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Cirurgia Bariátrica

A cirurgia bariátrica refere-se a um grupo de procedimentos invasivos usados para reduzir cirurgicamente o tamanho do estômago, induzindo precocemente a saciedade. Permite, assim, diminuir a ingestão de alimentos (efeito restritivo), alterar a digestão, bem como induzir, artificialmente, a má absorção de nutrientes (efeito malabsortivo). O principal objetivo da cirurgia bariátrica é a perda rápida de peso. A cirurgia bariátrica é, atualmente, a única modalidade terapêutica que proporciona uma perda de peso significativa a longo prazo, em indivíduos com obesidade mórbida, e que trata ou melhora significativamente as complicações associadas à obesidade. Atualmente, as 2 técnicas mais amplamente utilizadas são o bypass gástrico em Y de Roux e o sleeve gástrico (ou gastrectomia vertical).

Última atualização: Jan 15, 2024

Responsibilidade editorial: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

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Anatomia Cirúrgica

Definição

A cirurgia bariátrica compreende um grupo de procedimentos invasivos que podem ser usados para reduzir, cirurgicamente, o tamanho do estômago, ou redirecionar o fluxo intestinal, com o fim de alcançar uma perda rápida de peso, através da restrição da ingestão e absorção dos alimentos.

Anatomia

É importante rever a anatomia do estômago para saber localizá-lo e reconhecê-lo mais facilmente no interior da cavidade abdominal, bem como controlar, prontamente, uma eventual hemorragia durante a cirurgia.

Pontos anatómicos de referência do estômago:

  • Tem 2 curvaturas (menor e maior)
  • Cárdia:
    • Entrada do estômago
    • Origina-se da linha Z e cria o ângulo de His ou ângulo do orifício cárdico (ângulo entre o fundo gástrico e o esófago abdominal)
    • Ponto crucial na construção da bolsa gástrica
  • Fundo: região em forma de cúpula localizada no ponto mais alto do estômago
  • Corpo:
    • A porção principal do estômago
    • Estende-se do fundo ao piloro
    • Limitada pelas curvaturas menor e maior
  • Piloro:
    • Conecta-se ao duodeno
    • Contém o esfíncter pilórico
    • Compreende um antro pilórico largo e um canal pilórico estreito
Anatomia do estômago

Anatomia do estômago

Imagem por BioDigital, editado por Lecturio
Estômago in situ

O estômago in situ

Imagem por BioDigital, editado por Lecturio

Vascularização arterial:

  • Artéria gástrica esquerda: principal vascularização da bolsa gástrica no bypass gástrico
  • Artéria gástrica direita
  • Artérias gastro-omentais (gastroepiplóicas) direita e esquerda
  • Artéria esplénica
  • Artérias gástricas curtas
  • Artéria gástrica posterior

Drenagem venosa:

  • Veias homónimas que acompanham as artérias
  • As veias gástricas direita e esquerda drenam para a veia porta.
  • A veia gastro-omental esquerda drena para a veia esplénica.
  • A veia gastro-omental direita drena para a veia mesentérica superior.

Inervação :

  • Inervação parassimpática: tronco vagal anterior e posterior
  • Inervação simpática: nervo esplâncnico maior e ramos gástricos do plexo celíaco
Vascularização e inervação do estômago

Vascularização e inervação do estômago

Imagem por BioDigital, editado por Lecturio

Indicações e Contraindicações

Critérios de elegibilidade

A cirurgia bariátrica é um tipo de tratamento cirúrgico indicado em pacientes com obesidade mórbida, refratária a alterações no estilo de vida (e.g., dieta e exercício físico), psicoterapia e farmacoterapia.

  • IMC> 40 kg/m2
  • IMC> 35 kg/m2 com complicações da obesidade (e.g., diabetes mellitus, hipertensão arterial, apneia obstrutiva do sono)
  • Insucesso prévio de medidas dietéticas
  • Ausência de perturbações psiquiátricas, sem uso de álcool ou consumo de drogas ilícitas
  • Pacientes que compreendam as implicações da cirurgia, bem como as modificações dietéticas necessárias
  • Pacientes motivados
  • Ausência de antecedentes médicos que contraindiquem a cirurgia

Contraindicações

Relativas:

  • Pacientes > 65 anos
  • Crianças e adolescentes (a cirurgia é adiada até ser atingido o crescimento púbere máximo)
  • Condições médicas subjacentes (e.g., doenças cardíacas ou respiratórias)
  • Doença de refluxo gastroesofágico pré-existente, no caso do sleeve gástrico (mas não no bypass gástrico)

Absolutas:

  • Incapacidade de deambular
  • Síndrome de Prader-Willi

Procedimento

Preparação pré-operatória

  • Jejum/repouso intestinal prévio (nil per os, nada por via oral) de 8 horas
  • Explicação do procedimento ao paciente e obtenção do consentimento informado
  • Avaliação laboratorial:
    • Hemograma: contagem de plaquetas> 50.000
    • aPTT e TP dentro do intervalo de referência
    • Função renal: creatinina sérica e azoto ureico dentro do intervalo de referência
  • Os anticoagulantes são suspensos antes do procedimento.
  • Profilaxia para trombose venosa profunda (TVP):
    • Enoxaparina
    • Meias de compressão
  • Profilaxia antibiótica: cefalosporinas de 1ª geração (cefazolina)
    • A dose deve ser adequada ao peso do paciente.
    • A profilaxia é continuada por 24 horas após o procedimento.
  • Monitorização contínua:
    • Frequência cardíaca
    • Tensão arterial
    • Saturação de oxigénio
    • ECG
  • Anestesia: O procedimento é, geralmente, realizado sob anestesia geral.

Tipos e etapas dos procedimentos

Técnica do bypass gástrico em Y de Roux:

O bypass gástrico é restritivo (reduz o tamanho do estômago) e malabsortivo (redireciona o fluxo dos intestinos, alterando a absorção dos alimentos). Uma abordagem laparoscópica é, geralmente, preferida pela recuperação e duração de internamento mais curtos.

  1. O ligamento hepatogástrico é dissecado perigastricamente, evitando a lesão do nervo de Latarjet.
  2. A bolsa gástrica de 20-30 mL é formada com base na curvatura menor do estômago, fornecendo o componente restritivo.
  3. A ansa de Roux é levada até à bolsa gástrica por qualquer uma das seguintes vias:
    • Antecólica/antegástrica
    • Retrocólica/retrogástrica (via mais curta)
    • Retrocólica/antegástrica
  4. É realizada uma anastomose entre a ansa de Roux e a bolsa gástrica, usando suturas ou agrafos não absorvíveis.
  5. Com vista a prevenir a formação de hérnias, os seguintes defeitos são encerrados:
    • Defeito de Peterson (espaço entre as ansas do intestino delgado, o mesocólon transverso e o retroperitoneu)
    • Defeito intermesentérico (espaço no interior da bolsa mesentérica)
    • Defeito no mesocólon transverso
Bypass gástrico em y de roux

Bypass gástrico em Y de Roux

Imagem por Lecturio.

Técnica do sleeve gástrico (ou gastrectomia vertical):

O objetivo é criar um estômago menor, de forma tubular, ao longo da curvatura menor, com um volume de, aproximadamente, 60–100 mL. Este procedimento é mais frequentemente realizado por via laparoscópica.

  1. Os vasos gástricos curtos, localizados ao longo da curvatura maior, são seccionados.
  2. O ligamento frenoesofágico e o tecido adiposo gastroesofágico são divididos, permitindo a exposição do diafragma esquerdo.
  3. A curvatura maior do estômago é libertada e uma sonda elástica (um tubo de plástico comprido usado para calibrar o tamanho do sleeve gástrico (ou manga gástrica)) é inserida.
  4. Um agrafador de corte linear é utilizado paralelamente à curvatura menor do estômago, desde o antro, progredindo em direção ao fundo, sem colidir com a incisura.
  5. No fundo gástrico, o agrafador linear é utilizado na direção medial até ao ângulo de His, e a curvatura maior é completamente ressecada, criando o sleeve gástrico.
  6. O estômago remanescente é então removido.
Sleeve gástrico

Sleeve gástrico

Imagem por Lecturio.

Cuidados pós-operatórios

  • Observação na sala de recobro durante 6 horas e, posteriormente, na enfermaria
  • A alta hospitalar pode ser dada no mesmo dia.
  • Plano de dieta especial com refeições pequenas e frequentes, para prevenir a ocorrência de vómitos, intolerância alimentar e síndrome de dumping
  • Os pacientes necessitam de um acompanhamento minucioso por uma equipa multidisciplinar:
    • Monitorização da perda de peso
    • Vigilância de desnutrição e deficiências vitamínicas
  • Cirurgia plástica: após rápida perda de peso, procedimentos estéticos podem estar indicados, para remover o excesso de pele da parede abdominal, coxas e braços.
  • Prognóstico:
    • A maior perda de peso ocorre durante o primeiro ano após a cirurgia.
    • O bypass gástrico permite manter ligeiramente melhor a perda de peso, aos 5 anos, comparativamente ao sleeve gástrico.
    • Melhor opção terapêutica para tratar complicações associadas à obesidade:melhora ou trata condições como diabetes tipo 2, hipertensão arterial e dislipidémia
    • Um número significativo de pacientes desenvolve cálculos biliares, secundários à rápida perda de peso:
      • Se sintomáticos, a colecistectomia está indicada
      • Alguns cirurgiões defendem a realização de colecistectomia profilática no mesmo tempo operatório da cirurgia bariátrica.

Complicações

A cirurgia bariátrica, como qualquer procedimento invasivo, tem riscos e complicações inerentes.

Bypass gástrico em Y de Roux

  • Deiscência anastomótica:
    • Pode resultar na formação de um abscesso intra-abdominal, peritonite e sépsis
    • Complicação potencialmente ameaçadora de vida
  • Hemorragia ao longo das linhas de sutura ou de agrafos
  • Estenose anastomótica (resulta numa obstrução)
  • Úlceras marginais: formam-se na anastomose gastrointestinal, geralmente na porção intestinal, como resultado da exposição excessiva ao ácido gástrico
  • Fístula gastro-gástrica: formação de fístula entre a bolsa gástrica e o remanescente gástrico
  • Deficiências nutricionais:
    • Consequentes da exclusão de grande parte do estômago, bem como do bypass intestinal, que se traduz numa absorção de nutrientes inadequada
    • Deficiências comuns: vitamina B12, ácido fólico, ferro, zinco, cobre, cálcio, vitamina D
  • Síndrome de dumping:
    • Causado pela rápida motilidade de grandes quantidades de alimento, desde estômago, de tamanho diminuído, ao intestino.
    • Geralmente associado a alimentos ricos em açúcares simples e amido
    • Pode se apresentar como distensão abdominal, desconforto abdominal e diarreia
    • Pode também estar associado a taquicardia e hipotensão, devido ao influxo abundante de fluidos no lúmen intestinal

Sleeve gástrico

  • Refluxo gastroesofágico: devido ao aumento da pressão no interior de um estômago estreito e tubular
  • Deiscência da linha de agrafos
  • Hemorragia da linha de agrafos

Referências

  1. Hardwick, R. (2018). The esophagus, stomach, and duodenum. In Garden, O. James. http://dx.doi.org/10.1016/B978-0-7020-6859-1.00013-3
  2. Lyo, V., Husain, F.A. (2021). Roux-en-Y gastric bypass and sleeve gastrectomy. In Delaney, Conor P. et al. (Ed.), Netter’s Surgical Anatomy and Approaches. http://dx.doi.org/10.1016/B978-0-323-67346-4.00010-4
  3. Standring, S. (2021). Abdominal oesophagus and stomach. In Standring, Susan (Ed.), Gray’s Anatomy (pp. 1160–1172.e1). http://dx.doi.org/10.1016/B978-0-7020-7705-0.00063-X

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