children. In Corona, R. (Ed.). UpToDate. Retrieved March 15, 2021, from https://www.uptodate.com/contents/management-of-severe-atopic-dermatitis-eczema-in-children
  4. Kim, B. (2020). Atopic Dermatitis. In James, W. (Ed). Medscape. Retrieved March 15, 2021, from https://reference.medscape.com/article/1049085-overview
  5. Eichenfield, L.F., et al. (2014). Guidelines of care for the management of atopic dermatitis: section 2. Management and treatment of atopic dermatitis with topical therapies. J Am Acad Dermatol. 71(1), 116–132. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/24813302/
  6. Weidinger, S., Novak, N. (2016). Atopic dermatitis. Lancet. 387(10023), 1109–1122. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/26377142/

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