Acalásia

A Acalásia é o distúrbio da motilidade esofágica que se desenvolve a partir da degeneração do plexo mioentérico. Esta doença resulta no comprometimento do relaxamento do esfíncter esofágico inferior e ausência de peristaltismo esofágico normal. Os doentes geralmente apresentam disfagia para sólidos e líquidos, assim como regurgitação. O diagnóstico é estabelecido através de uma manometria de alta resolução. Para descartar malignidade como causa da acalásia, deve ser realizada uma endoscopia digestiva alta. O estudo baritado ajuda a avaliar a morfologia esofágica. As opções de tratamento incluem a dilatação por balão pneumático, a miotomia cirúrgica e a injeção de toxina botulínica. A escolha do tratamento depende do tipo de acalásia e do risco cirúrgico. O tratamento farmacológico está disponível para aqueles nos quais a intervenção inicial falha; no entanto, fornecem o menor benefício.

Last updated: Dec 15, 2025

Editorial responsibility: Stanley Oiseth, Lindsay Jones, Evelin Maza

Descrição Geral

Definição

  • Distúrbio primário da motilidade esofágica que se deve à degeneração do plexo mioentérico.
  • É caraterizada por:
    • Relaxamento comprometido do esfíncter esofágico inferior (EEI)
    • Ausência de peristaltismo esofágico normal

Anatomia e fisiologia

  • Esófago:
    • Composto por uma camada externa de músculo longitudinal e uma camada interna de músculo circular.
    • Fibras musculares circulares: permitem o peristaltismo
    • ⅓ superior do esófago: predomina o músculo esquelético
    • ⅔ inferiores do esófago: o músculo liso torna-se preponderante do esófago médio para o distal.
  • Plexo mioentérico (Plexo de Auerbach):
    • Grupo de gânglios entre as camadas musculares circular e longitudinal
    • Faz parte do sistema nervoso entérico
    • Função: controla o peristaltismo do trato gastrointestinal
  • Tipos de neurónios ou células ganglionares no plexo mioentérico:
    • Excitatórios: secretam acetilcolina → contração muscular
    • Inibitórios: secretam óxido nitroso e péptido vasoativo → relaxamento muscular

Epidemiologia

  • Incidência: 1 2 casos por 100.000 indivíduos
  • Prevalência: 10 casos por 100.000 indivíduos
  • Sobretudo em adultos entre os 25 e os 60 anos
  • Homens e mulheres são igualmente afetados.

Etiologia

  • Primária: idiopática
  • Secundária (também conhecida como pseudoacalásia):
    • Causada por doenças que levam a anormalidades esofágicas, semelhantes à acalásia primária
    • Neoplasias malignas (cancro esofágico, gástrico ou outros cancros extraesofágicos) devido ao efeito de massa ou como parte da uma síndrome paraneoplásica
    • Doença de Chagas
      • Infeção por um parasita, o Trypanosoma cruzi Trypanosoma cruzi Chagas disease is an infection caused by the American trypanosome Trypanosoma cruzi. This parasitic protozoan is transmitted in the feces of reduviid bugs in South and Central America. Acute infection may present with inflammation at the inoculation site (chagoma), fever, and lymphadenopathy. Untreated, chronic infection can progress to severe complications. Trypanosoma cruzi/Chagas disease
      • Comummente encontrado na América do Sul e Central
    • Doenças infiltrativas: amiloidose, sarcoidose
    • Doenças genéticas: neurofibromatose, neoplasia endócrina múltipla tipo 2B, doença de Fabry
    • Outros: esofagite eosinofílica, síndrome de Sjögren juvenil, pseudo-obstrução intestinal idiopática crónica

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Fisiopatologia

Processo patológico

  • Degeneração do plexo de Auerbach, onde há perda seletiva de células ganglionares inibitórias no esófago distal
  • Atividade excitatória sem oposição → incapacidade de relaxamento do músculo liso no EEI → aumento da pressão do EEI → perda progressiva da função peristáltica

Fatores propostos que contribuem para a patogénese

  • Predisposição genética
    • A acalásia está associada a mutação genética (síndrome de Allgrove).
    • Os casos familiares apontam para um possível padrão hereditário.
  • Infeção vírica
    • Foram detetados anticorpos contra os vírus varicela zóster, do sarampo e herpes simples (tipo 1) em doentes afetados.
    • No entanto, não foi estabelecida uma relação causal.
  • Inflamação e processo autoimune
    • Foram encontrados autoanticorpos contra neurónios entéricos em doentes com acalásia.
    • No esófago afetado: infiltrados inflamatórios de células T rodeiam os neurónios inibitórios, com uma preservação relativa dos neurónios excitatórios.

Apresentação Clínica e Complicações

Apresentação clínica

  • Início insidioso
  • Disfagia para sólidos e líquidos
  • Regurgitação de alimentos não digeridos, não ácidos
  • Dificuldade em eructar
  • Pirose
  • Tosse noturna
  • Soluços
  • Perda ponderal
  • Dor retroesternal

Complicações

  • Pneumonia Pneumonia Pneumonia or pulmonary inflammation is an acute or chronic inflammation of lung tissue. Causes include infection with bacteria, viruses, or fungi. In more rare cases, pneumonia can also be caused through toxic triggers through inhalation of toxic substances, immunological processes, or in the course of radiotherapy. Pneumonia de aspiração: pela regurgitação
  • Megaesófago em 10% dos casos
  • Risco aumentado de cancro do esófago
Grade IV megaesophagus

Imagem de megaesófago (perda da motilidade esofágica e dilatação esofágica difusa)
A: Radiografia póstero-anterior que mostra alargamento do mediastino superior (setas)
B: Estudo baritado demonstrando um esófago dilatado e tortuoso (pontas de seta)

Imagem: “Grade IV megaesophagus” da US National Library of Medicine. Licença: CC BY 4.0

Diagnóstico

Abordagem diagnóstica

  • Suspeitar de acalásia se:
    • Disfagia para sólidos e líquidos
    • Pirose que não responde ao inibidor da bomba de protões
  • Realizar uma endoscopia digestiva alta → achados sugestivos ou duvidosos, mas com alta suspeita → prosseguir com a manometria esofágica:
    • Se a manometria for consistente com acalásia: descartar malignidade (ecoendoscopia com aspiração por agulha fina).
    • Se os achados da manometria forem ambíguos: estudo baritado (esofagograma)
    • Se a manometria for normal: o diagnóstico de acalásia está descartado.

Manometria esofágica

  • Estabelece o diagnóstico de acalásia
  • Manometria de alta resolução (HRM, pela sigla em inglês) com topografia de pressão esofágica (EPT, pela sigla em inglês):
    • Teste gold standard
    • Tem mais MAIS Androgen Insensitivity Syndrome sensores do que a manometria convencional
    • Pressão: representada pela cor (↑ intensidade da cor = ↑ pressão)
    • Demonstra o seguinte:
      • Pressão de repouso da junção esofagogástrica
      • Atividade esofágica desencadeada pela deglutição
    • Classifica os tipos de acalásia (orientando o tratamento):
      • Acalásia clássica tipo I:
        • Contratilidade mínima ou peristalse 100% falhada no corpo esofágico
        • Deve-se à aganglionose
      • Acalásia tipo II:
        • Períodos intermitentes de pressurização
        • A magnitude da aganglionose é menor.
      • Acalásia espástica tipo III:
        • Contrações distais prematuras ou espásticas
        • Desequilíbrio da influência excitatória e inibitória, as células ganglionares estão sobretudo intactas
  • Manometria convencional:
    • Achados:
      • Aperistalse nos ⅔ inferiores do esófago
      • Relaxamento incompleto do EII após a deglutição
      • Pressão de repouso do EII elevada
Tipos de acalásia

Tipos de acalásia

Todos os tipos apresentam comprometimento do relaxamento da junção esofagogástrica.
Tipo I: ao deglutir, o esfíncter esofágico superior relaxou, mas seguem-se contrações 100% falhadas e nenhuma pressurização esofágica (peristaltismo ausente).
O tipo II apresenta pressurização panesofágica em pelo menos 20% das deglutições.
O tipo III é definido pela presença de fragmentos preservados de peristaltismo distal ou contrações prematuras em pelo menos 20% das deglutições (espástica).

Imagem: “Achalasia types” da US National Library of Medicine. Licença: CC BY 4.0, editada pela Lecturio.

Outros testes Testes Gonadal Hormones de diagnóstico

  • Esofagogastroduodonoscopia (EGD)
    • Achados:
      • Alimentos retidos no esófago
      • Resistência aumentada à passagem do endoscópio através da junção esofagogástrica
    • Pode ter resultados normais ou ambíguos
    • É necessária para descartar malignidade como causa da acalásia
  • Estudo baritado (esofagograma):
    • Realizado se achados manométricos duvidosos
    • Avalia a morfologia da junção esofagogástrica
    • “Bico de pássaro”: Achado patognomónico (esófago dilatado devido à ausência de peristaltismo, que termina num estreitamento no EEI)
  • Ecoendoscopia:
    • Avalia a espessura da parede esofágica
    • Espessamento significativo e assimétrico da parede: suspeita de malignidade
  • EndoFLIP (sonda de imagem funcional do lúmen):
    • O catéter FLIP passa pelo esófago e exibe o diâmetro dos segmentos esofágicos.
    • Ajuda a avaliar o esvaziamento esofágico através da distensibilidade da junção esofagogástrica
    • Acalásia: baixa distensibilidade

Tratamento

Abordagem terapêutica

  • A perda de células ganglionares é irreversível.
  • O objetivo da intervenção é melhorar a passagem do material ingerido.
  • Entre os tipos de acalásia:

Opções terapêuticas

  • Dilatação do EEI com balão pneumático:
    • Dilatação circunferencial do EEI
    • Os doentes devem ser referenciados para cirurgia se não houver melhoria após 3 dilatações consecutivas
    • Risco de perfuração esofágica
    • Para a acalásia tipo I ou tipo II
  • Miotomia cirúrgica:
    • As fibras musculares do esfíncter esofágico inferior são cortadas cirurgicamente para aliviar a pressão.
    • Miotomia de Heller (via laparoscópica)
    • Risco de perfuração esofágica e gástrica
    • Risco de refluxo gastroesofágico (fundoplicatura simultânea para reduzir este risco)
  • Miotomia endoscópica peroral (POEM, pela sigla em inglês):
  • Injeção de toxina botulínica no EEI:
    • A toxina botulínica é injetada para bloquear a libertação de acetilcolina dos gânglios excitatórios → ↓ tónus do EEI
    • Bons resultados a curto prazo; requer novo tratamento dentro de 6 12 meses
    • Reservado para maus candidatos cirúrgicos
  • Opções farmacológicas:
    • Menor benefício
    • Consideradas para os maus candidatos a cirurgia e/ou após falência das injeções de toxina botulínica.
    • Mecanismo farmacológico: redução da pressão do EEI.
    • Fármacos: nitratos, bloqueadores dos canais de cálcio

Diagnóstico Diferencial

  • Espasmo esofágico: também se apresenta com disfagia para sólidos e líquidos, mas está associado ao início súbito de dor torácica não relacionada com o esforço. Existem 2 tipos: o espasmo esofágico distal e o esófago hipercontrátil. A manometria mostra contrações esofágicas caraterísticas, com relaxamento normal da junção esofagogástrica.
  • Doença de refluxo gastroesofágico (DRGE): sintomas de pirose e regurgitação causados pelo refluxo do conteúdo do estômago. Os doentes geralmente queixam-se de uma dor epigástrica em queimadura, que irradia superiormente para o tórax, com um paladar amargo ou metálico na boca. A doença de refluxo gastroesofágico deve-se ao relaxamento inapropriado do EEI. Os inibidores da bomba de protões são usados para controlar os sintomas da DRGE.
  • Esclerodermia: também chamada esclerose sistémica, apresenta-se com disfagia para sólidos e líquidos ad AD The term advance directive (AD) refers to treatment preferences and/or the designation of a surrogate decision-maker in the event that a person becomes unable to make medical decisions on their own behalf. Advance directives represent the ethical principle of autonomy and may take the form of a living will, health care proxy, durable power of attorney for health care, and/or a physician’s order for life-sustaining treatment. Advance Directives inicio, acompanhada por espessamento e endurecimento da pele (esclerose) e autoanticorpos séricos específicos. O esfíncter esofágico inferior é fraco ou incompetente na esclerodermia, por isso, a manometria mostra pressão baixa ou ausente do EEI.
  • Estenose esofágica: estreitamento do esófago que é frequentemente uma consequência do refluxo gastroesofágico. Este estreitamento pode também resultar de malignidade. A estenose esofágica apresenta-se com disfagia para sólidos, evoluindo progressivamente para líquidos. O estudo baritado mostra um diâmetro luminal estreitado. A endoscopia digestiva alta é realizada com dupla finalidade, pois auxilia no diagnóstico através da visualização e biópsia e também permite a dilatação, quando necessária ao tratamento.
  • Anel e membrana esofágica: estruturas finas que causam oclusão parcial do lúmen esofágico. A síndrome de Plummer-Vinson consiste em anemia Anemia Anemia is a condition in which individuals have low Hb levels, which can arise from various causes. Anemia is accompanied by a reduced number of RBCs and may manifest with fatigue, shortness of breath, pallor, and weakness. Subtypes are classified by the size of RBCs, chronicity, and etiology. Anemia: Overview and Types ferropénica, disfagia e uma membrana esofágica cervical. A apresentação inclui disfagia para sólidos. O anel de Schatzki, o tipo mais MAIS Androgen Insensitivity Syndrome comum de anel esofágico, também está associado à disfagia intermitente para sólidos. O diagnóstico é feito por estudo baritado e endoscopia digestiva alta.

Referências

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  2. Ates, F., Vaezi, M. (2015) The Pathogenesis and Management of Achalasia: Current Status and Future Directions. Gut Liver. 9(4): 449–463. doi: 10.5009/gnl14446
  3. Desai, J., Moustarah, F. (2020). Esophageal Stricture. StatPearls. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK542209/
  4. Furuzawa-Carballeda, J. et al. (2016). New insights into the pathophysiology of achalasia and implications for future treatment. World J Gastroenterol. 22(35):7892-7907. doi: 10.3748/wjg.v22.i35.7892
  5. O’Neill, O., Johnston, B., Coleman, H. (2013). Achalasia: A review of clinical diagnosis, epidemiology, treatment and outcomes. World Journal of Gastroenterology 19(35):5806-5812. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3793135/
  6. Rogers, A., Rogers, B., Gyawali, P. (2020) Pathophysiology of achalasia. Annals of Esophagus 3. https://doi.org/10.21037/AOE-2019-ACH-07
  7. Shahrestani, J., Das, J. (2020). Neuroanatomy, Auerbach Plexus. StatPearls. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK551559/
  8. Spechler, S., Talley, N., Robson, K. (2020) Achalasia: Pathogenesis, clinical manifestations, and diagnosis. UpToDate. Recuperado a 1 de outubro de 2020, em https://www.uptodate.com/contents/achalasia-pathogenesis-clinical-manifestations-and-diagnosis

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